spoiler visualizarLara 07/01/2023
A romântica e trágica Intentona Comunista em Castro
?Dunas vermelhas: romance em tempos de rebelião?, de Nei Leandro de Castro, reeditado pelos Jovens Escribas em 2013, é um romance histórico dividido em duas partes: ?Dias de Novembro?, que narra a conspiração em prol da Intentona Comunista em Natal de 1935, e ?Dias de Rebelião?, que apresenta ao leitor o auge e a decadência da revolução.
Essas duas partes, então, se organizam em capítulos de páginas únicas, com focos narrativos em personagens, a princípio, desconexas, mas que, conforme o enredo se desenrola, se encontram e influenciam umas as outras. O interessante de tais focos narrativos está justamente na profundeza das personagens, uma vez que, devido ao esmagador uso de sumários ao invés de cenas, parecem ser planas e, ou comunistas, ou integralistas, somente.
No entanto, há figuras bem interessantes e com certa complexidade devido ao que representam: o sapateiro José Praxedes, o retrato do sonho do oprimido quando a educação não é libertadora; João Lopes, o Santa, a gravidade do racismo na luta brasileira de classes; o dr. João Medeiros, o nosso fútil e pedante metanarrador; e Aurélia, a mulher romântica.
Destaco, ainda, esta última como a grande inspiradora para o subtítulo. É justamente pelas suas atitudes que a rebelião se inicia: quando, um dia antes da data marcada, Aurélia se envolve na morte do capitão fascista Arnaldo (não pelo ?bom parto de Maria?, mas pelo seu individualismo). Assim, Aurélia, carrega os traços melancólicos, trágicos, fúnebres e contraditórios da erotização profana ultrarromântica, tão clássica na nossa literatura. Isto é, meio da mulher burguesa e angelical, o caos é instaurado na província e aproveitado para a fracassada revolução. Espelha-se, aqui, mais uma contradição dos rebeldes: como poderia ter êxito uma revolta comunista iniciada no individualismo? Em outras palavras, mesmo que nada os comunistas tivessem a ver com Aurélia, esse individualismo grita, primeiro, nas ações e nos pensamentos das personagens, e, segundo, na organização perspicaz dos capítulos curtíssimos e descontinuados pelo tempo da narrativa.
Dessa forma, ?Dunas vermelhas? explora e resgata o Romantismo brasileiro, no jeito tipicamente potiguar de não atender a escolas e tendências literárias, mas de reinventá-las em favor da nossa originalidade (Auta de Souza nos mostrou isso 100 anos antes), narrando, no século XXI, a histórica Intentona sob a visão poética, deliciosamente, como quem saboreia cachaça com caju à frente das águas bronzeadas pelo sol de Natal.