O Ancap

O Ancap Fausto Oliveira




Resenhas - O Ancap


3 encontrados | exibindo 1 a 3


mauriloamml 20/06/2023

Fraco
O livro tem uma proposta muito boa, mas se perde no caráter panfletário. O autor pesou o mão. O livro perdeu o caráter de um romance, virou uma longa argumentação contra os ancaps.
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Brunov 10/03/2023

Bosta
Vocês não gostam de resenhas depreciando, mas, cá entre nós, ocara fez um livro inteiro pra falar mal de um espantalho de pessoas liberais, anarcocapitalistas, investidores, trades, empresários e pragmáticos e só fica falando mal desse sujeito e daquilo que se associar a ele. A história não se desenvolve direito, porque precisa invalidar seu "antiprotagonista" a cada passagem.

No meio do caminho usa alguns argumentos, mas não adianta contra argumentar, porque para você que concorda, eles são lógicos; para você que discorda, você é imoral; e ainda que prove que tem algum erro, ele já deixa avisado no começo que é apenas recuso narrativo. Aliás, reduziu toda economia a um jogo de narrativas.

Não estou dizendo que tais posições não possam ser atacadas, mas faltou caprichar, se dar ao trabalho de evocar alguma substancialidade, apresentar algo da complexidade social e, quem sabe, produzir uma revelação ou reviravolta.
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João Moreno 11/12/2021

Livres para defender o status quo, "tudo que está aí, tá ok?"

Finalizei a leitura de O Ancap às duas e quarenta da manhã, numa enfermaria de um Centro de Atenção Integrada à Saúde (Cais), em Goiânia. Enquanto o meu avô dormia um sono inquieto, um aparelho de nome ‘Dixtal – DX 2022’ media a saturação de seu oxigênio e os seus batimentos cardíacos. A cada uma, duas horas, a enfermeira vinha, andava entre as baias, averiguando dados e informações ininteligíveis, para um leigo. O soro em seu braço corria devagar, o terceiro, desde que cheguei ao centro de atendimento. Ao seu lado, uma idosa, internada há pouco, recebia oxigênio, tinha a sua pressão aferida e estava à disposição de um número sem fim de aparelhos que faziam barulhos engraçados. O outro paciente, um senhor que sofreu danos cognitivos e motores após um Acidente Vascular Cerebral (AVC), dormia um sono tranquilo, depois de receber a medicação correta. [Sou obrigado a parar de escrever: a médica, plantonista, veio conferir os pacientes da enfermaria. “Ela tem asma?”, perguntou sobre a recém-chegada, enquanto ajustava os cilindros verdes, de oxigênio]. Enquanto o fim da leitura de O Ancap me provocava reflexões, um adesivo azul e branco, com uma cruz nas mesmas cores, acima da maca do meu avô, chamou a minha atenção: em letras de fôrma, desbotadas, a sigla “SUS” ainda era legível, com todo o simbolismo que ela carregava, naquele momento. Ainda que passível de críticas e de apontamentos para melhorias, o que seria da vida dos três, narradas acima, e de outros milhões, sem acesso ao ainda jovem sistema de saúde público brasileiro, estabelecido pela Constituição Federal de 1988 como “um direito de todos e dever do Estado”?

Se você não conhece o recém-lançado romance do jornalista Fausto Oliveira, deve estar se perguntando qual a relação da descrição acima com a leitura e a resenha do seu novo livro. Se, por outro lado, já ouvir falar de O ancap, creio que entenda como a construção do parágrafo anterior tem muito a dizer. Imerso e ativo no ingrato debate público do Brasil de 2021, Fausto, “um dos poucos jornalistas que conheço que discute o Brasil na complexidade que ele merece”, nada contra a maré do Jornalismo brasileiro, que ainda vê no mofado Consenso de Washington a solução para a estagnação e para o subdesenvolvimento do país. Em sua luta contra o discurso de que os problemas do mundo se resolvem com mais “Disciplina fiscal” e com a “Privatização de empresas estatais”, acredito que, em algum momento, o jornalista se deparou com um fenômeno curioso: um grupo de jovens barulhentos, defensores da mais abstrata “liberdade”, da dissolução de todo o tecido social em nome da “supremacia do indivíduo”, que advoga por uma moral e por uma ética construída à parte da sociedade, e que se sustenta, filosoficamente, em autores guiados pelo mais puro Darwinismo Social. Com uma linguagem própria, a qual só faz sentido nesse Brasil paralelo, que vai do Princípio da Não-Agressão (PNA) ao Ranking da Liberdade Econômica (sic), essa “turminha do barulho” cresce a cada dia nas redes, seja em fóruns do Reddit, em perfis do Twitter ou em canais nichados do YouTube. Com um discurso sedutor mas simplificador, em nome da “liberdade” – e a palavra “liberdade” vai ser instrumentalizada exaustivamente por esse grupo, afinal, como é possível seres humanos contrários à liberdade? – esse fenômeno sociológico, filho da “desintegração neoliberal”, vem ocupando o espaço público brasileiro.

É desse contexto que surge a matéria-prima para O ancap. No romance, que é curto, rápido e envolvente, o jornalista Fausto Oliveira captura esse momento histórico muito bem, levando-o ao extremo, sendo esta, talvez, a principal qualidade do seu recém-lançado trabalho. Ao descrever as nuances de uma disputa que, se a priori parecem restritas a nichos do submundo da internet, no “mundo real”, apresentam-se no cerne das decisões políticas, sejam nos Projetos de Lei (PL), nos editoriais dos Jornais Imparciais “em defesa da democracia” (sic), nas Emendas Constitucionais (EC) e nos Planos de Governo. Está tudo lá, n’O ancap’: o industrial – que, na vida real, poderia facilmente ser confundido com um economista “heterodoxo” -; o youtuber ancap, com um canal de milhares de inscritos e a incrível capacidade de reduzir toda a vida social (e as diferentes áreas do conhecimento) à lei da oferta e da demanda; a horda de despolitizados que cai nos discursos de “LIBERDADE, LIBERDADE”; o ultraindividualismo; o discurso meritocrático; o Jornalismo canalha, que se aproveita de sua concessão pública e de sua função historicamente construída para vender uma realidade que apenas beneficia aos seus interesses econômicos; a financeirização da economia; a retirada de direitos sociais; a articulação política entre os diferentes poderes com o objetivo de, desde 2016 e um pouco antes, destruir todas as garantias estabelecidas pela Constituição Federal de 1988. Por meio da ficção, O ancap “desenha” todo esse processo, o processo de deterioração coordenada do Estado brasileiro e de qualquer possibilidade de desenvolvimento autônomo futuro. Em outras palavras, o romance também trata do “butim”, como descreve incansavelmente o economista Eduardo Costa Pinto, em seu programa Diário da Crise.

“(…) Aquele seria o primeiro projeto quase inteiro representativo do ideal Ancap aprovado no país (…) Investimentos imobiliários em Miami e grandes capitais europeus já estariam alinhavados. Contas especiais em ilhas caribenhas estariam já organizadas”

Trecho de O ancap

É assim, através da obra, que o jornalista Fausto Oliveira ressalta como o discurso “libertário” – necessariamente a-histórico, negacionista e revisionista –, por mais que se apresente como “apolítico” ou “ausente de ideologias”, comporta-se, conforme escreveu a doutora Sabrina Fernandes em seu livro, “[n]uma farsa altamente ideológica criada para legitimar tanto posições conservadoras do senso comum (…) quanto visões neoliberais de eficiência e governança de mercado sob presunção de neutralidade”. Em O ancap, o protagonista se vê diante de um dilema não tão distante do Brasil d’O caminho para a prosperidade: um grupo de lobistas, através do financiamento de parlamentares, de jornalistas e de youtubers, pretende privatizar o Sistema Único de Saúde (SUS). A “festa” estaria garantida, pois o “(…) o projeto vai fatiar o sistema. Tudo aquilo que for tangível vai ser privatizado, os hospitais, as clínicas. E o que for intangível, por exemplo, a base de dados dos usuários, a folha de pagamento dos funcionários, tudo isso passa a ser administrado por empresas de aplicativos digitais contratados pelo governo por licitação” [trecho de O ancap].

Essa história é narrada através de dois personagens com princípios morais diametralmente opostos, que tem na formação em Economia e na amizade juvenil os únicos pontos em comum. Se de um lado temos o industrial Santiago, empresário do ramo da Saúde que acredita no capital produtivo, em desenvolvimento nacional e no “Estado planejador”, do outro temos o youtuber Uilian, também conhecido como Will Rich, do canal libertário No Such a Thing, em referência à histórica frase da conservadora Margareth Thatcher – “There is no such a thing as society” -, reconhecida por implementar as reformas neoliberais na Inglaterra, na década de 1980. Nesse momento, qualquer semelhança com a realidade não será mera coincidência. Na ficção, Wil Rich, um trader financiado pelo lobbie da Saúde a convencer o seu público da “moralidade” da saúde privada, se assemelha, e muito, com o youtuber das ideias radicais, por exemplo, financiado por corretora de criptomoedas ao mesmo tempo em que advoga pelo fim do Estado, dos direitos sociais, de qualquer noção de coletividade, chamada, pejorativamente, de “coletivismo”. “O que só muito aos poucos percebi é que esses teoricismos menores são uma prática de desvio da atenção, porque o que estes meninos querem é clara e simplesmente enriquecer. Eles falseiam situações hipotéticas em favor de uma imagem de sociedade livre-mercadista plena, a fim de angariar mais gente descontente com suas vidas, em geral jovens e menores de idade, para lhes franquear apoio nas batalhas da internet. Uma vez que conseguem formar um exército de multiplicadores dispostos a tudo para enriquecer, é bem evidente que parte dos meninos vira repetidor e nisso eles ficam, e outra parte – como Will Rich, – entra para o jogo grande. E, claro, o jogo grande é aquele jogado nas finanças” [trecho de O ancap].

Ainda divagando sobre o “ancapismo”, é interessante notar a contradição fundamental da ideologia: se o discurso se afirma originado em “indivíduos livres”, a ideologia de Wil Rich e de sua turma se fundamenta e se dissemina a partir dos neoconservadores norte-americanos, os quais ocupam, hoje, o controle do Complexo Industrial-Militar estadunidense, responsável pela política externa “estatista” e expansionista daquele país nada liberal ou libertário. Não só: think tanks, como a Heritage Foundation, fundada pelos já citados neocons, “esses antigos intelectuais liberais, que se desencantaram nos anos 60 e 70 com os rumos que a ‘esquerda’ americana estava tomando, [que] apoiam a ortodoxia e a unidade cultural, [que] reivindicam a ampliação dos orçamentos militares, acreditam em um governo federal forte, e que certos fatos devem ser conhecidos apenas por uma elite política” -, responsável pelos “rankings de liberdade econômica” da vida, o grande trunfo ancap sobre à suposta superioridade do livre mercado, são instrumentos de “soft power”, “chutando a escada” de países em desenvolvimento ao disseminar ideologias nunca aplicadas em suas próprias fronteiras. Obviamente, como pensamento marginal que é – à margem da ciência, das formas de se produzir conhecimento –, para que tenha força entre seu “séquito de religiosos”, o discurso anarcocapitalista precisa descartar, prontamente, todo pensamento crítico e vasta literatura. Se um ancap chegar a ler essa resenha, por exemplo, logo a “refutaria”, seja negando o papel da geopolítica, a importância da intervenção estatal para o desenvolvimento capitalista ou afirmando que o “neoliberalismo”, citado por mim, acima, “não existe”…

Por fim, gostaria de ressaltar que tão, importante quanto os temas discutidos, O ancap, assim como o romance Essa gente, do Chico Buarque, deixa claro de que forma a realidadesocial de nosso tempo pode ser matéria prima para a boa ficção. Não sabemos se o seu livro vai conseguir furar bolhas, é verdade, mas um passo para isso foi dado. Que surjam novos autores os quais, por meio da arte, qualquer uma, tenham a intenção de, como escreveu o pesquisador Ciro Marcondes Filho, “quebrar estereótipos, clichês, ideias prontas e um certo pensamento repetitivo”. Tomando emprestado e adaptando o famoso bordão libertário: mais Faustos Oliveiras e Chicos Buarques e menos Ayn Rand!

site: https://literatureseweb.wordpress.com/2021/12/11/livres-para-defender-o-status-quo-tudo-que-esta-ai-ta-ok-resenha-de-o-ancap-de-fausto-oliveira/
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