Pandora 29/10/2019“Dias Perdidos” conta a história de Clara e de seu filho Sílvio e de como de certa maneira suas vidas tiveram inquietações semelhantes. Não há grandes ações ou acontecimentos. É fluxo de consciência.
Clara é apaixonada por Jaques e Jaques é apaixonado pela liberdade. Quando Sílvio nasce, ele vê a oportunidade de ganhar o mundo, já que agora ela tem o filho. Ela sofre e passa por períodos os mais diversos: negligencia Sílvio, vive absorta de tudo, se apega à religião, se afasta, trabalha incansavelmente, agarra-se ao filho, se acalma. E Sílvio, vivendo naquele ambiente sem regras, mimado e superprotegido não só por Clara, mas por Áurea, uma espécie de tia postiça e empregada, não encontra motivações e ambições de vida, se deixando levar pelos acontecimentos. Ele acaba projetando em Diana, a primeira namorada, seus ideais de felicidade.
Eu não me lembro exatamente quando comecei a ler este livro. Ele tem três partes; depois da segunda senti necessidade de um respiro - que durou longos meses - pois estava repleta de sentimentos densos como nuvens carregadas de chuva.
Tudo converge para que este livro pese: a narrativa, as emoções, as angústias dos personagens, os parágrafos extensos, os recuos mínimos, as páginas totalmente preenchidas com texto, sem espaço em branco. É uma narrativa recheada de dúvidas, aflições e questionamentos. Lúcio Cardoso entra na cabeça dos seus personagens e traz à tona toda a vastidão dos seus pensamentos. Sei que é uma definição estranha, mas isto é maravilhosamente cansativo. Cansativo porque é impossível se distrair da leitura e não perder alguma coisa; cansativo porque o pensamento tem uma velocidade que a ação não acompanha, então cada frase, cada parágrafo compõe um turbilhão que alimenta a mente do leitor. Não há descanso. E maravilhoso porque como é interessante desbravar a mente humana!
É uma narrativa carregada de melancolia constante, como se a felicidade não fosse permitida àqueles personagens. Uns poucos momentos de alegria; mas só.
Um bom livro. Triste, profundo, denso. Mas depois uma leitura leve é bem vinda.
Nota: Lúcio Cardoso também escreveu para o teatro e o cinema (sua grande paixão) e chegou a roteirizar e dirigir um filme inacabado; após um AVC que paralisou o lado direito de seu corpo impedindo-o de escrever, dedicou-se à pintura, chegando a realizar duas exposições. O livro “Crônica da casa assassinada” é considerado sua obra-prima e foi traduzido para o francês, inglês e italiano. Em 1966, dois anos antes de morrer, Lúcio foi agraciado pela Academia Brasileira de Letras com o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto de sua obra. Fonte: Wikipédia.