Resenhas - Yonqui

none 07/09/2021

Oráculo da geração beat
É preciso separar o que é literatura e o que foi a vida de William Burroughs. A vida dele está em matérias de jornais e revistas, biografias autorizadas ou não. William viveu muito e mais livremente nos livros dele e dos pupilos beatniks que iam buscá-lo como um oráculo para amenizar suas aflições e anseios juvenis e para procurar dicas sobre como escrever melhor. Ele próprio foi incentivado a divulgar suas palavras e sua vida justamente por essas palavras e essa vida serem tão marginalmente significativas. Isto é, dignas de divulgação para quem tiver coragem de ler e aprender. Afinal, para ele "tudo deve ser experimentado até o limite", audaz explorador do lado mais selvagem da vida que foi. E apesar de tudo, ele não perde a distância (o foco) da inteligência.
A experiência do autor com as drogas não é um incentivo. Como explica o livro ela ocorreu por acaso, por estar no lugar errado, na hora errada e com as pessoas erradas. Da morfina, à heroina, da cocaína ao peiote e ao yage, Burroughs mostra o que leva o consumo das drogas injetáveis, pós, comprimidos e ervas, cactos e seus sintomas. Ele não abre mão de descrever momentos ruins como idas aos hospitais e clínicas, fugas e prisões, efeitos da crise de abstinência após o consumo desenfreado que o tornaram junky, ou melhor, que tornaram seu personagem junky, um viciado.
No meio dessas experiências, o narrador busca a lucidez - ou a tentativa de levar quem o lê - para uma discussão sobre a hipocrisia do discurso antidrogas e até ensaia debater o uso médico e controlado pela sociedade.
Não é uma leitura agradável, ainda mais nesses dias, mas ela proporciona uma necessária reflexão sobre as pessoas usuárias de drogas, como devem ou não serem tratadas, e de que forma se deve ou não consumir certas drogas. A pura e simples interdição como mostra a realidade, a história e livros como este só leva ao uso abusivo da droga, aumento de internações, encarceramento, violência e mortes.