Sabrina758 14/03/2024
Neste retrato pungente do luto, relacionamento abusivo e lugar de subalternidade, Viola narra com crueza a vivência dessa personagem ? não por acaso, sem nome ? durante a sua embarcada por Xangai. Com uma escrita que me lembra muito a de Elena Ferrante, Fome Azul me encantou profundamente.
A narrativa nos revela a fragilidade e baixa autoestima dessa mulher que, ao longo da sua vida, se colocou nesse lugar de inferioridade e invisibilidade, coletando dores e desafetos. Com a morte do seu irmão gêmeo, além de perder a pessoa com quem tinha maior ligação, se vê perdida sobre o seu papel na vida das pessoas e a sua própria identidade, já que sempre foi a sombra de Ruben.
Ao longo dessa jornada, vamos conhecendo mais sobre sua relação com o irmão e os motivos pelos quais ela decidiu ir para Xangai, além de recortes culturais que, por vezes, nos fazem sentir como se estivéssemos lá. Além da sensação clara de ansiedade e ritmo acelerado que a cidade provoca nela.
Após conhecer Xu, uma das alunas da escola onde ela está ensinando italiano, é que as coisas ficam ainda mais viscerais e degradantes. A relação delas é um jogo de poder onde uma está disposta a devorar e a outra a ser devorada, quase que literalmente.
Em meio às saídas noturnas e tour gastronômicos, tentam constantemente preencher vazios irreparáveis através do consumo ? seja de comida, sexo ou conhecimento. Há, constantemente, manipulação, ghosting e degradação, ambas se tornam, ao seu modo, dependentes da outra.
O livro nos deixa desconfortáveis a todo momento, pois não suaviza o quanto pessoas quebradas se dispõem, ainda que de forma inconsciente, a situações humilhantes e degradantes em troca de tão pouco, apenas para sentir algo.