Toni 02/05/2021
Leitura 28 de 2021
A unicórnia preta [1978]
Audre Lorde (EUA, 1934-1992)
Relicário, 2010, 166 p.
A leitura de A unicórnia preta foi muito bem acompanhada lá no encontro de abril do clube de poesia organizado pelo @literaturabr (gratuito, hein). Nos encontramos para falar da cosmogonia apresentada pela escritora e ativista nos primeiros poemas da obra, dos momentos de intensa beleza reparadora dos afetos, da entrega do corpo e da resiliência pela via ancestral, da observação cotidiana e das muitas mortes morridas ainda que não sejam nossas (ou da autora). Neste livro, mais do que pude perceber na coletânea “Entre nós mesmas”, o prazer é uma forma de desafiar os roteiros hegemônicos de obediência e ele atravessa, com a devida e esperada complexidade, várias das composições aqui presentes.
O poema que dá título ao volume abre a primeira das quatro partes em que se divide a obra e nos chama a atenção para essa criatura inusitada — mulher, negra, mãe, lésbica, feminista —, invisível no mundo das “certezas” acachapantes do machismo, da branquitude e da heteronormatividade: criatura como muitas, “inquieta” e “implacável”, que precisa “falar lembrando / nunca estivemos destinadas a sobreviver”. Escritos entre 1975 e 1977, os poemas de “A unicórnia preta” compartilham do mesmo contexto de reflexão e produção dos ensaios de “Irmã outsider”, de maneira que muitos dos textos aqui e ali se iluminam, como diferentes tratamentos de um mesmo tema, ou de uma mesma preocupação sócio-feminista-filosófica.
Segundo a poeta e pesquisadora Eliza Araújo, Lorde nos ensina que há um letramento do amor e do amor-próprio. E ela faz isso, citando outra pesquisadora e poeta, Lívia Natália, ao não permitir que a mulher, a mulher negra, a mulher negra lésbica, esqueça seu desejo. É a partir dele que o feminino encontra aquelas narrativas de liberdade capazes de tecer novas e libertárias verdades. Ao lado de nossas muitas poetas negras brasileiras contemporâneas, vivas e em constante produção, Lorde é uma daquelas vozes cuja expressão poética desenha uma cartografia sem limites do que significa ser preta e mulher neste mundo.
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