Absalom, Absalom!

Absalom, Absalom! William Faulkner
William Faulkner
William Faulkner




Resenhas - Absalom, Absalom!


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Lasse_ 19/04/2021

Ler Faulkner é, via de regra, uma experiência que requer muita atenção e foco. Seus longos fluxos de consciência e constantes saltos temporais sem aviso, bem como um narrador onisciente quase inútil tornam a leitura de Absalão, Absalão! bastante complexa, mas recompensadora. É maravilhoso observar a história se criando de relato em relato, nunca se completando de fato mas sempre progredindo como um quebra-cabeça sendo resolvido.

O personagem principal desta história não aparece como personagem atual. A narrativa se dá muito depois de sua morte, e tudo que é contado dele é pela ótica dos personagens ao seu redor, cada um tendo uma visão diferente dos fatos, e formamos uma imagem deles através tanto daquilo que eles contam, o jeito como eles contam, como daquilo que ignoram. E é também evidente que por isso Thomas Sutpen, que aparece numa cidade como um personagem enigmático, suscita mais perguntas à medida que são apresentadas respostas.

Um elemento importante na obra do WIlliam Faulkner é o tempo. Seus livros fluem não linearmente: neste, tanto o tempo no qual os personagens presentes contam uns aos outros o que sabem e ignoram sobre a agora longínqua história de um homem de ambição, história essa que deixa marcas profundas até agora nos seus descendentes, tanto esse tempo quanto o tempo dessa história remota que ganha vida através de outras línguas, passa todo quebrado, e é pedido do leitor que ele mantenha um mapa mental dos eventos para não se perder. O fim não está no fim e o começo não está no começo.

É compreensível que este seja o livro dito mais complexo do autor, mas tanto quanto suas outras obras, é uma leitura que vale a pena investir o tempo.
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Ricardo Rocha 11/07/2012

A principio, a idéia é de uma sinfonia, da apresentação de temas que serão desenvolvidos e tocados por diferentes instrumentos. O que Rose tem a dizer é quase uma sinopse. Faulkner mostra a relação de comportamentos pessoais e a História e nesse sentido a narração cronológica e uma única visão seriam deturpadoras. Destino, Deus, justiça, arbítrio, misericórdia e ausência de misericórdia estão intrinsecamente ligados. A arrogância tem seus momentos mas não prospera. A família, longe de ser o pilar que a que se costuma atribuir a força de seus membros, é vista como a causa maior das tragédias pessoais e o ser sociável faz fronteira com a linha tênue para além da qual estão a malediciência e a marginalização da diferença. A obrigatoriedade da releitura vai dando cor ao romance, como um pincel reforça a nuance em uma tela a cada passada e torna nítida uma paisagem. Talvez em Absalão Faulkner tenha atingido o ápice do estilo em que diz o que já disse como se não tivesse dito e supõe que o leitor esteja a par do que não disse ainda. Ele diz através de Rose que Sutpen é um demônio e não diz mas entendemos que ele afinal tinha motivações como as de qualquer pessoa e mais que a maioria das pessoas possui uma força de vontade férrea. Da mesma forma, o vício degenera essa virtude. A sedução da neta adolescente de Jones se equilibra entre o homem determinado e vigoroso apesar da idade e a decadência causada pelo alcoolismo e pelo agravamento de fraquezas até então ocultas. A aceitação social que o dinheiro concede não dura e na verdade há toda uma conotação social mais que sexual também no caso com a menina, na insinuação da atração homossexual, na questão do incesto e outras passagens. Tudo isso leva aliás ao contexto de onde o título é tirado, a história bíblica de David em que o rei lamenta a morte do filho traidor, "Meu filho Absalão, Absalão meu filho, meu filho!" - desde o incesto de Amnom com a irmã Tamar, passando pela amizade entre o rei e Jonatas, cujo "amor era mais maravilhoso do que o amor das mulheres" e a formosa Abisague, que tinha cuidado do rei e o servia quando velho, jovem que tirará do sério seu sábio filho Salomão etc. E, como na Bíblia, as passagens do romance se prestam a interpretações totalmente errôneas. De outra vez pode ser que eu veja de outra maneira, mas hoje considero "Absalão, Absalão" o ápice de Faulkner e provavelmente de toda a Literatura, onde recursos não exatamente originais, como a narrativa não-linear, as mudanças de perspectiva e as elipses se mostram como se fossem coisas jamais vistas, pela forma engenhosa como ele os usa para criar na agonia do espírito humano não a glória e não o lucro com a glória (do escritor) mas um material de transformação e crescimento até então inexistente para os demais homens, para que possam pela voz dessa escrita ir além do registro e, como o próprio Faulkner disse ao aceitar o Nobel, “suportar e prevalecer”.
Arsenio Meira 10/06/2014minha estante
Eis um Faulkner que não posso ficar adiando. Sua resenha reforçou ainda mais essa sensação.




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