Nossa Senhora do Barraco

Nossa Senhora do Barraco Gabriela Cabezón Cámara




Resenhas - Nossa Senhora do Barraco


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Ivandro Menezes 13/01/2024

Um dos princípios fundamentais do cristianismo é o da intercessão. Deus se revela a uns e faz conhecer a sua palavra. No VT são, em geral, os profetas. No NT a encarnação faz com que o próprio Deus fale por si. Ao longo da igreja, ele se revelou aos apóstolos e a homens, mulheres e crianças. Em regra, essas manifestações dotam seus receptores de uma aura especial, peculiar, conferindo-lhes uma missão especial, salvífica, redentora.

Em Nossa Senhora do Barraco, romance da argentina Gabriela Cabezón Câmara, essa missão fica a cargo de Cleópatra, uma travesti conhecida por seu dote avantajado e que passa a conversar com a Virgem Maria, celebrando milagres a partir de sua intercessão.

A partir da iniciativa da jornalista Qüity em escrever sobre os eventos envolvendo tais manifestações e suas implicações em sua propria vida e na da favela em que tudo se deu, vamos conhecendo as facetas e contradições inerentes a toda história de santidade, incluisve em sua proximidade com o profano. Não há nada genuinamente impuro que não possa com o toque do sagrado vir a ser purificado. E se o tom profético jaz ausente na forma, permanece na essencial, nos ecos, na entrega de Cleo ao seu chamado, ao ritmo da cumbia, as carpas, gatos, cães e ratos na favela.

Cabezón Câmara faz do romance um caledoscópio de elementos díspares para compor um ritual sincrético, entre delírio e ceticismo, entrega e resistência, poder e crença, em pequenos barracos erguidos como catedrais imensas que incomodam, reverberam e atiçam os poderes estabelecidos, ao se quebrar com a discrição mútua entre os de dentro e os de fora da favela.

Empolgante, divertido e contundente. Vale muito a pena.
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Toni 18/04/2024

Leituras de 2023

Nossa Senhora do Barraco [2009]
Gabriela Cabezón Cámara (Argentina, 1968-)
Moinhos, 2023, 160 p.
Trad. Silvia Massimini Felix

O colofão é aquele espaço na última página de um livro onde geralmente são indicados o tipo de papel e a fonte usados na impressão, assim como a gráfica, a cidade e o ano em que determinada obra foi impressa. Para além desses dados, não raro editoras acrescentam efemérides, notas divertidas ou convidam os próprios autores para contribuírem. A Moinhos (quem não conferiu ainda que trate de conferir) sempre deu um show no uso político deste paratexto, e o que lemos na última página de Nossa Senhora do Barraco é o seguinte: “No Brasil, há 10 anos, Amarildo, ajudante de pedreiro, era torturado até a morte por policiais no Morro da Rocinha. Seis PMs que foram condenados continuam trabalhando na corporação militar. Infelizmente, até hoje, sua ossada não foi encontrada e sua família não conseguiu realizar um sepultamento em seu nome.”

Este livro de Cabezón Cámara, autora do brilhante “As aventuras da China Iron”, é um romance de favela, de travestis, de marginalização e brutalidade. A lembrança de Amarildo é, portanto, um lembrete inescapável da força que memória e fabulação podem ter ao elaborar com dignidade vidas invisibilizadas ou resumidas à forma trágica como foram encerradas. Dividida entre duas vozes complementares, Qüity, uma jornalista que se apaixona pela travesti Cléo, e Cléopatra, a travesti que começa a ouvir as vozes da Virgem Maria e operar milagres, a narrativa explora as dinâmicas sociais, afetivas e de resistência de toda uma comunidade em vias de ser desapropriada para benefício de políticos, policiais e empresários do ramo imobiliário.

Mas o romance vai muito além desse arco narrativo, explorando os efeitos de certas drogas na composição de um discurso frenético — inconsistente e/ou fabuloso — e nas imagens de violência, desejo, amor e ódio que permeiam nossa humanidade adoecida. Uma leitura pesada, é verdade, mas escrita com as doses certas de deboche e revolta contra a mesquinhez e o cinismo daqueles que controlam o mundo e fazem fortuna com a criação e a manutenção das periferias.
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Tathi (@Doidosporserieselivros) 04/11/2023

Olá queridos amigos leitores! Venho por meio dessa informar que li o melhor livro do ano e que vocês terão que aturar uma série de posts falando sobre ele!

Nossa Senhora do Barraco da argentina @cabezoncamara , é o lançamento da @editoramoinhos desse mês, e nos conta a história de Cleópatra, uma travesti da favela que fala com Nossa Senhora, e que por meio dela recebe profecias sobre o bem e o mal que ocorrerão para a comunidade.

A narrativa alterna entre o olhar de Cleo , devota a virgem, tenta ser uma mulher iluminada e fiel ao seu dever, e Qüity uma mulher totalmente incrédula que apesar de viver com Cleo não acredita em uma palavra daquela ?baboseira? cristã e bíblica.

?? ? continua sendo impossível abraçar os mortos, feitos apenas de uma memória que também morre??

Partindo de uma premissa simples, a trama toma ares geniais, fiquei grudada nas palavras irônicas e sarcásticas de mulheres que sofreram na mão de homens, do mundo, e da maldade humana.

Apesar de a protagonista ser uma pessoa Trans , a autora não se prende em convencer o leitor sobre a importância do respeito, ela mostra, insere , faz com que nos conectemos com a dor de uma mulher igual a nós que já passou por violência extrema de formas inimagináveis e arranjou uma forma de continuar.

Além disso, há questões reflexivas sobre desigualdade social e o quanto a crença diferente parece incompreensível aos olhos do outro.

Continua na próxima postagem?

#editoramoinhos #gabrielacabezoncamara #nossasenhoradobarraco #lavirgemcabeza
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Wandrovski 24/01/2024

Difícil mas excelente
Diferente de tudo que eu já li, temos uma história MUITO inusitada sendo contada aqui, no começo é até difícil engatar a leitura mas conforme toda ambientação vai se construindo, vamos emergindo no universo e nos apegando completamente as protagonistas. por gentileza, leiam pois preciso de interpretações diferentes da minha! :)
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Rodrigo 06/02/2024

?Tudo o que is born morre?
?Nossa senhora gosta dos pretos e também das pretas, e das travestis pretas eu tenho pra mim que ela gosta duas vezes mais?

uma narrativa em 360º quem te possibilita diversas interpretações e sentimentos. você vai rápido (e impactado) do sagrado ao profano; da fé ao ceticismo; do amor à vingança; da pureza ao sujo; e percebe toda a mistura que isso é. uno e múltiplo. uma história que te faz ver que nada na vida e na morte é algo tão simples. e nem que deva ser encarado de apenas uma forma.

?Esse ser de matéria que sou eu, também tem sua persistência, sua vontade de continuar sendo?
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soleiolgbt 10/03/2024

Para mim foi uma leitura intensa.
Para mim foi uma leitura intensa. É uma obra impactante que aborda temas profundos e urgentes, como a marginalização, a violência policial e a busca por dignidade e justiça. A maneira como a autora utiliza a figura da Virgem Maria para dialogar com Cleópatra é uma abordagem muito original e simbolicamente poderosa. A narrativa oferecer uma reflexão sobre a condição humana, a luta por reconhecimento e a resistência em meio à adversidade. É uma leitura que nos convida a repensar nossos preconceitos e a compreender melhor as realidades das comunidades marginalizadas. No mínimo uma leitura instigante! 🌈📚

Sinopse: Uma narrativa cheia de inventividade e com múltiplas camadas de interpretação. Cleópatra, uma travesti, depois de sofrer uma atrocidade enquanto estava presa, acaba por ter uma revelação mística: a Virgem Maria surge para conversar com ela. Decide, então, que não irá mais se prostituir e começará a cuidar do seu povo.

Quando Cleópatra adquire um novo status, quase o de uma santa milagreira, passa a ser respeitada e conhecida por suas ações, que começam a ecoar e a chamar a atenção. Qüity, uma jornalista da imprensa sensacionalista que busca retratar histórias marginalizadas, fica a par de tudo que está por trás da figura de Cléopatra e resolve entender um pouco mais sobre esse "fenômeno", envolvendo-se cada vez mais com a vida cotidiana da favela e com a própria travesti.

Gabriela Cabezón Cámara se utiliza da dor, do humor, do choro e das drogas para mostrar como a nossa humanidade, até quando ao lado de Nossa Senhora, de nada vale frente a um contingente policial que nos criva de balas. Nossa Senhora do Barraco é uma narrativa que não conta apenas a vida de pessoas consideradas à margem da sociedade: ela evidencia toda a brutalidade sofrida pelo povo de El Poso, uma violência que se estende a todas as periferias do mundo.
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Lurdes 13/03/2024

A argentina Gabriela Cabezón Cámara vem com tudo na estória da travesti Cleópatra, que após uma visão da Virgem Maria, se converte e passa a ser idolatrada pelo pessoal da favela onde mora, tornando-se, não só uma líder espiritual mas uma benfeitora para aquele povo, tão desvalido quanto ela.

Mas nem pense que é uma narrativa espiritual/religiosa, nos moldes convencionais.
Cleópatra pode ter se tornado uma espécie de Santa, mas não perdeu o gosto pela bebida, drogas e pelas orgias.
As drogas, inclusive, parecem facilitar as visões de seus seguidores.
As narradoras são a própria Cleópatra e Qüity, uma jornalista sensacionalista, que vai cobrir os milagres da "santa", acha a história muito interessante e se muda para a favela para coletar mais material na intenção de escrever um livro.

Qüity acaba mergulhando de cabeça nesta loucura e se envolve não só nos problemas e perseguições pelas quais os moradores passam, mas também se envolve emocional e amorosamente com Cleópatra.

Eu já havia me encantado com a escrita da autora quando li As Aventuras de China Iron.
Ela consegue falar de assuntos sérios, através de uma prosa irônica, desbocada, sem nunca perder a empatia por suas personagens, marginalizadas, desprezadas, que encontram força de maneiras super inusitadas para seguir em frente.

E o plot no final? Eu não esperava, embora já fosse anunciado lá no início e não percebi.

Super recomendo.
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Filósofo dos Livros 29/03/2024

UMA TRAVESTI VÊ NOSSA SENHORA
Quando soube do livro “Nossa Senhora do Barraco”, escrito pela autora argentina @cabezoncamara, publicação da @editoramoinhos, fiquei imensamente interessado.

A obra conta a história de uma travesti que sofreu violência paterna por conta do preconceito e que, mais tarde, sofreu violência da polícia e dos presos, chegando a ser abusada. Na situação desse segundo crime, fica inconsciente. Mas Nossa Senhora lhe aparece para trazer cura e conceder-lhe uma missão.

A partir daí, a travesti Cleópatra se torna uma líder religiosa de uma favela, pregando amor, perdão e conversão. Nossa Senhora lhe pede mudanças, mas nenhuma se refere ao fato de ser uma travesti, o que demonstra que a Virgem não é preconceituosa e acolhe seus filhos.

Com a liderança de Cleo, a comunidade da favela se desenvolve e desperta a curiosidade das pessoas que a cerca. Logo, uma jornalista chamada Qüity se interessa pela realidade desse povo liderado pela vidente.

Temos um livro em que a narrativa é feita por duas mulheres: a jornalista Qüity e a vidente Cleo, o que torna a história bem interessante. Qüity não acredita nas visões, porém é uma defensora nata dos marginalizados. Cleo é a filha de Nossa Senhora acolhida que traz uma perspectiva de fé, mas sem deixar de ser questionadora. Muitas vezes, Cleo até parece bater de frente com a Virgem.

A trama não fala apenas da religiosidade popular, mas trata de diversos temas que envolvem preconceitos e luta pela vida. Ao final da jornada de Cleo e da comunidade, somos levados a refletir sobre a capacidade do ser humano de transformar a adversidade em força e a crueldade em compaixão. "Nossa Senhora do Barraco" não é apenas uma história sobre uma travesti e sua visão religiosa, mas um retrato vívido da resiliência humana e da busca por um mundo mais justo e acolhedor. Trata-se de uma leitura que nos desafia a questionar nossas próprias crenças e preconceitos, revelando que, mesmo nas situações mais sombrias, a luz da esperança e da mudança pode brilhar intensamente.

#LiteraturaArgentina #GabrielaCabezónCámara #EditoraMoinhos #Superacão #Inclusão #Amor #Fé #Desenvolvimento #Perspectivas #Questionamentos #Preconceitos #PazVsGuerra

site: https://www.instagram.com/eusouofilosofodoslivros/
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lucasgsan 16/06/2024

Nossa Senhora Travestida
Gostei muito. Leitura diferente, mas que traz muitos aprendizados?

A história da travesti Cléo que, depois de ser violentada e estuprada, encontra com Nossa Senhora na prisão e recebe uma missão importante de ser como uma líder espiritual para a favela onde mora é simplesmente maravilhosa.

No começo fiquei meio confuso com a escrita da autora, mas depois tudo flui perfeitamente e não conseguimos parar

É interessante esse duplo da Cléo, uma travesti que trabalha como prostituta e Maria, mãe de Jesus e Virgem.

Apesar das diferenças, há muito em comum. Ambas são mulheres de fé e foram silenciadas em suas respectivas realidades.

Adorei a reação Kitty e Cléo, apesar de não gostar tanto da Kitty por conta de algumas atitudes um tanto duvidosas

Um livro de muitas ruínas e vestígios. Um livro de muita denúncia. Um livro real.
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sandim_steh 12/02/2024

IG: @PAPEANDOSTEH
?A morte me doía: a dele, a minha e a de minha filha que ainda não estava viva em sentido estrito, quero dizer, ela ainda não tinha nascido; tudo me doía: quando se abre a consciência para a morte, ou a morte para a consciência, algo se abisma no centro do ser, se fissura em um nada, e esse nada lacera mais do que a tortura, no sentido de que angustia, sufoca, importuna, e tudo o que se pode desejar é que termine.?

{RESENHA: ?Nossa Senhora do Barraco - Gabriela Cabezón Cámara?} Neste livro vamos conhecer Cleópatra, uma travesti, que após vivenciar e sofrer atrocidades enquanto estava presa, ela vivencia um momento único e místico: a Virgem Maria surge para conversar com ela, fazendo Cleópatra mudar completamente seus pensamentos, parando assim de se prostituir e começando assim a cuidar de seu povo.

CONFIRA A RESENHA COMPLETA NO IG: @PAPEANDOSTEH
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snoopyievski 06/06/2024

*gasps*
Nossa. Ok. Preciso de um tempo para processar tudo o que tem aqui.
Não sei o que dizer? estou sem palavras, digitando sobre estar sem ter o que dizer para ver se consigo tempo para colocar em palavras os sentimentos, reflexões sobre, enfim.
Vou começar dizendo que o Kevin foi um personagem que me dilacerou do começo ao fim, nas primeiras páginas eu já sabia que ia sofrer por ele especialmente. Tudo o que acontece ? na verdade, os acontecimentos relatados por Qüity e Cleo ? é de uma crueldade que parece rasgar suas entranhas quando você entra em contato com a leitura, porque você sabe que não são letras misturadas formando palavras e formando sentenças aleatórias, são coisas que acontecem por todos os lados. Mas, quando não é o nosso lado, não dói em nós pois não estamos lá; dói nas vezes que lembramos. Não estou com o livro aqui agora para citar perfeitamente, mas Qüity diz algo sobre quando uma catástrofe acontece, existem as pessoas que podem fugir dela e as que não podem. E quando você pode fugir, a catástrofe simplesmente não está acontecendo para você (venho editar com a frase exata depois).
A questão é o quão fora você pode realmente estar, o quanto você pode se desfazer de uma realidade que você já conheceu? Qüity fala sobre sua vida antes e após virar favelada de El Poso, no final ela faz menção sobre tentar voltar ao que era antes da tragédia, mas não tem como.
Puxei só um pedaço de tudo o que esse livro traz. A complexidade da relação da Cleo e dos moradores de El Poso com a religião, a dor de não ter proteção daquele ser divino a quem você devotou sua vida, lidar constantemente com o luto, a violência que Cleo sofre e como ela precisou ressurgir das cinzas para sobreviver?
Existe muita coisa acontecendo aqui. Tem muita dor, mas tem muita diversão, tem muita felicidade, mas tem muito corte brusco no meio desse lugar feliz.
Posso adicionar que a capa dessa edição é perfeita trazendo elementos da história (além de bem bonita!)
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