spoiler visualizarSchwarcz 19/09/2012
O nascimento da democracia
"Vá dizer a eles em Esparta/ Ó passante/ Que lá, em obediência às suas ordens, / Tombamos."
As palavras gravadas no memorial de pedra em Termópilas, mais do que homenagear os 300 guerreiros espartanos que lutaram até a morte contra um exército asiático de 300.000 homens para defender a Grécia da anexação ao Império Persa; representa o espírito de todos os gregos da época que poderia ser resumido à máxima "antes morrer livre do que viver como escravo".
Nas quase 400 páginas de "Fogo Persa", Tom Holland não só descreve as origens do Império e das cidades-estado de Esparta e Atenas, mas constrói uma narrativa surpreendentemente emocionante sobre a Gênesis da cisma entre oriente e ocidente. Especialmente tocante é a luta desesperada dos gregos, particularmente Espartanos e Atenienses, para manter suas sociedades, igualitária e democrática respectivamente, contra a ameaça de servidão eterna à um governo autocrático e tirânico.
Trata-se de um livro de divulgação científica sobre história antiga. Cada capítulo possui uma seção de notas que, junto à extensa bibliografia derivada tanto dos historiadores gregos quanto de trabalhos de arqueologia, corroboram os fatos apresentados. No entanto, assim como no excelente "Rubicão" (também de Holland), longe de se transformar numa listagem maçante de datas e nomes, o autor monta uma instigante saga sobre homens que, inspirando-se em heróis das lendas do passado, alçaram-se à estatura de gigantes e e receberam a imortalidade nas páginas (e monumentos) da história como os arquitetos da noção ocidental de liberdade.
Claro que para alcançar tal efeito, Holland usa o expediente de aproximar seu relato da ficção e se, no entanto, não inveta fatos, certamente infere e faz deduções quanto aos sentimentos e detalhes sórdidos de personagens históricos. Certamente é impossível saber que os hoplitas de Maratona "sujaram seus mantos de merda" ao avançar contra as tropas de Dátis. Mas isso não diminui de forma alguma a qualidade do trabalho; pelo contrário serve para criar uma atmosfera mais crua e realista do que obteria pelo uso exclusivo de provas históricas.
Como nada é perfeito, a deficiência do livro é toda nacional. A edição brasileira parece não ter sido bem revisada e vem recheada de erros ortográficos e de pontuação que chegam a aborrecer pelo esforço extra para decodificar o que de fato deveria estar escrito. Até mesmo o nome de alguns personagens é escrito errado e, horror dos horrores, um mesmo indivíduo tem seu nome escrito de diferentes formas ao longo do texto (ex: Gautama ou Gaumata), o que pode pôr a perder o divertimento de um leitor mais desatento. Mas podia ser pior. Os erros são mais concentrados nos primeiros capítulos, desaparecendo quase completamento quando iniciam-se as Guerras Médicas.
Ainda assim, e considerando que os defeitos são da edição brasileira, o livro merece cinco estrelas pela excelência em fazer o leitor se empolgar com o relato de disputas ocorridas há mais de 2.400 anos.