Pedro Henrique Müller 10/03/2023
Como fugir da internet?
Livro fundamental que acaba de sair pela editora Ubu. Um alerta para a necessidade de um futuro off-line. Não sabemos exatamente como. Mas uma coisa é fato incontornável: já ultrapassamos o ponto de sentirmos os efeitos terríveis da vida 24/7 de incessante disponibilidade para o consumo e para o turbilhão de informações do mundo do cyber-junk internético. Mundo de ausência, terra de lixo, insensível a dor, ao luto, avesso ao coletivo e ao encontro, indócil, terra de crueldade exacerbada, que se beneficia da intolerância, de falsas esperanças, do vício, do isolamento, do endividamento e da sensação de vida desperdiçada. Um espaço de corrosão da memória e de total desmantelamento dos tecidos sociais comuns.
Precisamos descobrir alternativas - Crary nos convoca a pelo menos darmos algum passo e estranhamos a conformação passiva diante de uma realidade que não pode parecer imutável. Ele nos convida a uma fuga imediata do complexo internético. De volta para um futuro (possível) da materialidade dos espaços com seus contornos palpáveis e fundamentalmente para a redescoberta dos nossos desejos. Para que tenhamos de volta ao nosso alcance o destino daquilo que é a condição da nossa existência e para que recuperemos a possibilidade de um mundo vivo, intersubjetivo, e para que tenhamos novamente, um rosto, uma voz, um olho.
"A questão é que o contato direto entre seres humanos não se confunde nem pode ser comparado com a simples troca ou transmissão de palavras, imagens ou informações. Esse contato está sempre inundado de elementos não linguísticos e não visuais. Mesmo quando seus resultados são pouco inspiradores ou até banais, os encontros face a face são uma base irredutível do mundo da vida e de sua comunalidade; trazem em si o possível surgimento de algo imprevisto que não tem nenhuma relação com a comunicação normativa. Encontros não acontecem em espaços vazios e tampouco estão limitados pelas bordas de uma tela. São uma imersão, a habitação de uma atmosfera, algo que, conscientemente ou não, afeta todos os sentidos. Esse tipo de encontro, essa proximidade, é literalmente uma con-spiração, um respirar juntos"