Rafael 16/07/2021
Um manifesto político vital!
Em uma sociedade estruturada pelo racismo, como ser ao mesmo tempo negro e norte-americano, sem ser insultado por seus compatriotas? Como lida o negro com esses pensamentos inconciliáveis sem que suas partes se deteriorem? Mostra-nos William Edward Burghardt "W. E. B." Du Bois, em "As Almas do Povo Negro" (1903), obra de caráter fundante da moderna militância e inteligência negra, que ?A história do negro norte-americano é a história desse conflito - desse desejo de tomar consciência de si mesmo como homem, de fundir esse duplo eu em um único indivíduo, melhor e mais verdadeiro".
O "véu" (dificuldade do negro em enxergar a si mesmo e de ver o mundo como ele realmente é) e a "dupla consciência", tratadas acima, são categorias centrais no trabalho de Du Bois e, para ele, refletem os processos de socialização que produzem a subjetividade do negro.
Quando dos estudos de Du Bois, a Guerra Civil Americana (1861-1865) havia acabado e a Reconstrução sido iniciada, com o implemento de políticas públicas para a população negra, mas também com promessas vazias. A liberdade do negro era ilusória! Nas zonas rurais sulistas, muitos trabalhadores negros estavam presos aos donos da terra pelo peso da dívida. Eram ?arrendatários? condenados pela lei e pelos costumes à escravidão econômica, e a única forma de fuga era a morte ou a penitenciária (importante é a contribuição de Du Bois para a Criminologia, aqui).
Nesse cenário, como caminhos para a "regeneração social do negro" e para a "solução dos problemas da convivência e cooperação entre as raças", viu Du Bois a necessidade de se garantir, ao negro, acesso ao ensino superior e exercício do direito ao voto, contrariando ideais subservientes à época, como os propagados pela liderança negra Booker Washington.
Por fim, reconhecia o autor que a condição do negro não era estudada de forma honesta e minuciosa. Quando muito, valiam-se de argumentos generalizantes, próprios de um "sociólogo de vagão de trem". Como forma de superar a barreira de cor existente, era preciso que brancos vissem "a América branca pelos olhos da América negra".