Lucas 19/09/2018
Vi a nota e desanimei um pouco (3,8), e pensei: "mais um autor de um livro só", porém para a minha felicidade eu estava enganado.
Depois de ler o Pequeno Príncipe e gostar muito (favoritei, até), não esperava ler outra obra de Saint-Exupery, até que na lista de "quero
ler" havia o Piloto de Guerra, que eu marquei sei lá por qual motivo a um bom tempo atrás. Vi a nota e desanimei um pouco (3,8), e pensei:
"mais um autor de um livro só", porém para a minha felicidade eu estava enganado.
O Piloto de Guerra foi escrito antes do O Pequeno Príncipe, e foi escrito com um intuito diferente, porém as bases de Saint-Exupery para
uma obra magistral já estavam no modo como ele escrevia. Piloto de Guerra é uma "poesia", com palavras narrando o real e dando uma significação apaixonada para aquilo que se vê e se vive. O nosso querido autor vai narrar suas desventuras como piloto no grupo 2/33 na França. Há muitos detalhes técnicos, mas o que é vislumbrante é a paixão que ele põe nas coisas que faz e a sinceridade com que fala das suas tristezas com a situação da França e do mundo à época.
Saint-Exupery é um subordinado, recebe ordens, cumpre-as com precisão e volta para receber mais, entretanto ele as questiona, ele as trucida em seus pensamentos, ele não as quer cumprir, mas é fiel à missão e cumpre. A lealdade para com o dever faz de Saint-Exupery um herói, mesmo em meio à missões "fúteis" como diz ele. Pra mim, ele foi um herói!
"Mas a derrota mergulha os homens numa atmosfera de incoerência, de tédio, e acima de tudo, de futilidade" - Saint Exupery (Piloto de Guerra)
Saint-Exupery é um herói confuso, está entre o seu dever e a coerência com a realidade. Cumprir ordens arriscando sua vida inutilmente ou
murmurar? Ambas as coisas. "Minha verdade está em pedaços e só posso considerá-los um após outro"
Poderia pegar várias frases e meditá-las nessa resenha pela qual me dispus à escrever, mas vou permitir ao leitor ansioso descobrir por si
mesmo.
É fácil ver a paixão de Exupery pelo que faz, ele e o avião se tornam um. Ele diz "Eu sou um organismo contíguo ao avião. "O avião fabrica
meu bem-estar, quando giro determinado botão que aquece, progressivamente, minhas roupas e meu oxigênio."
Aos entusiastas da guerra, ele avisa: "A guerra não é uma aventura. A guerra é uma doença. Como o tifo". O criador do inocente Príncipe
tinha que desviar das balas dos nazistas, mas sua criatividade estava a todo vapor nesse momento, seu coração de criança inocente estava
desperto.
É duro ler a tristeza ao narrar a perdição que havia sido vítima sua vila e seus concidadãos, é duro ver um homem assistir a destruição de seu país. No livro há duras críticas ao racionalismo, ao humanismo e a todas as ideologias que douravam a pílula na época. Saint-Exupery prefere exaltar a Cristo, que chama de o Homem.
"Mas quando se trata de falar sobre o Homem, a linguagem se torna incômoda. O Homem se
distingue dos homens. Nada se diz de essencial sobre a catedral, se não se falar das pedras. Não se
diz nada de essencial sobre o Homem, ao se tentar defini-lo por qualidades de homem. O Humanismo
trabalhou assim numa direção já obstruída. Tentou captar a noção de Homem por uma argumentação
lógica e moral, e a transportá-lo assim nas consciências.
Nenhuma explicação verbal jamais substitui a contemplação. A unidade do Ser não é transponível
em palavras. Se eu desejasse ensinar aos homens, cuja civilização ignorasse, o amor por uma pátria
ou por uma propriedade, não disporia de nenhum argumento para comovê-los. São os campos, os
pastos e o gado que compõem uma propriedade. Cada um e, todos juntos, têm por papel enriquecer.
Há, não obstante, na propriedade, alguma coisa que escapa à análise dos elementos, pois há
proprietários que, por amor ao que é seu, arruinar-se-iam para salvá-lo. É, bem ao contrário, essa
“alguma coisa” que enobrece os elementos com uma qualidade particular. Eles se tornam o gado de
uma propriedade, as pradarias de uma propriedade, os campos de uma propriedade…"