pimet800 03/03/2021
"É um sentimento divino livrar-se das coisas"
Três senhoras e uma senhorita, que não se conheciam quando do início da história, resolveram, cada uma por motivações próprias, passar as quatro primeiras semanas de abril em um castelo medieval, situado na Itália, às margens do Mediterrâneo: San Salvatore.
San Salvatore é um importante personagem, um lugar repleto de flores e jardins, em que nele se podia encontrar pleno equilíbrio e que despertava mudanças dentro dos corações e dos espíritos até mesmo dos mais resistentes. O lugar é perfeitamente descrito pela Sra. Wilkins: "— Imagino que tenha notado, não é, que chegamos ao paraíso?".
A Sra. Wilkins era uma pessoa que passava despercebida nos eventos, alguém invisível, que conhecia suas limitações, submissa às vontades do marido, mas bastante entusiasmada e completamente aberta às surpresas que San Salvatore poderia lhe proporcionar. A primeira amizade que fez foi com a Sra. Arbuthnot. "— A primeira coisa a acontecer nesta casa — ela disse baixinho, solenemente — tinha que ser um beijo."
A Sra. Arbuthnot era casada com Sr. Frederick, um autor de romances controversos, que provocava nela profundos conflitos de relacionamento. A Sra. Arbuthnot então passou a fazer parte da igreja, como forma de expiar os pecados do marido, ajudando os pobres. Assim, aos poucos, foi se distanciando do próprio marido. "Durante anos, ela só conseguiria ser feliz esquecendo a felicidade."
A terceira senhora a aceitar a viagem reflexiva a San Salvatore foi a viúva Sra. Fisher, de Prince of Wales Terrace. "Quase nada valia a pena de verdade, refletiu a Sra. Fisher, exceto o passado". Com sua bengala que lhe auxiliava a andar e seu olhar desaprovador a tudo que fosse diferente do que ela julgava adequado, Sra. Fisher era avessa a afetos, reservada, sisuda, a mais velha inquilina do castelo. "A Sra. Fisher, é claro, era quem a Natureza escolheria para cuidar disso. Ela tinha o ar de uma governanta competente. Suas roupas eram as de uma governanta, assim como seu cabelo."
Finalmente, havia Lady Caroline Dester, uma senhorita que ainda não havia se casado. Dona de uma beleza inimaginável, divina, cativante, apaixonante. "Ela era extremamente linda. Tudo nela era muito. Seus cabelos louros eram muito louros, seus adoráveis olhos cinzentos eram muito adoráveis e cinzentos, seus cílios escuros eram muito escuros, sua pele branca era muito branca, sua boca vermelha era muito vermelha. Ela era extravagantemente esbelta."
Aos poucos, estas quatro mulheres vão desenvolvendo laços de amizade entre si, permeadas pela beleza da paisagem que as rodeiam. À medida que as semanas se passam, cada uma aprende um pouco mais sobre as virtudes e carências das outras mulheres e, principalmente, de si mesma. Uma jornada de autoconhecimento, de descobertas, de liberdade, de deixar ser e viver.
Este livro me surpreendeu positivamente e há tempos eu não dava cinco estrelas para uma leitura. Tudo nele me cativou. A construção de personagens é exemplar, pois o leitor sabe exatamente a diferença entre os perfis dos personagens, seus anseios e suas dúvidas. Conforme a relação entre as personagens se estreita, mais você descobre sobre elas. Embora a autora trate de temas complexos, principalmente relacionados a conflitos conjugais, a forma como eles ocorrem é suave e ficam localizados nas camadas mais profundas da interpretação. Um ótimo livro, que me despertou emoções e risos através dos capítulos. A única ressalva, que é compreensível dada a época em que foi escrito, é sobre o pensamento machista dos diversos personagens e, consequentemente, do comportamento submisso das mulheres. Recomendo a todos!