Karina
17/06/2024Nossa Senhora do BarracoUma travesti que conversa com a Virgem Maria e opera milagres. Essa é apenas a premissa que te fisga e gera curiosidade para ler o livro "Nossa Senhora do Barraco". A partir daí, a autora, Gabriela Cabezón Cámara, apresenta uma trama que não foca na religião, mas em outros temas atuais, urgentes e necessários.
Cleópatra é uma travesti que passou por muitos desafios e dificuldades na vida, como muitas outras iguais a ela. Moradora de El Poso, uma favela argentina, Cléo passa por um episódio violento e começa a ter visões da Virgem Maria. Se transformando em uma figura de liderança na comunidade onde vive, operando milagres e dando conselhos divinos, mas sem abandonar seus vícios e a luxúria.
Qüity é uma jornalista cética e sensacionalista. Ela vê em Cléo uma oportunidade para uma boa história, mas, à medida que a narrativa avança e elas se tornam cada vez mais próximas, seus pontos de vista se chocam. A história é moldada pelas perspectivas dessas personagens, levando-nos a questionar qual seria a versão real dos acontecimentos.
Como sou curiosa, busquei no Google por "favela argentina" e me deparei com uma realidade não muito distante das favelas brasileiras. Procure pela "Vila 31" e verá que ela é quase invisível para o pedestre que caminha pela região, mesmo estando ao lado de áreas nobres, fica "escondida" atrás das linhas de trem e guardada por um muro que se estende por metros.
Com uma linguagem provocadora e crua, misturada à cumbia (ritmo musical mais popular da Argentina), a autora não se limita e foca em uma crítica religiosa, ela estende seu olhar para uma série de questões sociais. "Nossa Senhora do Barraco" nos impacta e choca, fazendo-nos refletir sobre comunidades marginalizadas, desigualdade social, homofobia, violência policial, negligência do Estado, e a busca por dignidade e justiça.
Nesta obra, encontrei uma história autêntica que certamente permanecerá na mente dos leitores, assim como permanece na minha. Basta iniciar a leitura com a mente aberta e dispostos(as) a ouvir tudo o que o livro tem a nos contar.