Filino 24/04/2023
Para conhecer (e apreciar), definitivamente, Epicuro
Diz-se que Epicuro foi um autor prolífico, mas pouquíssimo do que foi escrito sobreviveu até os nossos tempos. Essa obra reúne as três cartas, o conjunto de máximas e dois fragmentos de sua obra "Da natureza". Com exceção das sentenças vaticanas, o livro reúne o que escreveu o autor do epicurismo.
A primeira das cartas, endereçada a Meneceu, é a de maior interesse para quem quer se aproximar desse autor. Num estilo claro e agradável, aqui estão delineadas as linhas fundamentais do seu pensamento, que tem o prazer como meta mas é guiado pela prudência (algo que seus detratores insistem em "esquecer"). Para Epicuro, o conhecimento deve estar a serviço do prazer e isso implica, diretamente, numa rejeição de um hedonismo desenfreado, como muitos teima(va)m em rotular o epicurismo.
As outras cartas são mais densas e os assuntos ali tratados podem causar até um certo enfado a quem não é da filosofia e tampouco aprecia concepções mais antigas acerca do mundo e dos seus fenômenos. Nesse sentido, a segunda carta traz o atomismo de Epicuro (que postula a existência de átomos e do vazio, mas o faz de um modo diferente do de Demócrito), além do que hoje chamaríamos de sua teoria do conhecimento (os objetos chegam até nós por intermédio de emanações desse próprio objeto). A terceira carta discorre a respeito de fenômenos naturais, como terremotos, a formação do gelo, das nuvens etc. No entanto, cabe lembrar (e essas cartas não deixam de mencionar) que esses conhecimentos não devem ser valorizados em si, mas em última instância devem proporcionar tranquilidade à alma (ataraxia), que se verá liberta do temor de deuses e dos castigos divinos. Em seguida, as máximas condensam a sabedoria desse pensador; finalmente, os dois fragmentos de sua obra "Da natureza" tratam do agir do homem (compreendido aqui como um agente causador e não determinado por algo).
Dois textos que antecedem os de Epicuro são de grande valia ao expor o pensamento do autor e, também, o modo como ele se desenvolveu entre os epicuristas, notadamente Lucrécio e o seu "De rerum natura" - onde há menções a elementos da filosofia epicuristas que não foram tratados por Epicuro nos textos que chegaram a nós, a exemplo do "desvio" que há nos átomos. Também se chama a atenção para a valorização do agir do homem e aqui teríamos um ensaio do problema acerca do livre-arbítrio, tão tratado e debatido posteriormente na filosofia.
Todos os textos de Epicuro, ao final da obra, são comentados. E esses comentários esclarecem cada uma das cartas, bem como tratam das máximas e dos fragmentos - trata-se de um excelente complemento para estudos e aprofundamento nas ideias do autor e sua tradição. Uma edição que vale a pena.