Arsenio Meira 27/11/2013
Sobre o Tempo, o Desalento, o Silêncio e o Desencanto
Ponto Ômega possui algumas imagens e cenas que permanecem pelo desconforto que provocam, o desconforto do silêncio como consolo em um mundo onde as relações são tão áridas quanto o deserto em que a história se desenrola. Há uma elegância seca no narrar que só reforça o sentido de desesperança na trajetória (quase imóvel) dos três personagens centrais.
Richard Elster é um veterano professor que trabalhou para o Pentágono no período da Guerra no Iraque. Dava sentido e coerência à guerra como instrumento e como fim. Ele apresenta, portanto, a dureza e a desilusão dos que ajudam o Poder a exercer-se de forma extrema, e quando se vê, ao fim da vida, parece afastar-se, isola-se para fazer um balanço, e desse isolamento faíscas de dor não são raras.
Jim Finley, o narrador deste romance curto, ou novela, é um jovem documentarista, quer fazer um filme sobre Elster e se hospeda em sua casa, em pleno deserto no interior dos Estados Unidos. Lá recebem a visita da filha de Elster, Jessica, que procura esquecer sua própria inadequação à vida dando apoio a velhos no Upper East Side, em Manhattan.
Diante do espaço imóvel, árido, a relação entre os três parece congelada no tempo. E o tempo é o tema desse romance de DeLillo. O tempo que não transcorre até a reviravolta representada pelo evento trágico e inapreensível. O tempo que custa a passar no deserto ou no filme projetado quadro a quadro, na bela imagem inicial da instalação no museu novaiorquino, que exibe Psicose, de Hitchcock, em câmera lenta, como se o próprio correr do evento sombrio (como no clássico assassinato no chuveiro) pudesse ser decomposto em suas unidades fundamentais.
Há uma poesia torta na imagem de um corpo que sucumbe quadro a quadro ou do sangue que gira em espiral quase imóvel até desparecer ralo abaixo. O personagem Elster, em uma reflexão citada pelo narrador no começo do capítulo 1, tece sua visão da vida de um modo tocante: "A vida verdadeira não pode ser reduzida a palavras ditas ou escritas, por ninguém, nunca. A vida verdadeira ocorre quando estamos sozinhos, pensando, sentindo, perdidos na memória, autoconscientes em pleno devaneio, os momentos submicroscópicos."
Ponto Ômega é um livro de poucos excessos. Somente numa passagem ou outra, DeLillo faz um ou outro esforço excessivo para soar inteligente demais, como em alguns comentários de Finley sobre Elster (os drinks que tomam, a bengala que humaniza). Agora, somente 104 páginas atormentam o leitor. Há, decerto, ou haveria espaço para pelos menos umas 200 páginas a mais. É o único ponto negativo que visualizei. E só.
No mais, é uma prosa de inegável elegância, em que um DeLillo um tanto sombrio e resignado diante do peso e da inexorabilidade do tempo, cria um pequeno universo de silêncio e desencanto.