Higor 12/12/2018
'20 melhores livros do século 21': Livro 19
Com uma bibliografia prestigiada e até mesmo intimidadora, o sucesso de Roberto Bolaño, grande parte póstumo, o catapultou para níveis inimagináveis e invejáveis, com títulos e menções de peso, como o de segunda maior voz latino-americana, perdendo apenas para Gabriel García Márquez. Logo, a procura por seus livros aumentaram de maneira surpreendente, assim como a quantidade de fãs.
Parte dos planos do autor, no final das contas, deu certo: o autor queria que seu último livro, ‘2666’, a ser publicado postumamente, desse uma boa renda para seus filhos. Tal atitude é apenas parte das polêmicas e curiosidades que envolvem o livro, uma obra aclamada e odiada.
Tendo por base dois núcleos - o de tentativas de saber quem é o recluso autor alemão Benno Von Archimboldi, e o de assassinatos de mulheres ocorridos em Santa Teresa -, ‘2666’ é considerado pelo próprio autor como seu trabalho mais bestial e colossal, com traços daquilo que ele prometeu nunca mais escrever. O resultado, como é se de esperar, é tão caótica quanto o conturbado processo de escrita.
Correndo contra o tempo, por conta da doença que o assolava, mais parece que Bolaño escrevia e escrevia e não se atentava tanto quanto a revisão, o que sabemos que não confere, já que ele tinha muito zelo em escrever e reescrever sempre que necessário; a prolixidade e informações desnecessárias que permeiam todo o livro, no entanto, enfadam. Em críticas negativas, sempre é pontuada a presença de cenas inteiras que não agregam nada.
O primeiro capítulo, o curioso ‘A parte dos críticos’, e o último, o desolador e incrível ‘ A parte de Archimboldi’, seriam o suficiente para fazer de ‘2666’ um livro igualmente ou mais inesquecível, pois os demais capítulos, que focam nos assassinatos de mulheres em Santa Teresa, são chatos, sonolentos, desafiadores. Resenhas dizem que é uma tarefa árdua atravessar o deserto de Sonora, diante de tantas mortes tão cruas, mas a dificuldade se dá com os detalhes que parecem mais chocar e polemizar, que necessariamente trazer reflexão ou algum outro sentimento de empatia com as vitimas.
O último capítulo foi, para ser bem sincero, o que salvou o livro, em minha concepção. Foi ali que eu enfim entendi a genialidade do autor, e o que ele queria fazer de ‘2666’, e que não conseguiu por conta de sua morte prematura. E é com certo pesar no coração que eu não posso afirmar categoricamente que ‘2666’ foi um livro incrível, porque ele é, infelizmente, um esboço de algo que seria gigante, incrível, de fato. E entre o esboço e o projeto final, há uma linha tênue.
A biografia de Archimboldi, com informações e cenas tão bem feitas e pensadas, me fez querer reler a parte dos críticos, apenas para me lembrar das dificuldades que os professores tinham em tentar desvendar figura tão enigmática; isso apenas para se ter noção do quanto eu gostei dessa parte especifica.
E é somente nas ultimas partes que entendemos a conexão dos dois eventos, e começamos a entender e admitir que o autor é, sim, genial, mas então o livro acaba, incompleto. Sim, eu entendo o que cada um quis dizer quando mencionou que Bolaño é uma experiência, algo além de literatura, mas enquanto livro pronto e livro do que poderia ser, eu me abstive ao que ‘2666’ se tornou e chegou a minhas mãos.
Mas o mais gracioso de tudo é que ‘2666’ não é apenas ‘2666’. É muito mais. Bolaño é um quebra-cabeça, logo, ‘2666’ é ‘Os detetives selvagens’, é ‘Amuleto’, mas ‘2666’, sozinho, é um vistoso, porém não tão imponente pedaço do grande e devastador iceberg que seria, caso Bolaño tivesse concluído sua obra.
’20 melhores livros do século 21’ é uma lista encomendada pelo site de cultura da BBC, em que diferentes especialistas foram responsáveis por eleger os melhores livros do mais recente século. Para saber mais sobre a lista e conhecer os demais livros, acesse:
site: leiturasedesafios.blogspot.com