Amanda 11/06/2021
Reanálise da obra
Leitura obrigatória no ensino médio da minha época, li, ri, mas a fundo não entendi - até rimei kkkkk - e, o que faltou Amanda, para você dizer que não entendeu?
Contextualização. É falta de contextualização - creio eu - um dos principais fatores para desencorajar o interesse dos alunos nas escolas. O jovem é pragmático, não quer ler/estudar/aprender sobre algo que - de seu limitado ponto de vista - não tem qualquer relação com a vida que ele vive ou com a sociedade na qual ele está inserido. Pra que aprender fórmula, nunca vou usar isso, pra que estudar história, a vida de quem já morreu e assim vai? Acontece que (pelo menos no caso da história - já que até hj não entendo a função dos catetos da hipotenusa? rs ) a crítica de Gil Vicente ainda espelha muito da sociedade atual.
Assim, bastava que dissessem que o autor escreveu a obra para a corte Portuguesa e, utilizando-se do humor, da sátira, mascarada através de personagens caricatos, traçou uma crítica à sociedade da época.
Observemos que nem o nobre, nem o ganancioso nem os representantes hipócritas da igreja e da justiça entraram na barca pra o céu.
Assim, a obra se passa no cais, onde os personagens estão a ponto de embarcar à barca do céu ou à do inferno.
A primeira pessoa que por ali passa é um fidalgo - alguém de posses - e quando tenta entrar na barca do céu afirma - Sou fidalgo de solar, é bem que me recolhais - mas tem seu acesso negado com a seguinte
frase - Não se embarca tirania neste batel divinal. - ou seja, subentende-se que um nobre senhor de terras tem a exploração do povo em conta, certo? (Peguemos a sutil crítica do autor à nobreza da época)
O segundo passageiro é um onzeneiro - uma espécie de agiota (era profissão na época) - logo, ambicioso, avarento - a quem o diabo ironiza - Ora mui muito m'espanto nom vos livrar o dinheiro!.. - leia-se: se o dinheiro tudo compra, pq você morreu?
O terceiro personagem é o parvo - que segundo o dicionário é o indivíduo de pouca inteligência - e quem de menos que nós, o povo iludido, que trabalha, paga impostos e sonha com melhores condições para representa o parvo? Kkkkkkk Pois o anjo lhe diz - Tu passarás, se quiseres; porque em todos teus fazeres per malícia nom erraste.
Tua simpleza t'abaste para gozar dos prazeres.
O próximo passageiro à barca do inferno é o sapateiro - rimei mais uma vez, estou contagiada! Kkkkkkk- e este representa a classe trabalhadora e católica, mas é também trambiqueiro, pois enganava os clientes e infiel e faceiro - não consigo parar de rimar! Rs ou seja, o retrato do belo hipócrita? - enfim, o diálogo entre ele e o Diabo é, de fato, muito engraçado (fiz de novo kkkkk) e destaco: Quantas missas eu ouvi, nom me hão elas de prestar? Diabo ? Ouvir missa, então roubar, é caminho per'aqui.
Bem, o seguinte passageiro nem precisa de explicação, né? O frade representa a igreja católica, que desvirtuou seus princípios por conta de interesses próprios. A ele, o diabo diz: Para onde levais gente?
Diabo ? Para aquele fogo ardente que nom temestes vivendo.
Após ele, uma alcoviteira - prostituta da época - quando questionada pelo Diabo o que leva, responde: Que é o que havês d'embarcar?
Brízida ? Seiscentos virgos postiços e três arcas de feitiços que nom podem mais
levar. - Ou seja, enganou muito homens e prostituiu muitas mulheres, além de supostamente ser uma feiticeira? recusa-se a embarcar ao inferno, alegando que fora muito torturada durante a vida e por acreditar que todos possuem pecados como os seus, mas ao fim, sucumbe ao seu destino.
O próximo personagem, o Judeu, tenta comprar sua entrada no barco do Diabo! - Judeu: Passai-me por meu dinheiro. - E o Diabo se NEGA! O parvo ainda descreve as tradições católicas que o Judeu teria desrespeitado.
O próximo é o corregedor, seguido do procurador - representantes da justiça, são condenados ao inferno por manipular a justiça em benefício próprio.
Em seguida, vem o enforcado, que afirma que seus pecados devem ser perdoados: fui bem-aventurado em morrer
dependurado como o tordo na buiz, e diz que os feitos que eu fiz me fazem canonizado. - mas, como ele morreu enforcado justamente para espiar seus pecados, teve que se contentar com a barca infernal.
Por derradeiro, vêm 4 cavalheiros, que teriam morrido em poder dos mouros - turcos - na guerra pela reconquista da península, logo, o anjo os convida à barca do céu, por terem morrido defendendo o cristianismo (em detrimento do islamismo, religião dos mouros)
Assim, vemos nos personagens que embarcam ao inferno características comuns de apego à vida terrena (todos carregam objetos, que representam seu apego à vida material, enquanto que os que entram no céu são cristãos e puros. O mundo ironizado pelo autor é dividido, literalmente, entre o bem o e o mal, o bom e o ruim e, logo, o céu e o inferno e, apesar de fazer uma crítica à sociedade da época, também um viés católico, de crítica aos que não seguem a religião.