Pavilhão

Pavilhão Daniel Arelli




PDF - Pavilhão


Tudo é áspero e vivo na poesia de Daniel Arelli. Seus textos vão desenhando, um a um, o mosaico de um lirismo exigente. Feitos de arestas e ruídos, mas também de memória e afeto, os poemas equilibram-se entre a afirmação do corte e o elogio do desejo: entre esses dois polos, quem sabe?, desdobram os seus amores difíceis. A interrupção rigorosa do verso, um dos traços formais mais relevantes deste livro enxuto, em que muito pouco parece fora de lugar, revela-se mais do que um procedimento de composição ou dado de estilo: é a tradução de certa visão de mundo crítica e negativa, orientada para a recusa das certezas fáceis e consoladoras, bem como dos arranjos fixados de uma realidade violenta e injusta. Mas, junto a isso, como complemento e contraponto, atravessa o conjunto dos poemas a lembrança de múltiplos encontros, de corpos que se tocam, de vozes que se entrelaçam (na tessitura do poema) como uma mão se fecha sobre a outra. Os amantes revelam-se, em palavras e gestos, como quem abre um mapa, aponta um detalhe na paisagem, percorre uma casa conhecida — os amantes apresentam o mundo enquanto expõem-se uns para os outros, ávida e lentamente. A convivência desses dois elementos no livro dá a dimensão múltipla e dinâmica do Pavilhão que o nomeia. Nesse espaço, como se vê, têm lugar tanto a pedagogia terrível da “lição de balística” quanto a delicadeza do olhar que investiga a manhã e as coisas que só existem sob a sua luz particular.

A busca pela precisão conceitual e pelo desdobramento de teses complexas (leia-se, nesse sentido, os poemas “Símile” e “Franz Kafka”) revelam o pendor filosófico de tantos textos, que no entanto não se fiam apenas nos jogos lógicos da linguagem, mas tentam aproximar-se da carnalidade concreta do real, localizando nos objetos e nos corpos o território propício para o pensamento. Ideias como coágulos: adensamentos e irrupções na matéria instável do mundo. De modo semelhante, a poesia em diálogo que Arelli elabora vai encontrar em artistas tão distintos quanto Cecilia Pavón, Ai Wei Wei, Kiko Dinucci e Jards Macalé mais do que modelos estéticos, predecessores ou contemporâneos na luta com as formas e pelas formas. Eles são, como também Sebastião Uchoa Leite e Nicanor Parra (antipoetas par excellence), referências de uma compreensão ética da obra de arte: seus textos, sons e instalações são lições de recusa e inquietação, monumentos ao avesso que balizam a construção difícil da poesia que neste Pavilhão se ergue, arte que, mesmo indecisa entre a ternura e o “rastilho tóxico” de uma época saturada de dívidas, venenos e vírus, escolhe, em qualquer dos casos, o impasse; prefere ser “artéria encalacrada” — passagem problemática, é verdade, mas ainda assim passagem, conduto.

Gustavo Silveira Ribeiro





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