Alê | @alexandrejjr 23/03/2021
A ensaísta singular
Susan Sontag foi uma mulher inacreditável. Ela, como pouquíssimas pessoas, esteve à luz das revelações socioculturais pelas quais os Estados Unidos passaram nos anos 1960 com opiniões seguras, firmes e originais que muitas vezes tratavam de temas complexos.
A Arte era sua área de maior interesse, seu campo de domínio. Fotografia, pintura, literatura, cinema. Dotada de uma criatividade profundamente corajosa, Sontag fez em seus ensaios, gênero textual que prioriza essencialmente a síntese e o tratamento crítico de um determinado tema, o que muitos não conseguem fazer através da ficção ou até da não ficção.
Quebradora de barreiras invisíveis, Sontag era voz dissonante entre os intelectuais estadunidenses. Neste “A vontade radical”, meu primeiro contato com a autora, pude perceber o porquê de tanta fama. Capaz de exibir uma sensibilidade incomum, expressa através de um texto argumentativo sofisticado, Sontag sabia exatamente o que devia perguntar, como analisar, o que explicar e que tipo de resposta dar aos leitores. É fantástico.
Hábil e inteligente, Sontag foi um dos maiores exemplos do que é ser uma intelectual pública. Ela deixou um legado inspirador para todos, sobretudo para as mulheres, mostrando que é possível ter posições firmes, sendo provocativa a ponto de irritar a nós, homens, e a nossa frágil masculinidade, e isso é uma contribuição sem tamanho. São inúmeros os constrangimentos masculinos disponíveis no YouTube que ilustram a posição grandiosa dela. Uma feminista em essência, ainda que tivesse suas controvérsias entre as próprias mulheres, Sontag se preocupava muito em ser levada a sério. E isso era o mínimo que ela exigia.
Entre as três partes que dividem a obra, destaco os seguintes ensaios: “A imaginação pornográfica”, no qual Sontag faz uma defesa do valor intelectual da pornografia na literatura; “Teatro e filme”, em que disserta sobre o cinema enquanto arte e suas intersecções necessárias, com argumentos em diálogo com o crítico francês André Bazin; e por último o gigantesco híbrido entre ensaio e diário com mais de 70 páginas sobre a visita da autora a Hanói, à época capital do Vietnã do Norte, no calor do momento da guerra, onde ela constrói magistralmente uma tese sobre o que é ser filha da maior e mais poderosa nação do mundo e do lugar da percepção em diferentes culturas, onde o real e o imaginário entram em conflito.
Susan Sontag está aí para ser descoberta. É importante para nós, leitores, conhecer alguém que buscou acima de qualquer objetivo a sensação de ser livre e independente através do pensamento. E mesmo que isso custe tempo e atenção - pois o texto dela não é fácil, apesar de objetivo -, não podemos nos privar do prazer de ler algo dessa magnitude. Portanto, sinta-se à vontade para entrar no enriquecedor mundo de uma das mulheres mais importantes dos EUA no século XX.