Márcia 20/05/2022
Comer, Rezar, Amar - Elizabeth Gilbert
Este livro de memórias foi escrito em 2006. Em 2010 o best-seller autobiográfico de Elizabeth Gilbert acabou rendendo um filme bem água-com-açúcar.
Encontramos, no inicio dessa jornada, uma Elizabeth perdida, atormentada, angustiada e enrolada até o pescoço em seus próprios problemas acumulados, afundada numa vida amarga e melancólica; presa em um casamento empurrado com a barriga por ela e seu marido... Marido esse que irá se tornar, depois de um longo, penoso, extenuante e tortuoso divorcio, seu ex-marido.
Elizabeth ainda se envolve com o jovem ator David, o que acaba por tornar um “provável futuro conto de fadas” em mais um inferno astral, emocional e psicológico.
Decidida a mudar de vida, ela decide passar um ano visitando três países, em busca de três desejos pessoais: Itália, pelo prazer; Índia, pela devoção; Indonésia, pelo equilíbrio. Entretanto, o que ela obtêm nessa jornada vai muito além do planejado.
Com uma escrita cativante, fluida e despretensiosa, a jornalista e protagonista de sua própria historia, Elizabeth Gilbert, discorre sobre sua vida de maneira desmedida, sem meias palavras, sem medos e sem pudor, expondo sua vulnerabilidade de forma franca e aberta, com pitadas de humor e sarcasmo.
Em COMER, a primeira parte do livro, temos a mulher atormentada por seus problemas, por seus fantasmas, que luta contra si mesma dia após dia enquanto vive em um dos lugares mais lindos, sensuais e glutões do planeta – Itália. A busca do prazer aqui está longe da parte carnal; o prazer é sensorial: visão e paladar. A regra é não ter regra. Aproveitar as belezas históricas, se deslumbrar com a cidade, e saborear (lê-se devorar) a culinária. E, acima de tudo, se envolver com a língua italiana que ela acha tão sexy, voluptuosa e envolvente.
Essa parte Elizabeth ainda esta muito atormentada pelo fracasso do casamento, mas eu achei a parte mais engraçada do livro. Talvez porque ela só quer saber de comer e não se importar com mais nada.
Já em REZAR, no retiro de sua Guru na Índia, ela busca a arte da devoção e da elevação espiritual. Talvez, uma das partes mais emocionais do livro, onde ela descobre que para aliviar o fardo de sua vida agora bagunçada, tudo o que ela precisa fazer é seguir com afinco sua jornada espiritual, visitando dentro de si mesma cada pedaço esqueci e deixado para trás, para perdoar e amar... O que lhe custa horas e mais horas de meditação e controle de seu corpo, mente e alma.
Os conceitos religiosos dessa parte transcendem o significado cristão comum de Deus e do divino tão distantes de nós, não apenas por ser uma experiencia real e pessoal da autora, mas por mostrar que Deus não está unicamente conosco, mas também está em nós, como nós. Essa parte eu achei a mais arrastada do livro. Acredito que pela necessidade dela de conseguir se conectar a Deus e ter muita dificuldade.
Em AMAR, a parte final, ela está na Indonésia, e volta a encontra o xamã que visitou em uma viagem a trabalho. Lá, já dona de si, ela busca o equilíbrio entre os prazeres da terra e o contato com o divino. Um lugar paradisíaco, repleto de pessoas simpáticas, e um amor a vista fazem dessa parte do livro o momento inesperado de sua vida, onde as coisas acontecem de surpresa; onde os espaços em branco são preenchidos com gratidão e sabedoria.
Ainda há muita religiosidade nessa parte do livro, principalmente no inicio, tendo ela se tornado discípula do xamã Ketut (e sua mais fiel amiga), que lhe ensinara outros tipo de meditações, que lhe ajudou a ter coragem e aceitar os problemas da vida de forma simples: se der pra corrigir, corrija; se não, sorria (até com o seu fígado) e faço o melhor que estiver ao seu alcance.
Elizabeth é uma nova mulher, liberta de todas as suas aflições, de todos os demônios e fantasmas que atormentavam sua vida. Está livre de sua antiga persona, que era por demais controladora, inquieta, intensa... a membrana permeável de todos os sentimentos dos outros. Agora ela era ela, e mais ninguém. Alguns quilos mais pesadas (depois de Ítalia), mas, ainda assim, mais leve do que nunca.
Essa parte do livro , Elizabeth se apaixona novamente e , ela percebe que esta confortável para se abrir para esse sentimento.
O livro é, de fato, um guia para aqueles que desejam mudar de vida (mas sem aquele tom de auto-ajuda). Os métodos são comuns a todo ser humano, mesmo no quesito religioso (se você que buscar Deus de forma sincera, honesta e com verdade, basta dedicar-se a Ele de coração), é são aplicáveis ao nosso dia-a-dia, se simplificados (Não é preciso necessariamente ir até a Itália para se comer bem nem até a Índia para encontrar Deus).