Gabriel 12/12/2023A arte e suas idiossincrasias de classe aqui é fomentada, desenvolvida e aniquilada pelos caminhos de seu próprio labirinto.O labirinto tem como característica o desafio de se achar uma saída; ou seja, é muito mais fácil se perder nele do que se encontrar. A arte - como todas as áreas do conhecimento - faz parte de um campo de disputa político e cultural. Em nosso contexto é a (pequena) burguesia que a comanda e fomenta, e é ela que se mostra como o objeto de observação de Bernhard. Mais objetivamente: é em uma sala de jantar artístico que o narrador observa a fauna que compõe o métier dos supostos intelectuais que fazem parte do encontro. Um palco apropriado para uma representação da persona no mundo das aparências. Ali o narrador nos conduz de forma obsessiva e irritadiça pelas hipocrisias e contradições de uma classe artística medíocre, organizada e comprometida apenas com seus próprios interesses. Nem a morte por suicídio de uma colega ocorrida dias antes do jantar - e cujo objetivo do próprio jantar era também homenageá-la - é capaz de frear o mise en scène. O narrador em uma espécie de organização mental destila seu ódio contra todos que fazem parte da cena, mas de certa forma está lá, mesmo não querendo faz parte do grupo. Quer se afastar, romper com esse modus operandi, há anos os abandonou mas está lá, mesmo distante o narrador/escritor ainda pertence a esse ethos artístico. Durante essa observação, porém, um dos presentes no jantar - a principal atração da noite, um ator representante de um famoso teatro vienense - o faz mudar de perspectiva. Agora, por um breve momento, há algo de interessante nesse encontro, uma atitude inesperada: uma irritação contra um dos membros do petit comité. Um ataque que funciona como um salto filosófico, talvez não para o ator apenas, mas principalmente para o narrador/escritor. Talvez haja uma esperança. A obra do narrador (e por que não do próprio Bernhard) é uma provocação. A provocação para uma autoanalise; para um pensamento crítico que a arte deveria exercer, mas que ficou estabelecida nas mãos de quem se sujeitou a bajulação e compadrios. Ao final a agonia, a irritação e a pressa do narrador vira quase um antídoto, uma chamada ao centro aterrado como lembrança contra a estagnação e o meio (o mundo da arte) que nos influencia e paralisa que constantemente devemos questionar. A arte estacionada não semeia futuro, se é que há algum.