Aline.Guimaraes
19/06/2024Simples e encantadorRelações familiares podem ser bem complicadas às vezes.
Annie John, da autora caribenha Jamaica Kincaid é uma narrativa sobre a própria Annie, a narradora, mas também uma história sobre a sua família que começa em Antígua com Annie criança e evolui até seus 17 anos, quando vai sozinha para Londres estudar.
Ainda pequena, a menina acreditava viver em um pequeno paraíso cheio de proximidade e carinho com sua mãe – onde uma estava a outra estava, o que uma vestia a outra vestia também. Mas certo dia Annie se choca ao ir à costureira para encomendar vestidos de mãe e filha, como de costume, e ouvir de sua mãe que ela já estava bem crescidinha para isso. A partir daí ela começa a observar que seu paraíso já não está mais intacto e pequenas e grandes fissuras aparecem na relação entre as duas.
Já contei aqui para vocês algumas vezes que tenho uma filha pequena, que está nessa fase de encantamento e aproximação comigo, então logo que vi a sinopse desta história, quis muito lê-la. Nunca é fácil admitir e visualizar um futuro em que sua filha tão amada já não será aquela sua alma gêmea. Por isso senti dor ao ler essa história. Porque ela é feita de nuances e sutilezas. Nada de realmente trágico ou importante acontece para que Annie e sua mãe se distanciem. Apenas o tempo e o crescer. E isso é aterrador.
Em uma das passagens mais bonitas e tristes da narrativa, Annie diz: “No ano em que completei quinze anos, me senti mais infeliz do que já imaginara que alguém pudesse ser.” E descreve essa infelicidade como uma “pequena bola preta, toda embrulhada em teias de aranha” que estava alojada dentro dela. E algumas vezes essa bola preta se encontrava com a bola preta da sua mãe, o que só as deixava mais infelizes.
Esperei que Annie e sua mãe se reconciliassem em algum momento da história e que voltassem a seu ponto inicial de amor e cumplicidade para conforto do meu coração de mãe. Mas seria isso possível? A história termina com Annie aos 17 anos, então dá para ter uma noção do que poderia ser o final com relação a esse ponto específico.
Ao longo da narrativa temos alguns vislumbres da história da própria mãe de Annie, que ela não quer reproduzir, é claro. Mas seria verdade que “ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”?
Annie John é uma narrativa simples, de pessoas simples vivendo a vida e por isso tão encantadora.