Rondó

Rondó Sonia Sant’Anna




Resenhas - Rondó


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Elaine | @naneverso 21/07/2021

Uma boa coletânea.
Os contos, para mim, foram 8 ou 80: alguns eu amei MUITO e outros me foram indiferentes. Porém, o destaque mesmo é a novela autobiográfica/memórias que finaliza(m) o livro. Comecei a ler e não consegui parar até terminar. Por isso, recomendo!
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Alexandre Kovacs / Mundo de K 12/05/2021

Sonia Sant'Anna - Rondó
Editora Penalux - 138 Páginas - Capa: Guilherme Peres - Imagem: Zdeněk Macháček (Unsplash) Lançamento: 2021.

Sonia Sant`Anna já tem o seu nome consagrado no gênero romance histórico, mas surpreende agora com este mais recente lançamento que reúne dezoito contos e uma novela de cunho memorialista. Na verdade, o livro confirma a vocação literária de uma família de escritores, tão bem representada pelos seus irmãos Sergio Sant`Anna (1941-2020) e Ivan Sant'Anna, além do sobrinho André, filho do saudoso Sergio. Contudo, se, por um lado, esta proximidade com profissionais da literatura foi certamente positiva como influência; por outro, imagino que tenha gerado alguma ansiedade para atender as expectativas, assim como eventuais comparações.

Seguramente Rondó mantém a tradição de qualidade da família Sant'Anna nas letras; desenvolvendo um estilo que reflete um cuidado artesanal com o texto e uma escolha criteriosa da linguagem, a autora apresenta um delicioso classicismo em termos de forma na construção de suas narrativas, porém, ao mesmo tempo, o conteúdo temático expressa alguns dos conflitos e impasses da nossa época, tão comuns à natureza humana. Sonia nos apresenta contos que têm personalidade própria e bem forte, diga-se de passagem, além de demonstrar coragem para escrever sobre um segredo de família na novela autobiográfica que encerra o livro.

Encontramos um bom exemplo do texto refinado e sensível de Sonia no conto A perda, que nos mostra como uma mulher manteve vivo o seu amor durante muitos anos apenas por meio das lembranças: "Era preciso lembrar, para isso havia existido todos esses anos. Para rememorar retirara-se do mundo. Sua missão era manter vivo o amor, assim saberia que não havia amado em vão. Assim se manteria fiel como ele não soubera ser." No entanto, o que fazer quando a memória insiste em nos abandonar e se transforma em uma "renda esgarçada, deixando vazios na trama". Uma linda reflexão para nos alertar sobre a terível perda gradativa das lembranças.

"No início fora fácil rememorar, reviver tudo o que acontecera desde a primeira vez em que o vira. Podia mesmo sentir o cheiro da sua pele. Se fechava os olhos, bastava-lhe imaginar a cabeça dele sobre seus joelhos e esboçar um gesto de carícia para sentir a maciez de seus cabelos. Como se ele ali estivesse. / Depois, lentamente, as lembranças foram se confundindo. O risco do bordado já não era tão nítido, a renda se esgarçava, fios escapavam aqui e ali, deixando vazios na trama. Já não sabia com certeza se haviam conversado pela primeira vez na praia ou naquela festa. Em troca, lembrava-se perfeitamente do dia em que, estando ele de pé junto ao bar, ela se chegara com uma ausência de timidez que não lhe era habitual, entrelaçara os dedos nos dele e dissera 'eu te gosto muito'. Ele disse 'eu sei'." - Trechos do conto A perda (pp. 64-5)

Já em A partilha, a inspiração vem de um casal de mendigos que aparece um dia na praça, protagonistas tão comuns nos grandes centros urbanos e que, por isso mesmo, se tornam praticamente invisíveis aos olhos da população – mas não ao olhar atento da escritora –, este é o tema central de uma narrariva muito humana, afinal ainda persistem sinais da existência de um homem e uma mulher, escondidos em algum lugar por baixo dos trapos e da imundície, mesmo que todos saibamos o procedimento social nesses casos: "Aos mendigos não se pergunta sua origem, nem o que fez com que se tornassem mendigos".

"Ele, provavelmente, achou-a mais bela do que as outras mendigas. Ela, certamente, nele vislumbrou um protetor. A que horas se amavam? Nunca ninguém viu, nem os porteiros noturnos, nem os casais que voltavam tarde para casa nas noites de sábado. Diziam-se palavras ternas, ou simplesmente se acasalavam, em obediência à natureza que os fizera homem e mulher? Essas e outras questões perguntavam-se os moradores da praça, isto é, os moradores comuns, os que viviam em apartamentos com sala, quartos, televisão e ar-condicionado. / Havia mesmo quem, em noites chuvosas, perdesse um ou dois minutos a pensar como estariam se arranjando os mendigos, se teriam encontrado alguma marquise para se abrigar." - Trechos do conto A partilha (pp. 82-3)

A novela Recordações de uma velha senhora é um exercício admirável de como compor as memórias de toda uma vida em poucas páginas, tendo como fio condutor uma certidão de óbito de uma criança do sexo masculino de oito meses de idade e filiação desconhecida, encontrada por acaso por uma menina de treze anos que mexia escondida nas coisas da mãe, "não havia ainda aprendido a virtude da discrição e do respeito aos segredos alheios". É fácil adivinhar que esta menina curiosa é a própria Sonia Sant'Anna. O trecho abaixo descreve uma experiência "sacrílega" da pequena Sonia, então com quatro para cinco anos, impagável!

"Trabalhava na casa de vovó, contratado para pequenos serviços, o Jesus, menino de uns dez anos de idade. Um dia Jesus me chamou atrás das bananeiras, disse-me para eu abaixar as calcinhas, abaixou as calças também e mandou que eu pegasse no pau dele. Eu sabia que aquilo era 'coisa feia' e morria de medo que descobrissem. Quando a noção de pecado foi posta na minha cabeça, lembrei-me desse episódio. Eu deveria contá-lo ao padre da próxima vez que me confessasse, mas faltava coragem. O catecismo ensinava que omitir um pecado durante a confissão era gravíssimo, um sacrilégio, que se tornava ainda mais grave se comungássemos nesse estado. E eu continuava confessando e comungando, sempre tencionando contar ao padre da próxima vez, mas a coragem não vinha nunca. Tão nova e já sacrílega, que tormento! Mas, pensei, eu tinha quatro para cinco anos quando tudo havia acontecido e nessa idade não se peca. No colégio Sion, 'mère' Afonsita nos contou a visão de que uma santa tivera do inferno, no qual as almas danadas caíam como neve, entre elas algumas de criancinhas de três anos de idade. Eu era mesmo sacrílega." - Trecho da novela Recordações de uma velha senhora (p. 96)

Para concluir a resenha procuro um adjetivo que sintetize o estilo desses contos e me ocorre chamá-los de machadianos. Logo me questiono se, por um acaso, não seria um exagero da minha parte, mas, apesar de um elogio considerável, é justo e merecido. Recomendo a leitura.

Sobre a autora: Sonia Sant'Anna nasceu em Goiás, em 1938, e pertence a uma família de escritores. Iniciou na PUC, RJ, o curso de Letras, que concluiu em Belo Horizonte, MG. Viveu em diversas cidades no Brasil e no exterior, mas a maior parte de sua vida se passou no Rio de Janeiro. Vive atualmente em Belo Horizonte. Desde a infância desejava escrever, mas sua primeira profissão foi a de artesã joalheira, que aprendeu no atelier de Caio Mourão, o criador da joia moderna brasileira. Apreciadora de História, seus livros já publicados pertencem ao gênero romance histórico: Inconfidências Mineiras – uma história privada da Inconfidência (2004); Barões e Escravos do Café – uma história privada do Vale do Paraíba (2001); Leopoldina e Pedro I – a vida privada na corte (2004). Todos três pela Zahar. Memórias de um Bandeirante (2001), Editora Global. E Degredado em Santa Cruz (2009), pela Editora FTD. Leopoldina e Pedro I foi recentemente republicado pela Ibis Libris. Em Rondó, mudando totalmente de rumo, a autora oferece ao público dezoito contos e uma novela de cunho autobiográfico.
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Lucíola 04/06/2021

Rondó - Contos de Sonia Sant´Anna
Que ótima surpresa eu tive com o livro de Sonia Sant´Anna! Contos fortes, inventivos, dinâmicos, numa linguagem rica que vai nos enredando e nos levando a diferentes cenários. Contos de vingança, desilusão, lembranças, despedidas, violência, assassinato. E também incríveis contos sobre o fazer literário, que eu amei.
Já adorei o título, que é também o título do primeiro conto, Rondó. Tanto na composição poética quanto na musical, o termo remete à repetição de versos ou frases. Será que nesse conto vai haver rondó?
A mulher rejeitada e calculista de “Telefonema” se vinga do marido de modo exemplar. Não chegamos a ver sua reação, mas se pode imaginar!
No conto “O cão”, o narrador diz que “Gente como ele possuía vira-latas, magros e enfezados, a se esgueirar junto aos muros, orelhas murchas, sempre em busca de alguma coisa para comer. Os cães dos ricos eram diferentes”. Quando cheguei ao fim arregalei os olhos. UAU!
No conto “A perda”, a protagonista tenta reviver um amor. “Bastava-lhe, pensava, reviver eternamente, todos os dias, minuto por minuto.” Aos poucos a memória falha: “Mas os olhos? Como eram os olhos dele? Fazia um esforço, os olhos começavam a se desenhar para escapar totalmente em seguida”. Quanta poesia! E quanta solidão, nostalgia e ilusão.
Eu poderia falar de todos os contos, de todos os pontos a se ressaltar. Mas quero destacar o que eu vou chamar de duplas de contos. Se existe alguma denominação para esse tipo de narrativa, me avise, por favor! “Escrevendo José” e “José” estão na sequência, mas a outra dupla não está. Não vou falar quais são pra você ter a surpresa que eu tive. É muito engenhoso.
E, por fim, a novela não ficcional “Recordações de uma velha senhora”, em que revela um segredo de família a partir da reconstrução de toda uma vida, desde a menina Sonia, que aos cinco anos descobre que já sabe ler e decide ser escritora, até relacionamentos problemáticos e a revelação da história por tantos anos encoberta: o segredo do menino do cofre. E como esse segredo moldou tantas vidas e a afetou em especial, sempre tão cerceada e cobrada por religiosidade.
“Às mulheres, Deus concedia a maternidade, para elas prêmio suficiente, por isso não precisavam do prazer sexual. Os homens, era em troca desse prazer que se sujeitavam aos encargos de uma família.”

Leia este livro. Se você gosta de boa literatura, não vai se arrepender. E se gosta também de romances históricos, conheça os vários livros que Sonia Sant´Anna publicou.
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