kaiônico 21/03/2024
Se me lembro bem, em um dia tedioso, me deparei com uma livraria chamada Martins Fontes enquanto andava pela Avenida Paulista. Lembrei da minha adolescência, quando eu era um leitor fervoroso, e pensei: "Por que não entrar e dar uma olhada?"
Quando vi "Darius, o Grande, não está nada bem" na prateleira do estabelecimento, acreditei ser um romance homoafetivo, um pouco pela capa e um pouco pela sinopse. Mas o que mais me interessou foi descobrir que o livro trata-se da história de um adolescente estadunidense, filho de uma mãe persa, que viaja ao Irã pela primeira vez para conhecer sua família.
Veja bem, até o presente momento, março de 2024, a lei iraniana pune com a morte indivíduos do mesmo gênero que tenham relações sexuais entre si. Portanto, se minha suposição estivesse correta, eu tinha em minhas mãos um livro que abordaria não somente uma cultura que nunca tive a oportunidade de me aprofundar, como também abordaria como é ser uma pessoa homossexual inserida nessa mesma cultura.
Pois bem... Comprei o livro, hahaha.
Se Darius é homossexual ou não, eu acredito que sim, mas não tenho certeza, porque, embora o livro tangencie esse tema, ele nunca de fato mergulha nele. Mas o que eu sei é que o livro é fantástico.
Darius é um menino deslocado dentro e fora de casa. Ele é persa demais para se enturmar com seus colegas de escola, que vivem o pentelhando, e é persa de menos para se comunicar com seus familiares maternos, tanto pela diferença cultural quanto pela barreira linguística. Além disso, ele sente que não atende às expectativas de seu pai e, embora ame sua irmã caçula, vê nela algo que ele não tem: pertencimento. Isso porque, diferente dele, Laleh fala persa fluentemente, possui amigos na escola e tem o afeto do pai.
Entretanto, as coisas começam a mudar quando Darius chega ao Irã. Surpreendentemente, longe de tudo que ele conhecia até então, ele finalmente começa a sentir que pertence a algum lugar.
É um livro muito lindo, que trata de assuntos importantes com leveza. Afinal, ninguém aguenta mais ver histórias sofridas. Eu, pelo menos, não aguento. De sofrida já basta a vida.
Eu me encontrei ansioso para ler cada vez mais, passava o dia todo com a cara grudada no papel e fiquei muito triste quando o livro acabou. Além disso, me senti tão abraçado quanto o personagem principal quando ele percebe que seus atributos físicos, como cabelo e nariz, que antes eram motivos de incômodo, ali, naquele novo contexto, se misturavam aos de seus familiares e geravam uma sensação de integração, de fazer parte do todo.
Chorei, sorri e tive uma boa leitura como há tempos não tinha. Espero que este seja o primeiro de muitos outros livros que lerei daqui para frente com gozo, como fazia antigamente.