"Dentro, apesar das chamas que brilhavam esvoaçantes e famintas pela noite, só havia escuridão. O fogo, inobstante ser a chave para a destruição daquilo que não se nomina, não era capaz de intimidar a trevosidade encarnada naquele galpão. Em poucos instantes, pequenos sóis amarelos se acenderam na negritude daquela escura nebulosa. Dezenas, talvez centenas de olhos famintos, incendiados como estrelas em um céu dilacerado pelo tridente do diabo.
Então, de súbito, guinchando e saltando freneticamente entre as paredes e vigas do galpão, as coisas enxamearam o ar ao redor de dona Giovanna."
Quem se aventura pelas trilhas ermas e mal divisadas dos Montes, à oeste de Tebraria, logo se vê diante de uma incomensurável plantação de ervas cor de sangue. Sua aparência rubra transcende o sentido comum das coisas do campo, ao passo que seu gosto amargo transgrede sobremaneira qualquer senso de utilidade. Uma ou outra benzedeira faz-lhe uso. Sinhá Cida reza uma Ave-Maria enquanto trança a rama vermelha no cabelo do doente com gota e da moça com quebranto.
O dono dessas terras é Dezidério, velhinho de aparência inofensiva, sorriso infantil e uma sombra diabolicamente faminta.
AH! Venham comigo, em direção ao Bairro da Cripta. Vamos por esta estrada. Pelas colinas escarpadas, lugar de vento frio que faz gelar a alma de toda gente. Em redor de imenso e desfolhado bosque de ipês, dar-vos-ei conhecimento daquilo que espreita por este caminho. Vou dizer-vos algo que não querem ouvir. Vou mostrar onde está escuro.