Freddy Bacus 02/06/2024
Liberalismo disfarçado
O livro não é escrito por Ailton Krenak. Pois bem, tive esse choque, as palavras que temos contato não são dele, e sim de terceiros que fizeram uma colcha de retalhos com trechos de oralidades do indígena. Porque digo isso; os textos não apresentam carácter ensaistico, nem literário, nem nada. Talvez umas ideias sociológicas, mas não, é partido de premissas individuais, axiomas totalmente parciais. Isso me incomodou profundamente, não existe linha, caminho, método, validação nenhuma, sequer as palavras impressas num livro com o selo "companhia das letras". Comendo o mundo...
Pois bem, dito isso, a edição do livro erra ferrenhamente ao não indicar num pré contato com os textos, que tais são retirados e refeitos a partir de lives na internet de Krenak ou entrevistas. Isso faz parte do processo de leitura, deve-se saber que o texto em questão não foi escrito, e sim falado, que ele sequer possui um título que não artificial, assim como as indústrias e as máquinas tão criticadas no conteúdo objetivo do livro. É só no final, para os atentos, que percebem que a composição foi feita com trechos de "ao vivos".
Certo. Passando o primeiro encômodo, além da falta de contexto do conteúdo pelo próprio autor - e grande parte desse método é dos editores também. Portanto, seguindo, o último texto que mais me chama atenção, pelo lado bom e pelo lado ruim. Acho que nele, finalmente Krenak resolve se sujar e tomar um partido, que não o encima-do-murismo que toma ao longo do livro quase que num coach da natureza, apenas tento os ocidentais como sinônimo de capitalismo e os ricos - o que me é estranho sem nenhum embasamento, e outra, os povos originários brasileiros são ocidentais propriamente localizados. Mas é então que tem-se um partido, suja-se com os da sustentabilidade - de lógica propriamente neoliberal - e também queima-se com os pobres urbanos, além de já ter se queimado com os ricos - dos quais pouco nos ligamos, eu e ele. Nesse texto em específico, me salta os olhos a dinâmica de alta romantização que Krenak faz sobre a vida em si, como se ela fosse escolhivel. A própria ideia de optar por é burguesa por excelência. Mas me embrulhou o estômago quando disse que os pobres poderiam não ser miseráveis se não optaçem por esse sistema que vivem, da lógica do dinheiro e da utilidade da vida, e me pergunto sobre as relações de privilégios em determinadas discussões: temos medo, como politicamente corretos, de contrariar as lógicas de minorizados socialmente, mas eu questiono tais lógicas de Krenak pois, esse fala de uma posição de extremo privilégio quando se vê e se coloca de fora do sistema capitalista, se vê na posição de devoto ao ócio da natureza, e ele, nesse status de privilégio perante a classe trabalhadora urbana - que, diga-se de passagem, sustenta sua preservação de terras pelos tributos governamentais - julga que a posição e a situação miserável da pobreza pode ser evitada com o ócio da natureza sendo uma vertente. Isso é inadmissível, mesmo que quem fale seja uma minoria ou uma voz de autoridade. É um julgamento pela posição de privilégio; e aqui se concretiza o que disse no início, essas idéias que aparecem nesses pensamentos são completamente voluntárias e parciais, são axiomas sugeridos inteiros pela sua própria individualidade, sem embasamento nenhum que não uma lógica individualista de sua única visão a respeito de uma lógica maior, da qual tanto critica. O capitalismo pode ser o grande problema, mas os liberalismos escondidos nos métodos também são, sem dúvidas.