Vida do Padre Antonio Vieira

Vida do Padre Antonio Vieira Padre António Vieira
João Francisco Lisboa




PDF - Vida do Padre Antonio Vieira


Coleção "CLÁSSICOS JACKSON" – VOLUME XIX: JOÃO FRANCISCO LISBOA - VIDA DO PADRE ANTÓNIO VIEIRA, PREFÁCIO DE PEREGRINO JÚNIOR.

Vida do padre Antônio Vieira - Não contava bem Antônio Vieira oito anos de idade, quando em 1615 teve de acompanhar sua família para a metrópole do Brasil. Da razão desta viagem não há cabal certeza; mas presume-se que Christovam Vieira Ravasco, seu pai, viera despachado a servir algum emprego, talvez o de secretário do estado, que depois exerceu durante toda a vida de seu filho Bernardo Vieira Ravasco, irmão mais novo do padre.

Mal desembarcou na Bahia, começou este a estudar os primeiros rudimentos e humanidades, freqüentando as escolas dos jesuítas, que floresciam então ali, como em toda a parte, com grande aproveitamento da mocidade. Mostrava-se Antônio Vieira assíduo e fervoroso nos estudos, e lidava deveras por avantajar-se aos demais seus condiscípulos; mas conta-se que nos primeiros tempos, apesar da natural vivacidade que desde os mais tenros anos manifestara, não pudera fazer grandes progressos, pelo não ajudar a memória, rude e pesada, e como toldada de espessa nuvem. Era o estudante grande devoto da Virgem; e um dia que, ajoelhado ante a sua imagem, e cheio do pesar e abatimento que lhe causava aquela natural incapacidade, a implorava em fervorosa oração para que o ajudasse a vencer semelhante obstáculo, de repente sentiu como um estalo e dor aguda na cabeça, que lhe pareceu que ali acabaria a vida. Era a Virgem que sem dúvida escutara e deferia à súplica ardente e generosa; e era o véu espesso que trazia em tão indigna escuridade aquele juvenil engenho, que num momento se rasgava e desfazia para sempre. Guiou dali Vieira para a escola com grande alvoroço, e sentiu-se tão outro do que fora até então, que logo animosamente pediu para argumentar com os mais sabedores e adiantados. E a todos venceu e desbancou, com entranhável assombro do mestre, que bem conheceu andava naquilo grande novidade. Assim o referem pelo menos as crônicas da ordem; e se a anedota não é verdadeira, é pelo menos calculada para dar uma cor romanesca e maravilhosa aos primeiros lampejos deste engenho novel, que mais tarde havia de deslumbrar o mundo pelo seu extraordinário fulgor.

Dali por diante nunca mais a memória e as outras faculdades de entendimento mentiram ao seu ardor imenso de aprender; e como lhe batesse no peito um coração generoso e cheio de impulsos e aspirações para as grandes e nobres coisas, já em tão verdes anos cogitava o mancebo nos meios de pôr por obra as suas idéias e desígnios. E ou fosse que a sua inteligência e ambição precoce lhe desse a conhecer que nos jesuítas estava concentrado todo o poder da época; e que abraçando o instituto, entrava pela porta mais fácil e azada para quem queria seguir os caminhos que guiam à grandeza humana; ou fosse que os padres, sondando com um só lanço do seu olhar profundo e penetrante tudo quanto o porvir reservava àquela flor apenas desabrochada, e fiéis às máximas da ordem empregassem todos os meios para captá-lo e seduzi-lo; o certo é que Vieira fugiu de casa, e recolheu-se ao colégio dos jesuítas, em 1625, tendo pouco mais de quinze anos de idade.

Debalde os pais, que lhe reservavam outros destinos, envidaram todos os esforços pelo dissuadir; Vieira perseverou, despontando nele por este modo em ocasião tão solene, e desde a aurora da vida, aquele ferrenho desprezo dos sentimentos mais ternos e suaves, e aquela ambição aspérrima e insaciável que o dominaram depois em todo o curso dela.

Passados dois anos completos de noviciado, Vieira professou; e bem que continuasse a fazer progressos maravilhosos nos estudos, com igual aplauso dos mestres e condiscípulos, a glória tranqüila e modesta das letras não o tentou assaz; e aspirando incessantemente as coisas mais árduas e lustrosas, fez consigo voto de despender a vida na doutrina e conversão dos escravos africanos, e selvagens do Brasil, e a esse intento deu-se para logo ao estudo das línguas de uns e outros. Quando aos vinte e um anos de sua idade, quiseram os padres que Vieira começasse um curso de filosofia, para passar depois aos de teologia, declarou ele o voto que até então guardara secreto. Os superiores lho irritaram é certo, mas não foi sem repugnância que o futuro missionário, adstrito aos preceitos severos da ordem sobre a obediência, abriu mão dos projetos que lhe sorriam na mente, para continuar a cultivar as letras, e a aprofundar aqueles conhecimentos que, no entender dos padres, ajustavam melhor com a elevação e brilho do seu talento.

Que poderemos nós dizer que responda aos prodígios operados nas escolas por esta aguiazinha ainda mal emplumada? Aos dezoito anos já Vieira ensinava retórica no colégio de Olinda; e quer na sua cadeira de professor, quer nos bancos de filosofia e teologia, era sempre o mesmo portentoso mancebo que, antecipando o tempo e o trabalho, mostrava-se com mais aptidão para mestre que para discípulo. Compunha dissertações e tratados sobre os assuntos mais elevados, comentava os livros mais obscuros e difíceis das sagradas escrituras e argüia com tanta sutileza, ardor e vivacidade, que era o pasmo de quantos o viam e ouviam. Assim madrugavam nele aqueles grandes dotes de argumentador e intérprete de profecias, que lhe acarrearam depois tamanha celebridade entre os contemporâneos mas que sem dúvida corromperam o seu talento, e concorreram para depreciar aos olhos da posteridade o mérito das suas obras, tão cheias e pesadas de coisas inúteis, frívolas e absurdas.

Em 1635, foi Vieira ordenado presbítero, e disse a sua primeira missa. Apontamos esta circunstância pela sua data para deduzir dela uma observação, e vem a ser que, segundo parece, naquela época não era coisa fácil a promoção ao sacerdócio, cujas tremendas obrigações se confiaram a um homem tal como Vieira, só depois de vinte oito anos de idade, e de tantos e tão elevados estudos.

Escreve André de Barros que por estes tempos gastara Vieira cinco anos na conversão dos gentios do Brasil; e o mesmo Vieira em uma carta escrita em 1695 ao P. Manuel Luís diz também que estivera cinco anos em todas as aldeias da Bahia, sem todavia particularizar mais circunstância alguma, por onde se possa avaliar a época e importância dos serviços, com que desde então buscava satisfazer a sua vocação.

O que não padece dúvida é que tanto antes como depois de receber as ordens, já ele pregava nas igrejas da Bahia e seus arredores, desdobrando desde então as grandes qualidades oratórias com que depois encheu de admiração Lisboa e Roma. Que dizemos nós? No seu famoso Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda, pregado em 1640, elevou-se o pe. Antônio Vieira a um tão alto grau de eloqüência, a que raras vezes atingiu depois.

Então contava ele apenas trinta e dois anos, e em todo o viço da mocidade, o seu talento virgem e vigoroso rompeu em vivos lampejos, sobrepujando a falsa ciência, que em idade mais crescida porventura lhe ofuscava o brilho, e lhe impedia a liberdade dos movimentos.

O patriotismo português, paixão dominante, que sempre ocupou o seu coração, o enchia e abrasava então mais do que nunca, não desfalecido ainda nem pelos gelos da velhice, nem pelas ingratidões e desenganos que mais tarde tantas vezes encontrou nas cortes.

As circunstâncias, de resto, eram próprias a excitar todos os seus sentimentos de português, de católico e de membro de uma ordem religiosa. Os holandeses haviam conquistado uma parte considerável do Brasil; o príncipe Maurício de Nassau, com um formidável armamento de terra e mar, tinha vindo tentar em 1638 a tomada da Bahia; e posto que a empresa malograsse, não se fez todavia sentir menos pesada nas devastações que se lhe seguiram. A guerra continuou depois, e o ano de 1640 foi logo nos seus começos assinalado por batalhas encarniçadas e incessantes entre a esquadra holandesa e a luso-hispana sob o comando do conde da Torre.

Essas batalhas, cujo resultado foi sempre favorável aos holandeses, pelejaram-se tanto à vista das costas do Brasil, que, pode-se dizer, a população as contemplava das praias.

Sob a impressão dos sentimentos de terror e de esperança que estes grandes acontecimentos excitavam em todos os ânimos, ordenaram-se preces públicas na Bahia, e os melhores oradores subiam sucessivamente ao púlpito. No último dia coube ao pe. Antônio Vieira a sua vez de pregar. A vida dos oradores está principalmente nos seus discursos; e um grande triunfo oratório é para eles, como para um general, o ganho de uma batalha. Não faremos pois como os seus outros biógrafos que, com culpável omissão, deixaram em completo silêncio, ou apenas assinalaram este notável acontecimento.

Dominado de uma soberba inspiração, e desdenhado seguir os trilhos usados pela retórica fria e rotineira dos outros perseguidores, desde as primeiras palavras afrontou-se o orador com a divindade, com uns meneios e formas tão estranhas, e com uma tal audácia de pensamentos, que faz involuntariamente recordar a passagem de Homero, citada por Longino entre os exemplos de sublime. (Envolvido de repente o exército grego por uma nuvem carregada e escura que o tolhia de combater Ajax, frustrado no seu furor, lançou esta arrojada apóstrofe à face da própria Divindade:

Deus grande! Aparta a noite que nos cega.

E briga contra nós à luz do dia!)





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