Pedro Costa 31/12/2022
Força e Honra
Para encerrar as atividades de 2022, “Lorde Jim”, de Joseph Conrad, foi meu 54º livro lido no ano; o método adotado na organização do cronograma de leitura não obedeceu nenhuma lógica complexa, pelo que credito unicamente à boa sorte o fato de ter sido esta obra prima a derradeira peça em minha preparação para o desafio que me reservei para o ano que já bate à porta... ou, quem sabe, apenas as teias tão indeléveis quanto invisíveis, amiúde presentes na lei da causalidade, a conectar os resultados alcançados com suas sempre necessárias causas pregressas!
Em 2021 eu escrevi um romance em que narro a saga do veleiro Khronos, culminada em seu naufrágio no meio de uma reserva paradisíaca do Atlântico, a 70 Km da tropical costa baiana. Talvez por tê-lo escrito ainda sob efeito do choque, da perda sobretudo emocional, conquanto também material, o trabalho parecia-me extremamente insatisfatório, embora eu não conseguisse determinar o que lhe faltava... até ler este livro, que me abriu um imenso leque de dicas valiosíssimas!
Joseph Conrad soma-se à minha lista de favoritos ombreando com Ernest Hemingway, Gabrielle Colette e James Joyce, guardando todos eles em comum uma impressionante capacidade de perscrutar a alma do personagem, em suas impressões mais profundas, cada um a seu modo... e nesse aspecto em particular, todos muito didáticos, por assim dizer, o que no momento vem a ser o que mais me interessa.
Mais que um mero duelo entre honra e covardia, o livro aborda o problema da identificação confiável das fronteiras entre esses valores, tão abstratos e de intangíveis limites dentro da capacidade crítica de cada ser humano, cada qual com sua noção muito particular de dignidade... percebe-se as nuances morais e psicológicas do personagem central em cada parágrafo dessa deliciosa narrativa, repleta de profundas reflexões, todas muito úteis nessa eterna busca de si mesmo que nos aflige a todos.
A exemplo dos outros autores que mencionei acima, a meu ver Conrad também projeta seu alter ego nesta obra, eventualmente expiando aqui sua angústia de polonês que se naturalizou inglês para poder rever os parentes sem o risco de ser preso durante o período em que sua terra natal foi invadida pelos russos... e que a partir daí consome sua vida numa infindável busca por redenção, inalcançável absolvição de uma prisão perpétua auto infligida e cuja execução o acompanha onde quer que vá.
Eu entendo a identificação desse confronto com a própria consciência – nosso mais cruel juiz – como a grande sacada desta obra... a percepção de que somos mortais, sujeitos a falhas, e em quem, portanto, em algum momento, alguma fraqueza irá fatalmente se manifestar. É esta a lição prática de que pretendo agora me servir.
Não é leitura para qualquer um; trata-se de um desafio, mas vale muito a pena!
Pedro Costa.
site: “Pensando Bem...” (https://pedrolcosta.blogspot.com/)