A Trilogia Tebana

A Trilogia Tebana Sófocles




Resenhas - A Trilogia Tebana


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Alane.Sthefany 23/04/2022

A Trilogia Tebana - Sófocles
A Trilogia Tebana é perfeita, enredo impressionante e bastante criativo, os personagens me cativaram, as ações de alguns me deixaram admirada, já de outros, me deixaram irritada.

Sorri, chorei, passei raiva com alguns personagens, depois me compadeci deles ...

Foi um emaranhado de emoções ?

Existem tantos ensinamentos nesse livro. Super recomendo ??

Por exemplo, como:

O poder que subiu na cabeça de Creonte, fazendo com que ele não desse ouvidos mais a razão, a justiça; a prudência, ao filho (Hêmon); ao povo, ao adivinho (Tirésias), aos deuses e causou uma desgraça ainda maior do que a que já estava acontecendo.

Por mais que seja uma lenda da mitologia grega, ela pode ser muito útil nos dias de hoje, imagine que a ideologia de Creonte (em Antígona) é o positivismo jurídico tradicional, que às leis e decretos do mesmo, seja a Lei da Alemanha Nazista, com o holocausto, às leis da escravidão ... entre outros exemplos.

Ou seja, não é porque algo é legalizado, ou permitido pela lei, que seja automaticamente moral e correto.

[...]

Amei demais, lerei mais livros de Sófocles, ademais, teatros e peças gregas, adoro um drama bem escrito. ??

Trechos Preferidos ?????

Livro: Édipo em Colono

Peço tão pouco e me dão menos que esse pouco e isso basta-me; de fato, os sofrimentos, a longa convivência e meu altivo espírito me ensinam a ser paciente.

(...) quando ele (Febo) proclamou o meu destino cheio de infelicidade disse que este lugar seria o meu refúgio, depois de errar por muitos anos, ao chegar a este solo onde acharia finalmente um paradeiro acolhedor, inda que fosse para encerrar aqui a minha triste vida;e por haver morado nesta região traria o bem a quantos me acolhessem e ruína certa a quem quisesse repelir-me, fazendo-me voltar à estrada. Prosseguindo, o deus me descreveu sinais reveladores dos eventos futuros, como terremotos, relâmpagos vindos de Zeus, talvez trovões.


Tende piedade dos vestígios infelizes de Édipo, que já não é o homem de antes!

(...) quero ouvir-lhes as palavras, pois as informações nos fazem ser prudentes.

Não agistes por causa de minha pessoa e de meus atos.
Se eu pudesse falar agora de meu pai e minha mãe, perceberíeis que meus atos foram de fato muito mais sofridos que cometidos


Ah! Duplamente doces nomes, pai, irmã!
Sofri demais para encontrar-vos e hoje sofro pela segunda vez ao ver-vos neste estado! (ISMENE)


É tão pouco exaltar um mísero ancião quando a melhor parte da vida já passou?

(...) ninguém avançou para ajudar-me, a mim, que só queria a morte. (...) quando amadureceu a minha dor e percebi que a minha ira me levara longe demais punindo-me por velhos erros.

Guia-me, grande amigo; vou seguir-te em tudo.

(...) penso que uma pessoa só pode falar por muitas outras se o fizer piedosamente.

(...) quanto a ti, Antígona, cuida de nosso pai aqui. Se é por um pai que nos cansamos, não falemos em fadiga.

[...]

Sei muito bem, ancião, que sou apenas homem e que não me pertence o dia de amanhã, da mesma forma que não és senhor do teu. (TESEU)
(...)
Venho para ofertar-te meu sofrido corpo;
ele é desagradável para quem o vê, mas o proveito que te poderá trazer torna-o mais valioso que o corpo mais belo. (ÉDIPO)
(...)
TESEU - Que benefício pretendes trazer-me assim?
ÉDIPO - Com o tempo saberás; neste momento, não.
TESEU - Quando esse benefício se revelará?
ÉDIPO - Quando eu morrer e me tiveres sepultado.
TESEU - Falas apenas do final de tua vida;
esqueces-te do tempo que ainda te resta, ou não dás o menor valor a todo ele?
ÉDIPO - Em minha opinião o fim abrange tudo.

[...]

(...) somente os deuses fogem aos males da velhice e aos da morte; o tempo onipotente abate tudo mais; decai a força da terra, decai o corpo; a lealdade finda e floresce a perfídia

(...) durante a sucessão interminável das noites e dos dias que o tempo infinito vai produzindo, podem eclodir de súbito lutas armadas capazes de destruir as boas relações que hoje vos aproximam.

Infladas pela cólera as ameaças com frequência se propagam como palavras vãs, mas logo que o espírito retoma o seu domínio elas desaparecem.

[...]

(...) só se eu fosse a mais ignóbil de todas as criaturas não me comoveria com tua desgraça, vendo-te aqui na deplorável condição de um estrangeiro permanentemente errante, um mendigo amparado apenas pela filha que nunca imaginei ver reduzida assim a tais extremos de penúria ? infortunada! ?, guiando-te e proporcionando-te alimento, levando a vida de pedinte nessa idade, sem conhecer o casamento é à mercê em seu caminho de qualquer estuprador.
(...) consente em regressar agora à tua pátria, à casa que foi de teus pais, dizendo adeus a esta terra acolhedora.
Ela é digna de ti, mas tua própria terra tem mais direito à tua consideração, pois em tempos passados ela te nutriu. (CREONTE)

(...) hoje chegas aqui, com a boca mentirosa e com a língua afiada, mas tuas palavras hão de trazer-te mais males que benefícios. (ÉDIPO)

(...)

CREONTE - Ah! Infeliz! Nem todo o tempo já vivido deu-te bom senso; aviltas a tua velhice!
ÉDIPO - És hábil em palavras; digo-te, porém, que jamais encontrei na vida um homem justo capaz de falar bem sobre qualquer assunto.
CREONTE - Falar demais não é falar como convém.
ÉDIPO - Queres dizer que falas pouco e como deves?

[...] Sorri horrores com essa parte, quando CREONTE tentou levar ANTÍGONA a força para Tebas. ???

CORIFEU - Solta-a, ou vais sentir a força de meu braço!
CREONTE - Não me dês ordens, pois não és o meu senhor!

[...]

(...) te deixas dominar por essa cólera que é sempre a tua ruína.

[...] ÉDIPO amaldiçoado CREONTE. ?

(...) covarde máximo, ansioso por privar-me de mais dois olhos além dos que já perdi, agora que estou indefeso, e por voltar tranquilamente a percorrer o teu caminho!
Por isso queira o Sol, o deus onividente, dar-te algum dia, a ti e à tua raça, uma velhice igual à que eu estou vivendo!
(...)
Eles me veem, e também a ti, mas sabem que minha reação aos teus atos cruéis se manifesta apenas em simples palavras.

[...]

O fraco vence o forte quando a causa é justa.

Creonte, que ainda vês ali, disposto a retirar-se depois de me arrebatar minhas filhas queridas, meu único bem.

(...) os anos que viveste fizeram de ti ao mesmo tempo um ancião e um insensato.

Por tua origem deverias ser bondoso;
teus atos, entretanto, demonstram que és mau.

A cólera não envelhece e só a morte a doma; apenas os defuntos não a sentem.

[...]

Agora explica-me: se por meio do oráculo a voz de um deus disse ao meu pai que um filho seu um dia o mataria, como poderias condenar-me por essa morte justamente, a mim, que ainda não tinha sequer nascido, que nenhum pai havia até então gerado, que nenhum útero de mãe já concebera?
E se, nascido apenas para desventuras ? como nasci ?, vi-me diante de meu pai, fui obrigado a enfrentá-lo e o matei sem ter a mínima noção do que fazia e sem saber também quem era a minha vítima, como alguém poderia agora condenar-me por um ato sabidamente involuntário?

(...) não vou calar-me depois de ouvir tuas palavras infamantes?

Responde apenas a uma pergunta minha:
se alguém aparecesse aqui neste momento e tentasse matar-te ? a ti, Creonte, o justo ?, quererias saber se quem te ameaçava era teu pai, ou antes o castigarias?
Penso que por amor à vida punirias teu agressor sem maiores indagações quanto ao teu pleno direito de eliminá-lo.
Pois esta foi exatamente a desventura com que me defrontei, levado pelos deuses.
Se a alma de meu pai inda tivesse vida não me desmentiria agora. Tu, porém, que não és justo e sempre tens a pretensão de estar falando bem, sem fazer distinção entre os assuntos lícitos e os interditos, vens lançar sobre mim essas infâmias todas, apesar de haver tanta gente nos ouvindo!

[...]

Tesouro obtido pela astúcia desonesta não se conserva.

[...]

ÉDIPO - Ah! Minhas filhas! Vinde a mim, ao vosso pai!
Quero sentir os vossos corpos novamente, pois já perdera as esperanças de encontrar-vos!
ANTÍGONA - Será como desejas; teu prazer é o nosso.
(...)
ÉDIPO - Meus dois bordões!
ANTÍGONA - E fracas como tu, meu pai!
ÉDIPO - Para mim, todavia, o bem mais estimado.
Mesmo na morte, filhas, não conhecerei desventura total se apenas vos sentir perto de mim. Chegai-vos, abraçai-me agora e tereis posto fim a esta solidão que torna lastimável minha vida errante.

[...]

(...) acima de todos os homens, encontrei piedade, retidão, e lábios avessos à mentira.

Teseu, peço-te, rei, que me estendas agora a tua mão direita; quero apertá-la, e se for lícito desejo beijar-te a fronte? Mas me excedo na ousadia!
Como, sendo o infeliz que sou, posso atrever-me a impor-te o contacto com um homem cujo corpo abriga a mácula de todos os pecados?
Não vou tocar-te, nem permito que me toques, Somente quem passou por provações iguais pode participar das minhas; cumprimento-te de onde me encontro e peço-te que no futuro me ajudes lealmente como até agora.
(ÉDIPO)

Não quero ornar a minha vida com discursos, e sim com atos; já dei provas do que digo, pois não faltei a uma sequer das promessas feitas há pouco tempo. (TESEU)

(...) quanto à vitória consequente à nossa luta, por que irei vangloriar-me inutilmente?

(...) homem nenhum deve ser negligente a respeito de fatos.

Ouve-me, pai, embora eu seja muito jovem para dar-te conselhos.

Planos perversos se revelam na linguagem.

Não olhes tuas desventuras atuais, e sim as do tempo passado, cuja culpa coube ao teu pai e à tua mãe; se meditares, verás

(...) tenho certeza ? que maus sentimentos só podem conduzir a resultados maus.

(...) não convém a quem recebeu um favor recusar-se a pagá-lo em retribuição.

Quem não se satisfaz com um quinhão normal de vida e deseja um maior, parece-me em verdade um insensato.

Quanto aos prazeres, não os discernimos e nossa vista os buscará em vão logo que para nossa desventura chegamos ao limite prefixado.

(...) então o nosso alívio único será aquele que dará a todos o mesmo fim, na hora de chegar de súbito o destino procedente do tenebroso reino onde não há cantos nem liras, onde não há danças ? ou seja, a Morte, epílogo de tudo.
Melhor seria não haver nascido; como segunda escolha bom seria voltar logo depois de ver a luz à mesma região de onde se veio.

(...) o momento em que nos abandona a juventude, levando consigo a inconsciência fácil dessa idade.

[...]

POLINICES - Ah! Meninas! Que faço? Chorarei primeiro por minha própria desventura, ou pela dele, meu pai idoso, que já posso ver ali?
Venho encontrá-lo aqui convosco, em solo estranho, usando esses andrajos gastos, horrorosos, cujo tecido lhe maltrata os velhos flancos mal cobertos, enquanto sobre sua fronte o vento agita-lhe os cabelos desgrenhados que não me deixam ver-lhe os olhos sem visão. (...)
Eu, o maldito, fico a par desses horrores tarde demais, e testemunho que provei ser o pior dos homens todos no tocante aos cuidados para contigo; de mim mesmo, e não de outro qualquer, fica sabendo disso.

Não é possível corrigir faltas passadas, nem tampouco podemos torná-las mais graves. (POLINICES)

(...) muitas vezes certas palavras de júbilo ou de angústia, talvez ternura, podem até restituir a voz aos mudos. (ANTÍGONA)

POLINICES - Continuando, por que vim até aqui?
Para fazer-te como suplicante, pai uma prece em meu próprio nome.
(...) todos nós, por estas tuas filhas, pai, e até por tua vida, juntos imploramos que diminuas o grave ressentimento contra teu filho no momento da partida para vingar-se de um irmão usurpador que o despojou de sua pátria. Se devemos dar crédito aos oráculos, o vencedor será aquele que obtiver o teu apoio.
Agora, então, por nossas fontes, pelos deuses de nossa raça, ouve, cede à minha súplica!
Que sou aqui? Simples pedinte, um exilado, como tu mesmo um estrangeiro. Ambos tivemos destino igual, sempre lisonjeando os outros. Etéocles, muito ao contrário, atualmente ? ah! infeliz de mim! ? é rei em nosso trono e zomba vaidosamente de nós dois.
Mas, se eu contar com teu apoio em meus propósitos, dentro de pouco tempo e com pouca fadiga poderei dispersar aos ventos suas cinzas.
Em seguida regressarás ao teu palácio, e a ele voltarei também, logo depois de o forçar a deixá-lo. Se for teu desejo, já posso alardear triunfo, mas sem ti não sei sequer se sobreviverei à luta.

ÉDIPO
Dirigindo-se a POLINICES.

Perverso, que quando tiveste o cetro e o trono usufruídos hoje por teu próprio irmão em Tebas, expulsaste, tu mesmo, teu pai e o transformaste simplesmente num apátrida coberto por estes andrajos cujo aspecto te leva às lágrimas, porém somente agora que vives nessa angústia semelhante à minha!
(...) se eu não tivesse gerado estas meninas a quem devo o meu sustento, e dependesse só de ti para viver, já estaria morto. Devo-lhes a vida e minha nutrição, pois elas se comportam como se fossem homens em vez de mulheres para ajudar-me em minha existência penosa.
Etéocles e tu nasceram de outro pai, e não de mim. Por isso os olhos do destino fixam-se em ti. (...)
Ouve bem: jamais poderá conquistá-la; antes morrerás sangrentamente e teu irmão cairá contigo.
(...) estas duas meninas, ao contrário, não se portaram como vós.
Por isso minhas maldições serão mais fortes que tuas súplicas e que teu trono e cetro.
Vai-te embora daqui, coberto de vergonha, filho sem pai, o mais perverso dos perversos, levando as maldições que chamo contra ti.
Queiram os deuses que jamais a tua lança possa vencer a terra que te viu nascer!
(...) ferido pela mão de teu irmão usurpador, morras e ao mesmo tempo o mates!
Esta é a minha maldição.


POLINICES - Em nome de todos os deuses vos suplico:
se um dia sua maldição se consumar e se tiverdes meios de voltar a Tebas, dai-me uma sepultura e oferendas fúnebres! Assim, aos elogios que hoje recebeis por vossa carinhosa ajuda a este homem somar-se-ão outros louvores não menores pelos cuidados que me houverdes dispensado.

(...) quanto a vós duas, queira Zeus conduzir-vos por caminhos bons se após a minha morte me proporcionardes os funerais pedidos, já que não podeis fazer por mim ainda em vida coisa alguma.

(...)
POLINICES - Não chores por mim!
ANTÍGONA - Mas, quem não choraria, meu irmão, sabendo que já vais caminhando para o outro mundo aberto à tua frente para te engolir?
(...)
POLINICES - Se for inevitável, terei de morrer.
ANTÍGONA - Serei muito infeliz se tiver de perder-te!
POLINICES - Se tudo vai acontecer de um modo ou de outro, somente os deuses sabem.

[...]

(...) eu mesmo nunca diria que jamais os deuses tomam em vão as suas decisões.
O tempo cuida, cuida sempre delas, tirando agora a boa sorte de uns e dando-a no dia seguinte a outros.

Sê generoso, deus, sê generoso se trazes à terra que é nosso berço alguma estranha dádiva!
Mostra-te receptivo à minha prece e só por teres visto este maldito não queiras dar-me participação em tuas recompensas desastrosas!

Cidades sem número, apesar de bem governadas, muita vezes adotam a arrogância em relação a outras, porém o olhar dos deuses, embora demore, descobrirá aquelas que, contrariando a divina vontade, agem com violência.

(...) imploro-vos que o estrangeiro desça à planície dos mortos, à morada de Estige, onde tudo desaparece, sem enfrentar as penas da agonia!
Amarguras sem conta o abateram, sem culpa sua, mas a divindade vai premiá-lo honrando-o novamente.

ÉDIPO se despedindo das suas filhas ??

"Ah! Minhas filhas!"
?De hoje em diante vosso pai já não existe;
de fato, agora acaba-se tudo que fui e cessa o vosso encargo de cuidar de mim ? muito penoso, eu sei, minhas pobres crianças ?;
uma palavra só, porém, vos recompensa por tantos sofrimentos: de ninguém tivestes amor maior que o deste homem sem o qual ireis viver pelo resto de vossas vidas!?

ANTÍGONA - De certo modo antigas desventuras podem ter sido prazeres perdidos; as coisas menos doces eram doces enquanto o tinha aqui entre meus braços!
Meu pai! Amigo meu! Já foste embora levado para sempre em direção aos abismos do mundo subterrâneo (...)
Ele morreu em solo estranho de acordo com sua própria vontade.
Seu leito está oculto para sempre e ao nosso luto não faltarão lágrimas.
Meus olhos, pai, não param de chorar sentidamente, e não sei ? ai de mim! ? se terá fim essa tristeza imensa que me deixaste. Querias morrer em solo estranho, mas, por que morreste assim, tão só, longe dos meus cuidados?

CORO - Mas, já que sua vida terminou de maneira feliz, cessai, amigas, de lamentar-vos, pois ninguém na vida está a salvo da infelicidade.

TESEU - Cessai vossas lamentações, meninas!
Quando contamos com a benevolência dos deuses infernais, por que gemer?
Provocaríamos a sua cólera.


Trechos Preferidos ?????

Livro: Antígona

(...) não ouvi notícia alguma, Antígona, fosse agradável, fosse triste, desde que nos levaram nossos dois irmãos mortos no mesmo dia um pela mão do outro.

(...) ditou Creonte que se desse a honra da sepultura a um de nossos dois irmãos enquanto a nega ao outro? Dizem que mandou proporcionarem justos funerais a Etéocles com a intenção de assegurar-lhe no além-túmulo a reverência da legião dos mortos; dizem, também, que proclamou a todos os tebanos a interdição de sepultarem ou sequer chorarem o desventurado Polinices:
sem uma lágrima, o cadáver insepulto irá deliciar as aves carniceiras que hão de banquetear-se no feliz achado.
Esse é o decreto imposto pelo bom Creonte.
(...)
Ele não dá pouca importância ao caso: impõe aos transgressores a pena de apedrejamento até a morte perante o povo todo.

ANTÍGONA - Ajudarás as minhas mãos a erguer o morto?
ISMENE - Vais enterrá-lo contra a interdição geral?
ANTÍGONA - Ainda que não queiras ele é teu irmão e meu; e quanto a mim, jamais o trairei.
ISMENE - Atreves-te a enfrentar as ordens de Creonte?
ANTÍGONA - Ele não pode impor que eu abandone os meus.
ISMENE - Pobre de mim! Pensa primeiro em nosso pai, em seu destino, abominado e desonrado, cegando os próprios olhos com as frementes mãos ao descobrir os seus pecados monstruosos; também, valendo-se de um laço retorcido, matou-se a mãe e esposa dele ? era uma só ? e, num terceiro golpe, nossos dois irmãos num mesmo dia entremataram-se (coitados!), fraternas mãos em ato de extinção recíproca.
Agora que restamos eu e tu, sozinhas, pensa na morte inda pior que nos aguarda se contra a lei desacatarmos a vontade do rei e a sua força. E não nos esqueçamos de que somos mulheres e, por conseguinte, não poderemos enfrentar, só nós, os homens.
Enfim, somos mandadas por mais poderosos e só nos resta obedecer a essas ordens e até a outras inda mais desoladoras.
Peço indulgência aos nossos mortos enterrados mas obedeço, constrangida, aos governantes;
ter pretensões ao impossível é loucura.
ANTÍGONA - Não mais te exortarei e, mesmo que depois quisesses me ajudar, não me satisfarias, Procede como te aprouver; de qualquer modo hei de enterrá-lo e será belo para mim morrer cumprindo esse dever: repousarei ao lado dele, amada por quem tanto amei e santo é o meu delito, pois terei de amar aos mortos muito, muito tempo mais que aos vivos.

Não deves recear por mim; cuida de ti!

[...]

Zeus, em verdade, odeia mais que tudo a presunção das línguas atrevidas e ao vê-los vir, numa torrente imensa, na ostentação de suas muitas armas douradas, fulminou com labaredas aquele que se imaginava prestes a proclamar vitória em sua meta ? o topo das muralhas da cidade.

(...) aqueles dois infortunados nascidos de um só pai e uma só mãe, que um contra o outro ergueram as espadas, ambos irresistíveis, para enfim compartilharem uma mesma morte.

Não é possível conhecer perfeitamente um homem e o que vai no fundo de sua alma, seus sentimentos e seus pensamentos mesmos, antes de o vermos no exercício do poder, senhor das leis.

(...) jamais concederei aos homens vis maiores honras que as merecidas tão somente pelos justos.

[....]

(...) aos filhos de Édipo: que Etéocles, morto lutando pela pátria, desça cercado de honras marciais ao túmulo e leve para o seu repouso eterno tudo que só aos mortos mais ilustres se oferece; mas ao irmão, quero dizer, a Polinices, que regressou do exílio para incendiar a terra de seus pais e até os santuários dos deuses venerados por seus ascendentes e quis provar o sangue de parentes seus e escravizá-los, quanto a ele foi ditado que cidadão algum se atreva a distingui-lo com ritos fúnebres ou comiseração; fique insepulto o seu cadáver e o devorem cães e aves carniceiras em nojenta cena.
São estes os meus sentimentos e jamais concederei aos homens vis maiores honras que as merecidas tão somente pelos justos.
Só quem quiser o bem de Tebas há de ter a minha estima em vida e mesmo após a morte.


CORIFEU - (...) tens poder ? eu reconheço ? para impor a lei de tua escolha, seja em relação aos mortos, seja a nós, que ainda estamos vivos.
(...)
CORIFEU - Qual é, então, a ordem que nos dás ainda?
CREONTE - Sede implacáveis com os rebeldes ao edito.
CORIFEU - Ninguém é louco a ponto de buscar a morte.

[...]

Nesse debate eu percorria meu caminho com passos indecisos, de maneira tal que nunca mais a curta estrada se acabava.

GUARDA - O morto? alguém há pouco o sepultou e foi-se embora; apenas pôs alguma terra seca recobrindo as carnes e praticou deveres outros de piedade.
CREONTE - Que dizes? Quem? Que homem se atreveu a tanto?

GUARDA - Então brotaram entre nós palavras ásperas de sentinelas acusando sentinelas.
Até a brigas nós teríamos chegado sem que os presentes impedissem; um por um, todos nos acusamos uns depois dos outros, mas afinal a culpa não foi apurada, pois nada fora percebido por ninguém.
Já íamos pegar com as mãos ferros em brasa, atravessar o fogo aceso e pelos deuses jurar convictos que não éramos autores nem cúmplices na trama ou na realização.
Por fim, depois de nossas investigações terem falhado, um guarda se manifestou, fazendo-nos baixar o rosto para o chão, apavorados, pois não nos abalançávamos a contestá-lo e víamos que era impossível fugir a uma desgraça se lhe obedecêssemos;
ele nos disse que era nossa obrigação comunicar-te o fato imediatamente e não pensar em ocultá-lo; a sugestão foi logo aceita e no sorteio ? ai!, ai de mim! ? me coube o prêmio de trazer-te a novidade.

E estou aqui, contra teu gosto e contra o meu, pois ninguém aprecia quem dá más notícias.

[...]

Nunca entre os homens floresceu uma invenção pior que o ouro; até cidades ele arrasa, afasta os homens de seus lares, arrebata e impele almas honestas às ações mais torpes e incita ainda os homens ao aviltamento, à impiedade em tudo. Mas, quem age assim por interesse, um dia paga o justo preço.

(...) aprendereis ao mesmo tempo que não é bom querer ganhar de qualquer modo;
vereis que o lucro desonesto leva os homens com mais frequência à ruína que à prosperidade!

(...) é terrível quando, embora preparado para ser bom juiz, um homem julga mal!

[...]

GUARDA - O fato aconteceu assim: quando voltamos, com aquelas tuas ameaças horrorosas pesando sobre nós, tiramos toda a terra que recobria o corpo e cuidadosamente despimos o cadáver meio decomposto;
então nós nos sentamos no alto da colina, tendo a favor o vento para que o fedor não viesse contra nós. Estava cada um bem acordado e se esforçava por manter alerta o seu vizinho com descomposturas, se alguém se descuidava da tarefa dura.
Assim passou o tempo até que o sol brilhante chegou a meio céu em sua caminhada e começou a nos queimar com seu calor;
nesse momento um vento repentino e forte soprou em turbilhão ? celeste turbulência ? pela campina toda, desfolhando as árvores das redondezas. O ar em volta escureceu e para suportar o flagelo divino tivemos de fechar os olhos. Ao cessar aquilo, muito tempo após, vimos a moça; ela gritava agudamente, como um pássaro amargurado ao ver deserto o caro ninho, sem suas crias. Ela, vendo o corpo nu, gemendo proferiu terríveis maldições contra quem cometera a ação; amontoou com as mãos, de novo, a terra seca e levantando um gracioso jarro brônzeo derramou sobre o cadáver abundante libação.
Corremos quando vimos aquele espetáculo e todos juntos seguramo-la, mas ela não demonstrou estar com medo; então pusemo-nos a interrogá-la sobre o seu procedimento passado e atual; para alegria minha, e dó ao mesmo tempo, ela nada negou.
É bom livrarmo-nos de males mas é triste lançar amigos nossos na infelicidade.
Mas, isso tudo para mim neste momento importa menos do que a minha salvação.

Tu, então, que baixas o rosto para o chão, confirmas a autoria desse feito, ou negas?
ANTÍGONA - Fui eu a autora; digo e nunca negaria.

CREONTE dirige-se a ANTÍGONA.

CREONTE - Agora, dize rápida e concisamente:
sabias que um edito proibia aquilo?
ANTÍGONA - Sabia. Como ignoraria? Era notório.
CREONTE E te atreveste a desobedecer às leis?

ANTÍGONA - (...) não me pareceu que tuas determinações tivessem força para impor aos mortais até a obrigação de transgredir normas divinas, não escritas, inevitáveis; não é de hoje, não é de ontem, é desde os tempos mais remotos que elas vigem, sem que ninguém possa dizer quando surgiram.

E não seria por temer homem algum, nem o mais arrogante, que me arriscaria a ser punida pelos deuses por violá-las.
Eu já saiba que teria de morrer (e como não?) antes até de o proclamares, mas, se me leva a morte prematuramente, digo que para mim só há vantagem nisso.
Assim, cercada de infortúnios como vivo, a morte não seria então uma vantagem?

Por isso, prever o destino que me espera é uma dor sem importância. Se tivesse de consentir em que ao cadáver de um dos filhos de minha mãe fosse negada a sepultura, então eu sofreria, mas não sofro agora.

Se te pareço hoje insensata por agir dessa maneira, é como se eu fosse acusada de insensatez pelo maior dos insensatos.

CREONTE Dirigindo-se a ANTÍGONA.

CREONTE - Fica sabendo que os espíritos mais duros dobram-se muitas vezes; o ferro mais sólido, endurecido e temperado pelo fogo, é o que se vê partir-se com maior frequência, despedaçando-se; sei de potros indóceis que são domados por um pequenino freio.
Quem deve obediência ao próximo não pode ter pensamentos arrogantes como os teus.

Dirigindo-se ao CORO.

CREONTE - Ela já se atrevera, antes, a insolências ao transgredir as leis apregoadas; hoje, pela segunda vez revela-se insolente:
ufana-se do feito e mostra-se exultante!
Pois homem não serei ? ela será o homem! ? se esta vitória lhe couber sem punição!
Embora fosse minha irmã a sua mãe ? mais próxima de mim, portanto, pelo sangue, que todos os parentes meus, fiéis devotos do grande Zeus no santuário de meu lar ? nem ela nem a irmã conseguirão livrar-se do mais atroz destino, pois acuso a outra de cúmplice na trama desse funeral.
E chamem-na; via-a lá dentro há pouco tempo;
estava transtornada, como que incapaz de dirigir a sua mente. Muitas vezes o íntimo de quem não age retamente, na sombra, indica a traição antes do feito.
Além do mais, odeio quem, pilhado em falta, procura dar ao crime laivos de heroísmo.

Saem os guardas para buscar ISMENE.

ANTÍGONA - Então, por que demoras? Em tuas palavras não há ? e nunca haja! ? nada de agradável.
Da mesma forma, as minhas devem ser-te odiosas.
E quanto à glória, poderia haver maior que dar ao meu irmão um funeral condigno?

Designando o CORO com um gesto.

Eles me aprovariam, todos, se o temor não lhes tolhesse a língua, mas a tirania, entre outros privilégios, dá o de fazer e o de dizer sem restrições o que se quer.
CREONTE - Só tu, entre os tebanos, vês dessa maneira.
ANTÍGONA - Eles também, mas silenciam quando surges.
CREONTE - Não coras por pensar, só tu, diversamente?
ANTÍGONA - Não há vergonha alguma em nos compadecermos dos que nasceram das entranhas de onde viemos.
CREONTE - E aquele que morreu lutando contra o outro também não era teu irmão, do mesmo sangue?
ANTÍGONA - Do mesmo sangue, de um só pai e uma só mãe.
CREONTE - Por que, então, distingues impiamente o outro?
ANTÍGONA - O morto não confirmará essas palavras.
CREONTE - Confirmará, se a distinção o iguala ao ímpio.
ANTÍGONA - Foi como irmão que ele morreu, não como escravo.
CREONTE - Destruindo a cidade; o outro, defendendo-a.
ANTÍGONA - A morte nos impõe as suas próprias leis.
CREONTE - Mas o homem bom não quer ser igualado ao mau.
ANTÍGONA - Quem sabe se isso é consagrado no outro mundo?
CREONTE - Nem morto um inimigo passa a ser amigo.
ANTÍGONA - Nasci para compartilhar amor, não ódio.
CREONTE - Se tens de amar, então vai para o outro mundo, ama os de lá. Não me governará jamais mulher alguma enquanto eu conservar a vida!

Aproxima-se ISMENE, vindo do palácio entre guardas.

CORO - Vejo transpor a porta agora Ismene chorando lágrimas de irmã e amiga;
paira uma nuvem sobre sua fronte escurecendo as cores de seu rosto e umedecendo-lhe a formosa tez.
CREONTE - Vamos, tu que, dissimulada como víbora em minha própria casa, insidiosamente sugavas o meu sangue, sem que eu percebesse que alimentava duas pestes e conluios contra o meu trono, dize-me: confirmarás também a participação naquele enterro, ou negarás, jurando desconhecimento?
ISMENE - Eu pratiquei a ação, se ela consente nisso; sou cúmplice no crime e aceito as consequências.
ANTÍGONA - Mas nisso não terás o apoio da justiça, pois nem manifestaste aprovação à ideia nem eu te permiti participar da ação.
ISMENE - Notando os sofrimentos teus, não me envergonho de percorrer contigo o mar de tuas dores.
ANTÍGONA - Os mortos sabem quem agiu, e o deus dos mortos; não quero amiga que ama apenas em palavras.
ISMENE - Não me julgues indigna de morrer contigo, irmã, e honrar o morto com os ritos sagrados.
ANTÍGONA - Não compartilhes minha morte, nem aspires a feitos que não foram teus; basta que eu morra.
ISMENE - Que valerá a vida para mim sem ti?
ISMENE - Como te poderei ser útil, mesmo agora?
ANTÍGONA - Salva-te, Ismene. Não te invejo por fugires.
ISMENE - Pobre de mim! Não participo de teu fim?
ANTÍGONA - A tua escolha foi a vida; a minha, a morte.
(...)
ANTÍGONA - A uns parecerás sensata; a outros, eu.
ISMENE - De qualquer modo, nossas faltas são iguais.
ANTÍGONA - Não te preocupes; estás viva, mas minha alma há tempo já morreu, para que eu sirva aos mortos.
CREONTE - Afirmo que uma destas moças neste instante nos revelou sua demência; a outra é insana, sabidamente, desde o dia em que nasceu.
ISMENE - É, rei, mas a razão inata em todos nós está sujeita a mutações nos infelizes.
CREONTE Isto se deu com a tua, quando preferiste ser má em companhia de pessoas más.
ISMENE - Sem ela, que prazer teria eu na vida?
CREONTE Não digas ?ela?; não existe mais.
ISMENE Irás matar, então, a noiva de teu filho?
CREONTE Ele pode lavrar outras terras mais férteis.
ISMENE - Isso não foi o que ele e ela pactuaram.
CREONTE - Detesto, para os filhos meus, mulheres más.
ANTÍGONA - Como teu pai te avilta, meu querido Hêmon!
CREONTE - Molestas-me demais com esse casamento!
CORIFEU - Vais mesmo arrebatá-la de teu próprio filho?
CREONTE - A morte impedirá por mim o casamento.
CORIFEU - Parece resolvido que ela irá morrer.

Saem os guardas levando ANTÍGONA e ISMENE, CREONTE permanece em cena, meditativo.

CORO - Felizes são aqueles cuja vida transcorre isenta de todos os males, pois os mortais que um dia têm os lares desarvorados pelas divindades jamais se livrarão dos infortúnios por todas as seguidas gerações.(...)
Vejo às antigas infelicidades da casa dos labdácidas juntarem-se as novas desventuras dos defuntos, e as gerações mais novas não resgatam as gerações passadas. Um dos deuses agarra-se insaciável a elas todas e as aniquila; não há salvação.
O pálido lampejo de esperança que sobre o último rebento de Édipo surgira, esvai-se agora na poeira dos deuses infernais, ensanguentada pelo arrebatamento das palavras e por corações cheios de furor.

Aproxima-se HÊMON.

Mas, Hêmon vem aí, o filho teu mais novo; estará ele angustiado com o fim de sua prometida, Antígona, e amargurado com as frustradas núpcias?

CREONTE - Já saberemos, e melhor que por profetas.
Ficaste enraivecido com teu pai, meu filho, quando soubeste da sentença irrevogável imposta à tua noiva? Ou somos sempre amigos, seja qual for minha atitude quanto a ti?
HÊMON - Sou teu, meu pai. Com teus conselhos úteis traças minha conduta certa; casamento algum me importa mais que tua reta orientação.
CREONTE - Deve ser esta, justamente, a diretriz inquebrantável de teu coração, meu filho:
ser dócil à vontade de teu pai em tudo.
Desejam para isso os homens em seus lares crianças obedientes que eles engendraram para mais tarde devolver aos inimigos dos pais o mal que lhes fizeram, e também honrar, como seus pais honraram, os amigos.
Jamais deves perder o senso, filho meu, pela volúpia de prazeres, por mulheres, ciente de que tal satisfação esfria quando a mulher com quem convives é perversa.
Existirá, então, ferida mais pungente que uma esposa má? Deves repudiá-la como inimiga; deixa a moça desposar alguém lá no outro mundo. Já que a surpreendi, só ela na cidade toda, em ostensiva oposição às minhas ordens, não serei um mentiroso diante da cidade: mato-a! (...)
Aquele que na própria casa é cumpridor de seus deveres, mostrar-se-á também correto em relação ao seu país. Se alguém transgride as leis e as violenta, ou julga ser capaz de as impingir aos detentores do poder, não ouvirá em tempo algum meus elogios; muito ao contrário, aquele que entre os homens todos for escolhido por seu povo, deve ser obedecido em tudo, nas pequenas coisas, nas coisas justas e nas que lhe são opostas.
Estou seguro de que esse homem obediente será bom governante como foi bom súdito e na tormenta das batalhas ficará firme no posto, agindo como companheiro bravo e leal. Mas a anarquia é o mal pior; é perdição para a cidade e faz desertos onde existiam lares; ela é causadora de defecções entre as fileiras aliadas, levando-as à derrota. A submissão, porém, é a salvação da maioria bem mandada.
Devemos apoiar, portanto, a boa ordem, não permitindo que nos vença uma mulher.
Se fosse inevitável, mal menor seria cair vencido por um homem, escapando à triste fama de mais fraco que as mulheres!

CORO - Só o tempo já vivido não nos deixa errar

HÊMON - Os deuses, pai, implantam no homem a razão ? o bem maior de todos.
Mas outros também podem ter boas ideias.
É meu dever notar por ti, naturalmente, tudo que os outros dizem, fazem ou censuram, pois o teu cenho inspirador de medo impede os homens simples de pronunciar palavras que firam teus ouvidos. Eu, porém, na sombra, ouço o murmúrio, escuto as queixas da cidade por causa dessa moça: ?Nenhuma mulher?, comentam, ?mereceu jamais menos que ela essa condenação ? nenhuma, em tempo algum, terá por feitos tão gloriosos quanto os dela sofrido morte mais ignóbil; ela que, quando em sangrento embate seu irmão morreu não o deixou sem sepultura, para pasto de carniceiros cães ou aves de rapina, não merece, ao contrário, um áureo galardão??
Este é o rumor obscuro ouvido pelas ruas.
Com relação a mim, meu pai, nenhum dos bens é mais precioso que tua satisfação.
Existiria para os filhos ornamento mais enobrecedor que a fama gloriosa de um pai feliz, ou para um pai a de seus filhos?
Este é o rumor obscuro ouvido pelas ruas.
Com relação a mim, meu pai, nenhum dos bens é mais precioso que tua satisfação.
Existiria para os filhos ornamento mais enobrecedor que a fama gloriosa de um pai feliz, ou para um pai a de seus filhos?

Não tenhas, pois, um sentimento só, nem penses que só tua palavra e mais nenhuma outra é certa, pois se um homem julga que só ele é ponderado e sem rival no pensamento e nas palavras, em seu íntimo é um fútil.

Não há vergonha alguma, mesmo sendo sábio, em aprender cada vez mais, sem presunções.

Não vês, ao lado das torrentes engrossadas pelas tormentas, como as árvores flexíveis salvam-se inteiras, e as que não podem dobrar-se são arrancadas com a raiz?
(....)
Exorto-te: recua em tua ira e deixa-te mudar! E se eu, embora jovem, posso dar-te opiniões, afirmo que nos homens o ideal seria nascer já saturados de toda a ciência, mas, se não é assim, devemos aprender com qualquer um que fale para nosso bem.

CORIFEU - Convém, senhor, que aprendas com as palavras dele se há nelas algo de oportuno; e tu, também, com as de teu pai; falaram bem ambos os lados.
CREONTE - Posso, na minha idade, receber lições de sensatez de alguém da natureza dele?
HÊMON - Se houver razões. Sou jovem? Olha mais, então, para os meus atos que para os meus poucos anos.
CREONTE - Crês que exaltar rebeldes é ato louvável?
HÊMON - Eu não te exortaria a respeitar os maus.
CREONTE - E por acaso ela não sofre desse mal?
HÊMON - Não falam deste modo os cidadãos de Tebas.
CREONTE - Dita a cidade as ordens que me cabe dar?
HÊMON - Falaste como se fosses jovem demais!
CREONTE - Devo mandar em Tebas com a vontade alheia?
HÊMON - Não há cidade que pertença a um homem só.
CREONTE - Não devem as cidades ser de quem as rege?
HÊMON - Só, mandarias bem apenas num deserto.

CREONTE - Dirigindo-se ao CORO.

Ele parece um aliado da mulher!
HÊMON - Se és mulher, pois meus cuidados são contigo.
CREONTE - Discutes com teu pai, pior das criaturas?
HÊMON - Porque agindo assim ofendes a justiça.
CREONTE - Ofendo-a por impor respeito ao meu poder?
HÊMON - Tú mesmo o desrespeitas ultrajando os deuses.
CREONTE - Caráter sórdido, submisso a uma mulher!
HÊMON - Não me verás submisso diante de baixezas!
CREONTE - A tua fala toda, ao menos, é por ela!
HÊMON - Por ti, por mim e pelos deuses dos finados!
CREONTE - Jamais te casarás com ela ainda viva!
HÊMON - Pois ela morrerá levando alguém na morte!
CREONTE - O atrevimento leva-te a tais ameaças?
HÊMON - É atrevimento refutar ideias vãs?
CREONTE - Chorando aprenderás que vão é o teu saber!
HÊMON - Queres falar apenas, sem ouvir respostas?
CREONTE - Não tagareles tanto, escravo de mulher!
HÊMON - Não fosses tu meu pai, dir-te-ia um insensato!
CREONTE - Isto é verdade? Pelos céus, fica sabendo: essas censuras torpes não te alegrarão!

Dirigindo-se a um servo.

Vai já buscar essa mulher insuportável para que morra logo ao lado de seu noivo aqui presente, diante de seus próprios olhos!
HÊMON - Não deves esperar que ela morra ao meu lado (nem penses nisto!), nem me verás nunca mais.
Guarda essa fúria para teus dóceis amigos!

HÊMON sai precipitadamente.

CORIFEU - A cólera, senhor, levou-o em disparada.
A mente aflita é perigosa nesta idade.
CREONTE - Pode ele praticar em sua retirada ações além da força humana, ou meditá-las;
não salvará de seu destino as duas moças!
CORIFEU - Pretendes realmente exterminar as duas?
CREONTE - A que não o tocou não morre. Lembras bem.
CORIFEU - Já decidiste como há de morrer a outra?
CREONTE - Levando-a por deserta estrada hei de enterrá-la numa caverna pedregosa, ainda viva, deixando-lhe tanto alimento quanto baste para evitar um sacrilégio; não desejo ver a cidade maculada. Lá, em prece ao deus dos mortos ? único que ela venera ? talvez obtenha a graça de não perecer, ou finalmente aprenderá, embora tarde, que cultuar os mortos é labor perdido.
CORO - Amor, invicto no combate, Amor dissipador de todas as riquezas, que após vaguear nos mares e em recônditos esconderijos afinal repousas no doce rosto das moças em flor!
Nenhum dos imortais pode evitar-te nenhum dos homens de existência efêmera;
e perde logo o senso quem te encontra.
Até os justos forças à injustiça, desnorteando-lhe o pensamento, e levas a essas lutas pais e filhos.
Venceu o claro olhar da noiva bela, inspirador desse desejo igual às majestosas leis da natureza.

Aparece ANTÍGONA, conduzida por guardas.

Mas eu, diante do que vejo agora, sinto que as leis também não me refreiam e não consigo reprimir as lágrimas ao vislumbrar Antígona marchando para esse leito onde se acaba tudo.
ANTÍGONA - Concidadãos de minha pátria, vêde-me seguindo o meu caminho derradeiro, olhando o último clarão do sol, que nunca, nunca mais contemplarei.
O deus dos mortos, que adormece a todos, leva-me viva para os seus domínios sem que alguém cante o himeneu por mim, sem que na alcova nupcial me acolha um hino; caso-me com o negro inferno.
CORO - Mas partes para o mundo tenebroso dos mortos gloriosa e exalçada, sem que as doenças aniquiladoras te houvessem atingido, sem que as armas mortíferas ferissem o teu corpo; é por tua vontade e decisão que tu, apenas tu entre os mortais, descerás viva à região das sombras.
(...)
ANTÍGONA - Trouxeste-me à memória o mais pungente dos fatos ? o destino de meu pai, três vezes manifesto, o de nós todos, labdácidas famosos. Ah! Horrores do tálamo materno! Ah! Teus abraços incestuosos, minha mãe, com o pai de quem nasci! Como sou infeliz!
E para eles vou assim, maldita, sem ter chegado às bodas! Meu irmão infortunado! Que união a nossa!
Transformas-me, morrendo, em morta viva!

CORO - Inspiram piedade atos piedosos

ANTÍGONA - Sem que me chorem, sem amigo algum, sem cantos de himeneu sou arrastada ? pobre de mim! ? por sôfrego caminho!
Para desgraça minha nunca mais poderei ver a santa luz do sol!
E dos amigos nem um só lamenta esse meu doloroso fim sem lágrimas!

Reaparece CREONTE.

CREONTE aos guardas que conduzem ANTÍGONA.

Acaso não sabeis que hinos e lamúrias na hora de morrer jamais acabariam se houvesse o mínimo proveito em entoá-los?
Ides, ou não, levá-la imediatamente?
E quando a houverdes encerrado, como eu disse, em sua cavernosa sepultura, só, abandonada para, se quiser, morrer ou enterrar-se ainda viva em tal abrigo, estarão puras nossas mãos: não tocarão nesta donzela. Mas há uma coisa certa: ela será privada para todo o sempre da convivência com habitantes deste mundo.
ANTÍGONA - Túmulo, alcova nupcial, prisão eterna, cova profunda para a qual estou seguindo, em direção aos meus que a morte muitas vezes já acolheu entre os finados! Eu, a última e sem comparação a mais desventurada, vou para lá, antes de haver chegado ao termo de minha vida! Mas uma esperança eu tenho: meu pai há de gostar de ver-me, e tu também gostarás muito, minha mãe, e gostarás também, irmão querido, pois quando morreste lavei-te e te vesti com minhas próprias mãos e sobre tua sepultura eu espargi as santas libações. E agora, Polinices, somente por querer cuidar de teu cadáver dão-me esta recompensa! Mas na opinião da gente de bom senso todo o meu cuidado foi justo. Sim! Se houvera sido mãe de filhos, ou se o esposo morto apodrecesse exposto, jamais enfrentaria eu tamanhas penas tendo de opor-me a todos os concidadãos! Que leis me fazem pronunciar estas palavras?
Fosse eu casada e meu esposo falecesse, bem poderia encontrar outro, e de outro esposo teria um filho se antes eu perdesse algum; mas, morta minha mãe, morto meu pai, jamais outro irmão meu viria ao mundo. Obedeci a essas leis quando te honrei mais que a ninguém.
Creonte acha, porém, que errei, que fui rebelde, irmão querido! Assim ele me leva agora, cativa em suas mãos; um leito nupcial jamais terei, nem ouvirei hinos de bodas, nem sentirei as alegrias conjugais, nem filhos amamentarei; hoje, sozinha, sem um amigo, parto ? ai! infeliz de mim! ? ainda viva para onde os mortos moram!
Que mandamentos transgredi das divindades?
De que me valerá ? pobre de mim! ? erguer ainda os olhos para os deuses? Que aliado ainda invocarei se, por ser piedosa, acusam-me de impiedade? Se isso agrada aos deuses me conformo, embora sofra muito, com minha culpa, mas se os outros são culpados, que provem penas pelo menos tão pesadas quanto as que injustamente me impuseram hoje!
CREONTE - Seus condutores hão de arrepender-se, então, por demorarem a levá-la!
ANTÍGONA - Ai! Ai de mim! Depois destas palavras sinto-me ainda mais perto da morte!
CREONTE - Não posso acalentar-te com a ilusão de que não será esse o desenlace.
ANTÍGONA - Cidade de meus pais, solo de Tebas e deuses ancestrais de nossa raça!
Levam-me agora, não hesitam mais!
Vede-me, ilustres próceres de Tebas ? a última princesa que restava ?, as minhas penas e quem as impõe apenas por meu culto à piedade!

Sai ANTÍGONA, levada pelos guardas.

(....)

Entra TIRÉSIAS, guiado por um menino.

TIRÉSIAS Agitado.

Nosso caminho foi um só, chefes de Tebas, dois vendo pelos olhos de um, pois quem é cego precisa, para caminhar, de alguém que o guie.
CREONTE - Então, velho Tirésias, quais as novidades?
TIRÉSIAS - Já vou dizê-las; quanto a ti, crê no profeta.
CREONTE - Nunca fui desatento às tuas advertências.
TIRÉSIAS - Por isso tens guiado bem esta cidade.
CREONTE - A minha experiência atesta esse proveito.
TIRÉSIAS - Ouve: de novo está pendente a tua sorte.
CREONTE - Que há? Tuas palavras fazem-me tremer.
TIRÉSIAS - Pelos indícios, que ouvirás, de minha arte, já saberás. Estava eu no antigo assento profético onde as aves todas se reúnem dentro do alcance dos sentidos que me restam, quando um clamor confuso ouvi de aves estrídulas gritando maus presságios ininteligíveis.
E deduzi que umas às outras se feriam com as garras, mortalmente (o estrépito das asas não me deixava dúvidas). De imediato tentei, amedrontado, recorrer ao fogo em flamejante altar, ansioso por augúrios; das vítimas, porém, não se elevavam chamas: liquefazia-se a gordura sobreposta às coxas e molhava as brasas crepitantes, de onde saía só desagradável fumo; o fel se evaporava, os ossos descobriam-se nas coxas, encharcadas por muita gordura.
Assim fiquei sabendo por este menino, que nos rituais divinatórios os presságios não se manifestavam, pois ele é meu guia como eu sou guia de outros. E é por tua causa, por tuas decisões, que está enferma Tebas.
Nossos altares todos e o fogo sagrado estão poluídos por carniça do cadáver do desditoso filho de Édipo, espalhada pelas aves e pelos cães; por isso os deuses já não escutam nossas preces nem aceitam os nossos sacrifícios, nem sequer as chamas das coxas; nem os pássaros dão sinais claros com seus gritos estrídulos, pois já provaram gordura e sangue de homem podre. Pensa, então, em tudo isso, filho.

Os homens todos erram mas quem comete um erro não é insensato, nem sofre pelo mal que fez, se o remedia em vez de preferir mostrar-se inabalável; de fato, a intransigência leva à estupidez.

Cede ao defunto, então! Não firas um cadáver!
Matar de novo um morto é prova de coragem?
Pensei só no teu bem e é por teu bem que falo.
Convém ouvir a fala do bom conselheiro se seus conselhos são para nosso proveito.

CREONTE - Tu, ancião, e todos vós, fazeis-me o alvo de vossas flechas, como arqueiros; não me poupa também, agora, o teu poder divinatório.
Há muito tempo a tua confraria explora-me e faz de mim o seu negócio; prossegui, lucrai; negociai, se for vossa vontade, o electro lá de Sardes ou da Índia o ouro, mas aquele cadáver não enterrareis; nem se quiserem as próprias águias de Zeus levar pedaços de carniça até seu trono, nem mesmo por temor de tal profanação concordaria eu com o funeral, pois sei que homem nenhum consegue profanar os deuses.
Mostram sua vileza os homens mais astutos, velho Tirésias, ao tentar dissimular pensamentos indignos com belas palavras, preocupados tão somente com mais lucros.

TIRÉSIAS - Ah! Saberá alguém, ou imaginará?que o bom conselho é a riqueza mais preciosa?

CREONTE - Tal como, penso eu, a insânia é o mal pior.
TIRÉSIAS - Estás enfermo, e gravemente, desse mal.

TIRÉSIAS - Então fica sabendo, e bem, que não verás o rápido carro do sol dar muitas voltas antes de ofereceres um parente morto como resgate certo de mais gente morta, pois tu lançaste às profundezas um ser vivo e ignobilmente o sepultaste, enquanto aqui reténs um morto sem exéquias, insepulto, negado aos deuses ínferos. Não tens, nem tu, nem mesmo os deuses das alturas, tal direito;
isso é violência tua ousada contra os céus!
Estão por isso à tua espreita as vingativas, terríveis Fúrias dos infernos e dos deuses, para que sejas vítima dos mesmos males.
Vê bem se é por ganância que digo estas coisas!
Num tempo não muito distante se ouvirão gemidos de homens e mulheres de teu lar.
Levantam-se como inimigas contra ti as terras todas cujos numerosos filhos dilacerados só tiveram funerais feitos por cães, por feras ou por aves lépidas que a cada uma das cidades onde tinham seus lares levaram sacrílegos miasmas.
Já que me provocaste, vou dizer agora: as flechas dirigidas ao teu coração fui eu que as disparei em minha indignação, certeiras como as de um arqueiro experiente; e da pungência delas não escaparás.

Dirigindo-se ao menino que o trouxera.

Menino, leva-me de volta à nossa casa; lance ele a sua cólera contra os mais moços, e aprenda a usar a língua com moderação, e traga dentro de seu peito sentimentos melhores que os alardeados neste instante!

Sai TIRÉSIAS, guiado pelo menino.

CORIFEU - Senhor, esse homem retirou-se após dizer terríveis profecias e desde que vi os meus cabelos, antes negros, alvejarem, ele jamais previu mentiras à cidade.
CREONTE - Sei disso, eu mesmo, e tenho o coração perplexo.
Ceder é duro, mas só por intransigência deixar que a cólera me arruine, é também duro.
CORIFEU - Cuidado, Creonte, filho de Meneceu!
CREONTE - Que devo então fazer? Dize e obedecerei.
CORIFEU - Vai à caverna subterrânea e solta a moça.
Para o cadáver insepulto, faze um túmulo.
CREONTE - É o teu conselho? Achas melhor que eu ceda agora?
CORIFEU - E sem demora, rei; a punição divina caminha por atalhos e com pés velozes e logo alcança os que praticam más ações.
CREONTE - Pobre de mim! Penosamente renuncio à minha decisão e passo a proceder segundo o teu conselho; não insistirei neste combate vão contra o inevitável.
Irei imediatamente. E vós, criados, marchai. Marchai, presentes e também ausentes, depressa, até o lugar por todos conhecido, portando em vossas mãos a ferramenta própria!
Já que mudou de rumo a minha opinião, irei soltar Antígona, eu que a prendi.
Agora penso que é melhor chegar ao fim da vida obedecendo às leis inabaláveis.

Entra o primeiro MENSAGEIRO.

1º MENSAGEIRO

(...) nenhum sucesso nesta vida pode ser por muito tempo elogiado ou censurado.
A boa sorte põe de pé, o azar derriba felizes e infelizes incessantemente e nem os adivinhos podem confirmar o que o destino prefixou para os mortais.

Creonte ainda há pouco tempo parecia digno de inveja em minha própria opinião; ele salvara um dia de seus inimigos este solo cadmeu e nele era monarca incontestado e glorioso pai, também, de nobres filhos; hoje tudo está perdido.

Quando os mortais não podem mais sentir prazeres já não os considero criaturas vivas, mas míseros cadáveres que ainda respiram.

CORIFEU - Que novos males para nosso rei revelas?
1º MENSAGEIRO - Morreram? E a causa da morte são os vivos.
CORIFEU - Mas quem matou? E quem foi morto? Dize logo!
1º MENSAGEIRO - Hêmon morreu; matou-o mão ligada a ele.
CORIFEU - A mão paterna? Ou terá sido a dele mesmo?
1º MENSAGEIRO - Foi ele, em fúria contra o crime de seu pai.
CORIFEU - Ah! Adivinho! Era verdade o que dizias!
1º MENSAGEIRO - Isso é passado. Cumpre-nos pensar no resto.
CORIFEU - Mas, vejo aproximar-se a infeliz Eurídice, esposa de Creonte; ela vem do palácio para saber do filho, ou, talvez, por acaso.

Entra EURÍDICE.

EURÍDICE - Ouvi vossas palavras, cidadãos presentes, quando saía para reverenciar com orações a deusa Palas. No momento em que os ferrolhos do portão eu recolhia para poder passar, feriram-me os ouvidos notícias tristes de tragédia na família; o susto fez-me recuar, cheia de medo, e desmaiei nos braços de minhas criadas Dizei-me novamente qual foi a mensagem; eu não a ouço como estranha a tais desgraças.
1º MENSAGEIRO - Falar-te-ei na condição de testemunha, minha cara senhora, e não omitirei sequer uma palavra da verdade toda.
Por que haveria eu de te agradar agora se logo os fatos poderiam revelar minha mentira? É reta a via da verdade.

Segui com teu esposo, como guia, até a desolada elevação onde jazia inda por sepultar, impiamente, o corpo de Polinices, pasto de saciados cães.
À deusa das encruzilhadas e a Plutão oramos, para suavizar a sua cólera; lavamos o cadáver com água lustral e com recém-colhidos galhos em seguida incineramos aqueles restos mortais; com a terra onde ele veio ao mundo preparamos um sepulcro saliente para as suas cinzas.
Encaminhamo-nos depois na direção do leito nupcial de pedra onde estaria a noiva prometida à Morte. Inda de longe ouviu algum dos nossos o som de gemidos pungentes, vindos daquela estranha alcova onde não eram celebrados ritos fúnebres; e quem ouviu veio contar ao rei Creonte.
Quanto mais perto ele chegava do lugar, mais o envolviam os confusos sons de gritos doridos, e ele disse entre soluços lúgubres:
?Como sou infeliz! Será que eu adivinho?
Estarei indo agora pelo mais funesto de todos os caminhos jamais percorridos?
Recebe-me a voz de meu filho? Ide depressa, aproximai-vos, servos, e quando chegardes à tumba removei a lápide que a fecha, passai pela abertura e ide até a entrada para verificar se é mesmo a voz de Hêmon que escuto, ou se sou enganado pelos deuses!?
Foram cumpridas logo as ordens de nosso senhor desalentado; no interior do calabouço vimos pendente a moça, estrangulada em laço improvisado com seu próprio véu de linho;
Hêmon, cingindo-a num desesperado abraço estreitamente, lamentava a prometida que vinha de perder, levada pela morte, e os atos de seu pai, e as malsinadas núpcias.
Quando este o viu, entre gemidos horrorosos aproximou-se dele e com a voz compungida chamou-o: ?Ah! Infeliz! Que estás fazendo aí?
Que ideia te ocorreu? Qual a calamidade que assim te faz perder o senso? Sai, meu filho!
Eu te suplico! Imploro!? O moço, todavia, olhando-o com expressão feroz, sem responder cuspiu-lhe em pleno rosto e o atacou sacando a espada de dois gumes; mas o pai desviou-se e recuou, fazendo-o errar o golpe; então, com raiva de si mesmo, o desditoso filho com todo o peso de seu corpo se deitou sobre a aguçada espada que lhe traspassou o próprio flanco; no momento derradeiro de lucidez, inda enlaçou a virgem morta num languescente abraço, e em golfadas súbitas lançou em suas faces lívidas um jato impetuoso e rubro de abundante sangue.
E jazem lado a lado agora morto e morta, cumprindo os ritos nupciais ? ah! infelizes! ? não nesta vida, mas lá na mansão da Morte, mostrando aos homens que, dos defeitos humanos, a irreflexão é incontestavelmente o máximo.

EURÍDICE volta silenciosamente ao palácio.

CORIFEU - Após alguns momentos de silêncio geral.
Que se há de pensar disso? Ela se retirou sem proferir uma palavra, boa ou má.
1º MENSAGEIRO - Também estou atônito, porém espero que, diante da notícia acerca de seu filho, não lhe pareça decoroso lamentar-se em público e prefira prantear lá dentro, em seu palácio, o luto familiar com as servas.
Ela não há de ter ficado transtornada a ponto de cometer algum desatino.

CORIFEU - Não sei? Silêncios excessivos me parecem tão graves quanto o exagerado, inútil pranto.

1º MENSAGEIRO - É, mas entrando no palácio saberemos se ela não dissimula algum plano secreto em seu magoado coração. Disseste bem; pode haver ameaças nos grandes silêncios.

Sai o primeiro MENSAGEIRO. Entra CREONTE, trazendo o corpo coberto de HÊMON.

CORIFEU - Mas, eis ali o próprio rei que chega trazendo em suas mãos, revelador, o testemunho não de alheia insânia, mas de erros que ele mesmo cometeu.
CREONTE - Erros cruéis de uma alma desalmada! Vede, mortais, o matador e o morto, do mesmo sangue! Ai! Infeliz de mim por minhas decisões irrefletidas!
Ah! Filho meu! Levou-te, inda imaturo, tão prematura morte ? ai! ai de mim! ? por minha irreflexão, não pela tua!
CORIFEU - Como tardaste a distinguir o que era justo!
CREONTE - Ah! Hoje sei quão infeliz eu sou, mas penso que algum deus, com muita força, golpeou-me na cabeça e me impeliu para os caminhos da ferocidade ? pobre de mim! ? calcando sob os pés e destruindo todo o meu prazer!
Ah! Sofrimento dos sofridos homens!

Sai do palácio o segundo MENSAGEIRO, correndo.

2º MENSAGEIRO - Quantas desgraças tens de suportar, senhor!
Uma trazes contigo, nos teus próprios braços, e em tua casa há outra, que logo verás!
CREONTE - Ainda pode haver males piores que este?
2º MENSAGEIRO - Morreu tua mulher, mãe infeliz do morto, há pouco, vítima de golpe bem recente.
CREONTE - Ah! Boca inexorável dos infernos!
Por que me estás matando? Sim! Por quê?
Tu, mensageiro da calamidade triste até de narrar, que vais contar-me?
Ai! Ai de mim! Matas um homem morto!
Que dizes, meu rapaz? Que tens ainda a me falar? Ai! Infeliz de mim!
É o fim sangrento de minha mulher, caída nesta sucessão de mortes?

Abre-se a porta do palácio e aparece o cadáver de EURÍDICE, coberto, trazido por criados.

2º MENSAGEIRO - Ei-la presente; já deixou sua morada.
CREONTE - Ai! Ai de mim! Contemplo neste instante outra calamidade ? é a segunda, pobre de mim! Qual o destino ? qual! ? que inda me espera? Trouxe há pouco tempo meu filho nos meus braços ? ai de mim! ? e vejo aqui em frente outro cadáver!
Ah! Mãe desventurada! Ah! Filho meu!
2º MENSAGEIRO - Ela cerrou as pálpebras, envolta em trevas ferindo-se com fina faca ao pé do altar, depois de lamentar a morte gloriosa de Megareu, primeiro morto, e logo a deste, amaldiçoando-te nos últimos momentos, a ti, ao assassino de seus próprios filhos.
CREONTE - Ai! Infeliz de mim! Tremo de medo!
Por que alguém não me golpeia no peito com uma espada de dois gumes?
Sou um miserável ? coitado de mim! ? abismado em misérias horrorosas!
2º MENSAGEIRO - A morta que aqui vês te atribuiu a culpa desta calamidade e até da anterior.
CREONTE - Como lhe veio a morte violenta?
2º MENSAGEIRO - Com as próprias mãos ela se apunhalou no fígado logo que soube da desgraça atroz do filho.
CREONTE - Ai! Ai de mim! O autor destas desgraças sou eu e nunca as atribuirão a qualquer outro entre os mortais, pois eu, só eu as cometi, pobre de mim!
Fui eu, e falo apenas a verdade!
Levai-me imediatamente, escravos, para bem longe, pois não sou mais nada!
CORIFEU - É boa a tua sugestão, se pode haver algo de bom entre tão numerosos males.
Quanto mais breve for o mal, tanto melhor.
CREONTE - Venha! Aconteça a última das mortes ? a minha! ? e traga o meu dia final, o mais feliz de todos! Venha! Venha, pois não quero viver nem mais um dia!

CORIFEU - Isto é futuro; antes, cuidemos do presente; trate do resto quem tiver essa incumbência.

CREONTE - Já disse o meu desejo numa súplica.
CORIFEU - Nada mais peças, pois não podem os mortais livrar-se do destino a eles prefixado.
CREONTE - Levem para bem longe este demente que sem querer te assassinou, meu filho, e a ti também, mulher! Ai! Ai de mim!
Não sei qual dos dois mortos devo olhar nem para onde devo encaminhar-me!
Pondo as mãos sobre o cadáver de HÊMON.
Tudo perdi contigo, que ora sinto em minhas mãos, e com nova desgraça inda mais dura esmaga-me o destino!

CREONTE é levado lentamente para o palácio.

CORO Acompanhando a lenta retirada de CREONTE.

Destaca-se a prudência sobremodo como a primeira condição para a felicidade. Não se deve ofender os deuses em nada. A desmedida empáfia nas palavras reverte em desmedidos golpes contra os soberbos que, já na velhice, aprendem afinal prudência.

FIM
13marcioricardo 23/04/2022minha estante
Obrigado por sua tão boa resenha ??


Alane.Sthefany 23/04/2022minha estante
Ahh, muito obrigada!!! ???


Uedison Pereira 31/08/2023minha estante
Excelente trabalho! Seu comentário é justamente o que senti lendo essa trilogia do teatro grego. E por favor não leia as três peças separadas. Leiam-nas como um trabalho único, ainda que o contexto espaço-tempo faça referênçia à datas distintas para Édipo Rei, Antígona e Édipo em Colono.

Agora sobre a questão do mito grego há muitos pesquisadores europeus que remetem as narrativas desse mitos à fatos ou histórias que ocorreram e que ao serem passadas oralmente de geração à geração acabaram por ganhar o sentido de lenda. E o teatro grego usava essas lendas orais para ensinamentos de moral, ética, disciplina, o de ser grego e não agir como (ou ser) um bárbaro, o amor às artes e à sofia,...

Leiam!!! E se surpreenderão ao descobrirem como um texto escrito no séc. V a.C. seja tão rico e tão forte em sua narrativa.

Uedison Pereira
Sou o autor do livro O Leão e as Hienas - e outras estórias (ed. Primeiro Capítulo).
@uedison_pereira (instagram)

Um abraço a todos e boas leituras.




Andailson Lima 04/04/2024

A Trilogia Tebana
Esse livro foi uma recomendação. Ele é a coletânea de textos muito antigos. A escrita dele é em versos, foi o primeiro livro que li assim. Todos os outros livros que li, foram em prosa. E a narração dele também é diferente do que costumo ler, ela é bem teatral.

De início, há uma parte introdutória no livro, ela dá explicações bem gerais sobre ele. Mas, eu acho que eu não a deveria ter lido. Pois ela entregou alguns spoilers antes de eu chegar a ler realmente as partes importantes, os textos da trilogia.

Os textos da Trilogia Tebana são: Édipo Rei, Édipo em Colono e Antígona. Dos três, prefiro Édipo Rei. Eu achei que ele foi o mais interessante, e me diverti ao ver o rei Édipo a descobrir sobre a identidade de quem ele matou e a identidade de com quem ele se casou.

Já Édipo em Colono, eu achei muito massante. Tanto pelo fato de ser o maior dos três, quanto pelo fato de eu ter ficado confuso na leitura. Não sei se foi algum erro de interpretação de minha parte, mas ele culpava os filhos por ter sido exilado de Tebas, sendo que, pelo que eu me lembro de Édipo Rei, ele mesmo se exilou pelas palavras que ele disse antes de saber toda a verdade sobre o assassinato.

Já Antígona, eu achei o mais exagerado da trilogia. Nos outros, também há mortes e tals. Mas nesse, elas foram mais dramáticas. Mas a estória em si é interessante. E foi bom haver a mudança de protagonista nesse.

Por fim, teve uns momentos em que achei a escrita bonita. Em especial, em alguns caso em que houver perífrases verbais com o verbo haver e no uso da mesóclise. Isso é umas das coisas interessantes de ler obras mais antigas. O livro foi uma leitura interessante, mesmo para um livro diferente do que estou habituado a ler.
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Cinara... 30/07/2020

"...não devemos dizer que um mortal foi feliz de verdade antes de cruzar as fronteiras da vida inconstante sem jamais ter provado o sabor de qualquer sofrimento!" - Édipo Rei


"... Vai-te embora aqui, coberto de vergonha, filho sem pai, o mais perverso dos perversos, levando as maldições que chamo contra ti.
Queiram os deuses que jamais a tua lança possa vencer a terra que te viu nascer!..." - Édipo em Colono

"Destaca-se a prudência sobremodo como a primeira condição para a felicidade. Não se deve ofender os deuses em nada.
A desmedida empáfia nas palavras reverte em desmedidos golpes contra os soberbos que, já na velhice, aprendem afinal a prudência. " - Antígona
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Lucy 18/06/2023

Li esse livro instigada pelo Lar em Chamas. Gostei bastante de Edipo Rei e Antígona, mas Edipo em Colono é realmente muito chato.
Esta edição já vale pelas explicações dadas na introdução.
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andyelivros 01/05/2022

Trilogia Tebana
A trilogia tebana, considerada há quase dois milênios e meio uma das mais belas e importantes obras da cultura universal. Todo o teatro que se fez até hoje no Ocidente tem suas raízes mais profundas na obra de Sófocles, que inovou a tragédia grega ao deslocar o motivo das ações para a vontade humana e não mais para as maquinações divinas. Esse livro reúne três peças do autor grego que compôs mais de 100 dramas, dos quais apenas sete tragédias completas chegaram até nosso tempo. 
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Hiago.Alquimim 03/04/2021

A Grécia antiga, considerada o berço da democracia traz uma diversidade de obras
literárias, e uma delas é a trilogia tebana abordada por Sófocles.
*******************
Faça vista, foi um dos poetas mais ressaltados da antiguidade por apresentar Édipo Rei, Édipo Colono e Antígona.
********************
Precipuamente, dita por Aristóteles, se situa como um dos maiores exemplos de tragédia grega que ocorreram naquela polis...
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Vittor Az 18/04/2022

Trechos milenares
A caminhada é longa, mas as novidades
dos viajantes vencem todas as distâncias.

Sei muito bem, ancião, que sou apenas homem
e que não me pertence o dia de amanhã,
da mesma forma que não és senhor do teu.

somente contra a morte clamará
em vão por um socorro, embora saiba
fugir até de males intratáveis.

E no porvir, tal como no passado
a lei para os mortais será mantida:
nada haverá de realmente grande
em suas vidas sem desgraças juntas.

Pois com sabedoria alguém falou
as célebres palavras: “cedo ou tarde,
o mal parecerá um bem àquele
que os deuses resolveram desgraçar”.
E são momentos poucos e fugazes
os que ele vive livre da desdita.

Se fosse inevitável, mal menor seria
cair vencido por um homem, escapando
à triste fama de mais fraco que as mulheres!

Não tenhas, pois, um sentimento só, nem penses
que só tua palavra e mais nenhuma outra
é certa, pois se um homem julga que só ele
é ponderado e sem rival no pensamento
e nas palavras, em seu íntimo é um fútil.
Não há vergonha alguma, mesmo sendo sábio,
em aprender cada vez mais, sem presunções.
Não vês, ao lado das torrentes engrossadas
pelas tormentas, como as árvores flexíveis
salvam-se inteiras, e as que não podem dobrar-se
são arrancadas com a raiz? Da mesma forma,
aquele que mantém as cordas do velame
sempre esticadas, sem às vezes afrouxá-las,
faz emborcar a nau e finaliza a viagem
com a quilha para cima. Exorto-te: recua
em tua ira e deixa-te mudar! E se eu,
embora jovem, posso dar-te opiniões,
afirmo que nos homens o ideal seria
nascer já saturados de toda a ciência,
mas, se não é assim, devemos aprender
com qualquer um que fale para nosso bem.

Amor, invicto no combate, Amor
dissipador de todas as riquezas,
que após vaguear nos mares e em recônditos
esconderijos afinal repousas
no doce rosto das moças em flor!
Nenhum dos imortais pode evitar-te
nenhum dos homens de existência efêmera;
e perde logo o senso quem te encontra.
Até os justos forças à injustiça,
desnorteando-lhe o pensamento,
e levas a essas lutas pais e filhos.
Venceu o claro olhar da noiva bela,
inspirador desse desejo igual
às majestosas leis da natureza,
joguete de Afrodite irresistível.

A força do destino, todavia,
é formidável; as riquezas, guerras,
muralhas, negras naus, não lhe resistem.

de fato, a intransigência leva à estupidez.

Quando os mortais não podem mais sentir prazeres
já não os considero criaturas vivas,
mas míseros cadáveres que ainda respiram.
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Rony 23/05/2021

Tragédias gregas
Comecei a ler mais por conta da disciplina da universidade, mas gostei de prosseguir a leitura. Especialmente por mostrar elementos da mitologia grega. Pretendo ler alguma obra mais geral sobre o assunto.
Quanto as peças, recomendo a leitura. Cada uma delas pode ser lida em uma ocasião. Das três, a mais emocionante para mim foi Édipo Rei. Gostei muito de Antígona também, especialmente pela atitude dela. Já Édipo em Colono foi interessante por mostrar mais as atitudes das divindades gregas.
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willian.coelho. 08/04/2021

Muito antes de Shakespeare
Sófocles foi um dos três grandes tragediógrafos da Grécia clássica (510 a.C - 323 a.C.) cujas obras chegaram à contemporaneidade. Cronologicamente, o primeiro foi Ésquilo, o segundo Sófocles e o terceiro Eurípides, todos nascidos em localidades dentro do domínio de Atenas - que foi o berço da democracia e filosofia. Elementos marcantes das peças deste período estão presentes, tal e qual o uso de máscaras, indivíduos masculinos interpretando personagens femininas, coro e corifeu. As temáticas também são distintas: heróis e deuses da religião greco-romana clássica, profecias e oráculos, enaltecimento do regime democrático (já que o fim do governo do último tirano de Atenas inaugura o período), embates políticos. Trilogia tebana compila três textos de Sófocles em ordem temporal de acontecimentos: Édipo Rei (tido por Aristóteles, na sua obra “Poética”, como a tragédia exemplar), Édipo em Colono (menos conhecida) e Antígona (bastante apreciada pelos professores das disciplinas iniciais do curso de direito).
Édipo rei conta a história da maldição do rei Laio de Tebas, da dinastia dos Labdácidas, que deveria ser morto por seu filho. Centrada na figura de Édipo, rei justo e homem virtuoso, a peça narra sua decadência enquanto busca saber, incessantemente, a autoria de um assassinato. Termina amaldiçoando a si mesmo e, ao descobrir que matou seu pai, casou e teve filhos (Antígona, Ismene, Polinices e Etéocles) com sua mãe (Jocasta), perfura seus próprios olhos para não ver ter de encarar os seus pais no hades. Sófocles, com essa história absolutamente catártica, afirma que não há como fugir do destino, que os presságios da pitonisa são certeiros. “Não deve amedrontar-te, então, o pensamento dessa união com tua mãe; muitos mortais, em sonhos, já subiram ao leito materno. Vive melhor quem não se prende a tais receios”.
A continuação do enredo supracitado está em Édipo em Colono, que discorre sobre a tentativa do desvalido em encontrar um lugar para viver os seus últimos dias e, finalmente, sobre a sua morte. Essa peça - situada em Colono, onde Sófocles nasceu - demonstra a hospitalidade do povo ateniense (focalizada na personagem do rei Teseu, um herói equiparado a Hércules), a importância da caridade e a valorização da família unida (Antígona e Ismene ajudam o pai, enquanto que Polinices e Etéocles se degladiam pela coroa de Tebas, abandonando Édipo à própria sorte). O autor, por se tratar de sua cidade natal, não poupa a trama de elementos sinestésicos, paisagens, fauna e flora; não há, todavia, o impacto dramático existente nas duas outras obras desta trilogia. “Queiram os deuses que jamais a tua lança possa vencer a terra que te viu nascer! Queiram eles também que nunca mais regresses a Argos, rodeada de muitas colinas, e que, ferido pela mão de teu irmão usurpador, morras e, ao mesmo tempo, o mates”.
Antígona, por sua vez, se passa após o retorno das filhas de Édipo para Tebas na tentativa fracassada de impedir que seus irmãos se matem pela posse do trono da cidade (pode ser conferida na peça 7 Contra Tebas de Ésquilo). Creonte, rei interino da cidade, enterra Etéocles com honras fúnebres, mas proíbe, através de um decreto, que Polinices seja sepultado (ficando à disposição dos animais selvagens). Com isso, contrariando a lei imposta por seu tio, Antígona enterra seu irmão e é capturada. É travado um embate entre eles sobre a abrangência do direito do rei sobre as leis divinas que culmina com a sentença de morte de Antígona e, após esse evento, com a desventura de Creonte (ponto trágico). A peça reforça a supremacia dos deuses (aparentemente Sófocles foi muito religioso), o autoritarismo negativo existente fora de regimes democráticos e os limites que um homem (ou o Estado) pode legislar. “Não tenhas, portanto, um sentimento só, nem penses que só tua palavra e mais nenhuma outra é certa, pois, se um homem julga que só ele é ponderado e sem rival no pensamento e nas palavras, em seu íntimo, é um fútil”.
A coletânea trata-se de uma tríade de clássicos bastante antigos; é, por conseguinte, de se esperar um texto pouco convencional. Alguns vocábulos escolhidos pelo tradutor são um tanto raros de serem empregados atualmente, contudo o que pode gerar certa confusão são os termos específicos da cultura grega, como nomes de entidades, por exemplo. Há, também, alguns momentos nos quais o coro entra com um caráter demasiadamente lírico, tornando a experiência mais complexa. Não se pode esquecer que o texto é trabalhado para o teatro, pois, em diversos momentos, se percebe uma adaptação de tempo e espaço que, caso não seja vislumbrado com a ciência de ser pertencente a uma peça, pode causar desorientação. Para finalizar, é válido salientar que constantemente essas obras são revisitadas e dão origem a releituras deveras ricas, tal como o complexo de Édipo de Freud ou o debate sobre direito natural versus positivo.
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Tiago 30/01/2023

São tragédias mesmo...
Primeira vez que leio sobre as tragédias gregas e já conhecia um pouco sobre o Édipo Rei, nome inspirativo utilizado por exemplo por Freud em suas obras de psicologias. Quando terminei o Édipo, descobri que na verdade era uma triologia chamada de Tebana, composta por mais duas peças, Édipo de Colono e Antígona. O fim trágico de Édipo Rei já o guia para a segunda peça, em Édipo de Colono não vemos tanta maestria quanto o seu anterior, mas esse também possui sua importância. Édipo aqui conhece a insensibilidade de seus filhos homens com sua desgraça, é expulso de sua terra e é guiado pelas mãos de sua filha. Ao chegar em seu local predito pelos oráculos, Édipo encontra sua redenção e some misteriosamente e sua filha segue em uma missão. Em Antígona, ela retorna ao seu país junto com sua irmã, e lá encotra alguns cenários desoladores, onde ela começa a desafiar as ordens de seu soberano, quando o coração e o sangue estão falando mais alto. Como sempre, a tragédia vai vir, e todos vão pagar e encontrar seu destino, de uma maneira ou de outra...
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Maitê 10/07/2017

gregos
A primeira tragédia grega ninguém esquece. Édipo é tão interligado com a minha vida psicanalítica que tenho até um pouco de vergonha de não ter lido até hoje. Ele foi até bastante familiar para mim mas com elementos desconhecidos que me deixaram com vários questionamentos. Do mais é uma leitura até simples e fluida. Uma tragédia que literalmente ultrapassa gerações.
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Janssen 15/12/2020

Clássico, mas melhor para a compreensão do que por lazer da leitura, realmente
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poly 09/02/2021

Eu só sei rir dos dramas
Li esse livro por causa da faculdade e não esperava gostar tanto.
É uma tragédia cheia de dor e sofrimento mas eu só conseguia rir.
Édipo é uma dramaqueen e eu amei isso.
Édipo Rei foi maravilhoso, em termos de enredo foi meu preferido. Édipo em Colono eu achei um porre e quase não terminei, vários nadas acontecem. Mas Antígona ganhou meu coração e por isso foi meu preferido no geral. Antígona é uma personagem incrível e os diálogos estão quase todos marcados.
Eu esperava mais do final, mas mesmo assim achei incrível.
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dia 18/07/2021

A trilogia tebana
Li este livro para a disciplina de ?Teoria da Literatura?, na faculdade. Confesso que nem estava tão empolgada para lê-lo, de início, mas gostei bastante.
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