Bells 22/02/2021Gael é abandonado no altar e depois disse se isola do mundo, e se mantem afastado de qualquer relação com mulheres, na verdade, aparentemente ele desenvolveu uma certa aversão em relação as mulheres, não querendo nenhum tipo de aproximação, a não ser que seja totalmente necessário. Ele se tornou uma pessoa ranzinza, mal humorada, mal educada e por ai vai. Por possuir dinheiro, ele compra o apartamento na frente do seu para não correr o risco de ter vizinhos, porém, nesse período de isolamento, todas as suas coisas ficam para um amigo, Rafael, cuidar, e ele decide alugar o apartamento da frente para uma mulher, Maria.
Nem preciso dizer que Gael foi foi totalmente toxico e mal educado com Maria, né? Mas, o problema é que ele era o bonitão do prédio e logo Maria se viu interessada no, como ela mesma se referia a ele, ogro. Porém, Gael também se vê interessado nela. E assim, entre brigas e posteriormente, beijos, os dois começam a se envolver.
Esse era um tipo de leitura que precisava no momento. Eu estava me sentindo saturada de ler tantos livros com uma pegada semelhante, e alguns não estavam me prendendo tanto, então estava precisando de algo mais leve, e esse livro, possuía essa leveza na escrita, ainda mais com as passagens engraçadas do livro.
Entretanto, algumas coisas me incomodaram um pouco na construção dos personagens. Gael ficou quase um ano sem se envolver com nenhuma mulher, pelo que foi descrito, e logo que se interessa por uma já se envolve seriamente, e isso, sem mencionar que o tempo para ele ter todo esse interesse pela vizinha foi extramente rápido, tipo, um mês e os dois já estavam morando junto. Sabe, eu esperava que em algum momento fosse dá alguma merda, ele decepcionar seriamente Maria, tipo traí-la, já que aparentemente o trauma dele era bem serio quanto a relacionamento, mas não houve isso. Houveram problemas, sim, mas nada tão grave, que uma conversa não resolveria.
Ele estava convicto do seu interesse por Maria, e apesar de alguns dramas direcionados a questão de um envolvimento serio, foi uma relação facilmente desenvolvida. Sabe, apesar de quase um ano em isolamento, ele não resolveu suas questões psicológicas, não procurou ajuda profissional, apenas se isolou. O tempo pode ter ajudado ele, porém, logo que ele entra em contato com Maria muito se remete a esse trauma e Maria acaba sendo a pessoa que ajuda ele. Porém, ele é extremamente inseguro por causa desse trauma, e mesmo não tendo nada com Maria já demonstra sérios sinais de ciumes, que na obra é romantizada. Mas, saindo um pouco daqui, é de se questionar se ele, sem ter trabalhado seus traumas, buscando um refugio em outra pessoa, não desenvolveria uma relação de dependência com Maria. É de se pensar, se a longo prazo, isso não poderia se tornar uma relação tóxica e abusiva. Claro, no livro não temos acesso a isso, e a leveza na escrita da autora tira o foco desses questionamentos, mas ainda assim, foram pontos que me fizeram refletir.
Apesar de Gael demonstrar ciumes em relação a Maria logo quando se conheceram, não sabemos se esse comportamento se prolonga, já que não temos acesso a muitas cenas direcionado a isso posteriormente, apesar dele não demonstrar muito ciumes em relação a Rafael, seu amigo. Ao passar da obra ele começa a superar isso, mas não acompanhamos de forma completa essas mudanças.
É um livro que reflete muito da nossa sociedade e cultura, e mesmo de forma mais disfarçada, percebemos o machismo ali. Como disse anteriormente, a leveza na escrita da autora pode distanciar nossos olhos disso. Mas, percebemos que Gael vê em Maria sua salvação, como ele mesmo se refere em determinado momento. E sabemos que culturalmente existe essa atribuição a mulher, de que ela deveria "concerta" homem, sendo que não somos baba.
Apesar das minhas reflexões em relação a obra, quero salientar que ela é bem leve, e se você não parar para refletir sobre ela, talvez nem problematize como eu fiz.
Enfim, é uma obra que reflete muito essa estrutura tradicional de família, de modo que, os pais de Maria se incomodam com ela está na casa dos 30 anos e não está namorando, e quando ela começa, todos esperam um casamento, e não só isso, esperam que ela tenha filhos, sem considerar a vontade dela. O seu irmão, demonstrar sinais de ciumes, como se Maria fosse um objeto para ele controlar, enquanto era uma mulher formada, com vontades e desejos. Gostei bastante disso, porque mostra muito da nossa sociedade de uma forma bem lúdica, e a autora tem uma escrita muito leve. Identifiquei traços da minha própria família na família de Maria.
Outra coisa que gostei na obra é que temos acesso tanto a percepção de Gael dos fatos, como de Maria, sendo os capítulos intercalados entre a visão de ambos.
Por fim, acho que as pessoas tinham que parar de achar que cuidar da saúde mental não é importante, é importante sim, e Gael precisava disso, mas não fez. Acho que isso retrata bem como a nossa sociedade espera que as mulheres sejam a solução dos problemas de macho, enquanto eles deveriam aprender a resolver suas próprias questões.