A diferença entre o mito e a pessoa, entre o ícone e o homem em movimento, está no meu conhecimento do Russo, centroavante do Fluminense e do Escrete nacional, o quinto maior goleador do Tricolor. O primeiro Russo que conheci era um botão, desses que roubávamos das roupas dos mais velhos para montar os nossos times de futebol de mesa. O meu Russo tinha corcova, deslizava bem para marcar gols de cortada que fazíamos com pente, ficha ou barbatana. Esta era a mais terna das reverências que fazíamos àquilo que ouvíamos nas rádios, porque dificilmente os grandes times do Rio e São Paulo vinham a Curitiba, quanto mais à minha cidade, Paranaguá, ou à Irati dos deslumbramentos líricos do Nego Pessoa. Nossa alegria, feita de paixão e de lúdico, estava na liturgia dos botões que acompanhava aquele futebol de mais imaginário porque as narrativas diminuíam as dimensões do campo, já que os atores essenciais estavam sempre perto da área e dela o Leônidas. o Pirilo, o Isaías, Ademir Menezes, Heleno e, é claro, o Russo, eram como primeiros-bailarinos. Quando conheci o Russo, ele já havia passado pela supervisão do Escrete no ciclo do João Saldanha e estava no Paraná para uma ação misionária no Atlético Paranaense. Deixou várias lições. E é em cima dessa trajetória de Adolpho Milman que Carlos Alberto Pessoa se vale, como fio condutor da história, das reflexões, muitas delas polêmicas, em torno da mitologia do técnico onisciente, o que provocou irritação de críticos sem sua coragem e talento.