Jardim de histórias 20/01/2024
Fiodor Dostoievski, um observador de si mesmo
Se te esqueres de mim
Não me esquecerei de ti;
Tudo é possível na vida,
Não esqueças tu de mim!
Uma verdadeira dicotomia, uma divisão do que se é e do que gostaria de ser. Assim Dostoievski nos entrega a sua segunda obra, um livro controverso e muito criticado devido a uma incompreensão dos críticos da época (Vissarion Belinski), não havia um entendimento sobre algo que abordasse tão profundamente um tema sobre o fluxo da consciência, com isso, personalidades como Belinski e Turgueniev, atribuíam a um esboço da própria personalidade de Dostoiévski, criticaram a obra classificando como enfadonha, pouco criativa e superficial.
Sobre a obra;
Inicialmente, já se percebe o desejo inconsciente do personagem (Golyádkin) pela duplicidade, no que se refere a ser e aparentar ser, o que potencializa a ideia de necessidade de uma projeção social. Ingredientes fundamentais para uma trama sobre dupla personalidade com componentes imaginativos, etc. Só que é aí que entra a genialidade incompreendida de Dostoiévski, com a materialização inverossímil do Duplo. Sim, materialização da subconsciência, dando à trama a sensação de materialidade e qual é o sentido dinâmico que permeia esse conceito? Era através dessa materialização, a possibilidade de acesso coletivo, permitindo o olhar externo, fazendo com que o personagem (Golyádkin), pudesse se confrontar, ou se reconhecer em outra pessoa, enxergando o seu eu, para lidar com sua personalidade, subvertendo suas desvirtudes, facilitando a extração de valores, artimanhas do vasto universo mental.
Um tanto quanto complexo, fenomenal e nem um pouco explicativo e talvez o fato de Dostoiévski não ser um autor autoexplicativo tenha levado a crítica da época a classificar negativamente a obra em questão. O fato é que Dostoiévski é para quem acredita em Dostoiévski, sendo considerado um dos maiores autores da história mundial.
Sobre a edição;
A edição da 34 coleção leste conta com a extraordinária tradução direta do russo por meio de Paulo Bezerra e também ilustrações, com aspectos fortes, violentos e viscerais, com nuances de esboços do expressionista Alfred Kubin, que dá um tom imersivo e que se funde com a atmosfera mental da obra.