Marianne Freire 21/06/2023
O tecido poético dos contos de Mel Renault é envolvente onde cada conto é o nome de uma flor, com alto relevo de qualidade literária. Uma narrativa de miudezas misteriosas e assombrosas envolvendo histórias de mulheres.
Mel trabalha a ficção com uma natureza de mistérios e surpresas com habilidades inteligentes para prender o leitor com contos de terror. Se você já leu ?Venha ver o pôr do sol? de Lygia Fagundes Telles, verá como Mel utiliza recursos de narrativa semelhante.
A obra começa com uma perspectiva tanatológica, a morte da mãe de Zinia e suas dores, e com a crença popular de fazer um ?deselance da alma contra o corpo?.
Zinia desenvolve uma fixação psicótica de recuperar a mãe morta, e projeta nas irmãs a representação da mãe, sempre em estados de desequilíbrio, instabilidade e violência. A morte de Zinia causa o declínio da casa, das plantas, de tudo. Zinia se transfigura na imagem da mãe e assusta a todos no velório, e assustadoramente a presença de Zinia e Isaura estão na casa, passeando mortas no pomar.
A personagem Gardênia que se transforma na cobra que a matou, e que faz vítimas na cidade inteira assustando os moradores como um acontecimento de tamanha estranheza;
Dália considerada a bruxa que cuida sobrenaturalmente dos que estão prestes a morrer. Verônica que espera seu marinheiro voltar, como a obra de Valter Hugo Mãe, sua vida se resumia a esperar, como Isaura esperava alguém que não viria em Filho de Mil Homens, até encontrar Crisóstomo.
Uma magnólia desmemoriada que vive a conversar com os mortos e a lhes pedir àgua; A tarefa àrdua de Perpétua de enterrar pai, mãe, amigos da vila, e ser uma figura de crença popular que faz cerimônia de despedidas; Uma Clívia com cólera delirante e enferma dos juízos, com estigma de loucura e de ?encantar bonecas?.
A morte de Moréia dos gatos e o filho gerado como mistério macabro tornando a trama insólita e de terror. A solidão de Verbênia que inventa tardes inteiras vividas ao lado de alguém que não está mais ali. A fé de Íris, sua morte e o perfume das camélias; Alpina que trançava nas linhas e cipós, pesadelos e ruínas. Presa em uma teia, nunca mais atormentou sonhos, nem soprou destinos.
Petúnia presa aos interesses da mãe e possuída por forças maiores onde destruiram sua vida ao manipulá-la para bruxarias, o livro de Mel Renault é forte, vivo (mais mortes que vida), assombroso, perigoso e sobrenatural. Místico e atraente por ser extranatural. A sua escrita é fluida e detalhista, apurada e precisa ao se tratar de uma obra de contos fantásticos e tanatologia, fazendo o leitor imaginar os cenários de terror e morte participando ativamente da história.
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