Sobre o sacrifício

Sobre o sacrifício Marcel Mauss




Resenhas - Sobre o sacrifício


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Ricardo Silas 20/07/2016

Os rituais de sacrifício na história da religião
Por milênios, a relação do ser humano com a natureza impregnou-se de estupefação, mistérios e medo. O barro do qual fomos feitos, se é que merecemos tal metáfora, nos contagiou com o germe da imaginação religiosa, responsável tanto pela formação de tradições sociais quanto pelas explicações supersticiosas a questões científicas. Como a procriação e a sobrevivência eram prioridade nas comunidades primitivas, não se podia esperar que elas, superando a linguagem mitológica, compreendessem cientificamente os fluidos e engrenagens que fazem o Universo funcionar. Assim, personificaram toda paisagem ao redor, desde a imensidão dos mares, a noite estrelada até o firmamento iluminado pelo Sol, convertendo-as em exemplos palpáveis da coexistência entre deuses e mortais.

Em meio a esmagadoras pressões do ambiente selvagem, diferentes povos em diferentes épocas, através de preces e cultos, tentaram aproximar o divino do profano, o humano do sagrado. Não surpreende que nossos ancestrais tenham engendrado suas idiossincrasias para reverenciar o sobrenatural. Uma delas é demonstrada nos rituais de sacrifício, talvez presente em quase todos os primórdios da religião. Especificar quando e onde surgiu esse hábito, no entanto, é tarefa quase impossível, pois muitos registros contêm mais aspectos literários que históricos, por exemplo, os versos homéricos da famosa Ilíada. Essas experiências revelam, ou ao menos sugerem, que há alguma propensão natural do Homo Sapiens para a espiritualidade e a credulidade. Afinal, num contexto de vida bestial, é mais vantajoso sobreviver como um crente a perecer como um cético.

Ao investigarem certos tipos de holocausto na cultura hindu e hebraica, os antropólogos Marcel Mauss e Henri Hubert, no ensaio intitulado Sobre o sacrifício (1899), lançaram uma nova compreensão geral sobre o tema. Quando pensamos num ritual de sacrifício, nossa imaginação quase imediatamente constrói um cenário macabro, horripilante, no qual pentagramas serpenteiam seus traços no solo e se ergue um altar de pedra para esquartejar cordeiros e criancinhas. Se é verdade que algo parecido foi feito, isso certamente pode ser provável. Basta tomar como referência certas culturas tribais ainda existentes, ou, se preferirmos um exemplo “familiar”, o infanticídio que Abraão se dispôs a cometer contra seu filho Isaac, como prova de fé em Deus.

Mas sacrifícios não se limitam apenas a cerimônias tétricas e cruentas. Na antiga Grécia, por exemplo, sacrificavam-se bolos, frutas e outros vegetais em veneração a divindades menos sádicas. Um sacrifício não se define, obrigatoriamente, com os rios de sangue derramados de uma vítima, e sim com a destruição total ou parcial das oferendas prestadas, podendo estas, conforme os interesses e a finalidade do rito, ser animais ou simples vegetais. De acordo com Mauss e Hubert, contudo, a principal demanda que incide sobre os gestos sacrificiais é observada não somente no martírio da vítima, mas sobretudo na alteração do estado moral da pessoa que a sacrifica, ou seja, o sacrificante deve estar lustrado, livre de impurezas, sem gozar dos prazeres mundanos que o cercam. Somente uma relação consagrada entre sacrificante e vítima produz o orgasmo transcendental.

O arquétipo geral dos sacrifícios, formado pelo sacrificante, o lugar, os instrumentos e a peça central da cerimônia, a vítima, é escolhido com máxima cautela: qualquer falta cometida, qualquer descuido que interrompa a constância e o êxtase do momento, pode suscitar os maus espíritos e deixar os deuses zangados. Mauss e Hubert também explicam que a prática sofre alterações a depender dos próprios fins desejados, como pedir perdão, demonstrar gratidão, solicitar abundância em futuras colheitas, alimentar os deuses etc. Um sacrifício de sacralização confere ao sacrificante ou à vítima um caráter sagrado, embora nem sempre divino. Já o sacrifício de expiação, quando necessário, elimina as falhas de um indivíduo ou grupo, tal como era feito quando os sacerdotes judeus selecionavam um bode, despejavam sobre ele os pecados do povo de Israel e, em seguida, soltavam o animal no deserto, condenando-o à morte.

Sob o prisma da civilização atual, essas práticas contrariam os fundamentos de uma vida guiada pela razão e o progresso. Por mais custoso que seja abandonar soluções supersticiosas, concordamos ser melhor cultivar uma postura crítica e racional perante o mundo. Mas cá entre nós: se vivêssemos em meio às sociedades e clãs primitivos, também seríamos tomados de pavor ao ver raios rasgarem o céu feito tecido, ou ocas derrubadas por fortes ventanias; veríamos deuses onde houvesse somente incêndios florestais, vulcões ativos ou proliferação de pragas contra plantações de trigo. Felizmente, alguns conseguem romper as correntes da crendice, enquanto outros, no entanto, seguem agrilhoados em direção à sepultura.

site: http://www.universoracionalista.org/os-rituais-de-sacrificio-na-historia-da-religiao/
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superpatrixxx 16/09/2012

Sacrificando bodes expiatórios e galinhas pretas
A palavra sacrifício significa cumprir um ato ou ofício sagrado. Sendo
assim, o sacrifício é um mecanismo social produtor de sagrado. Uma
pessoa ou animal é culpabilizado pelas mazelas do grupo e, igualmente,
será o doador da salvação depois de oferecido em sacrifício, havendo
uma relação estreita entre sacrifício, sacrificado e sacrificador.
Marcel Mauss e Henri Hubert, num texto datado de 1899, analisam de forma brilhante a complexidade da qual se reveste uma instituição como o sacrifício: a variabilidade de suas manifestações e a grande unidade de sua estrutura são apresentados de forma lapidar neste "Ensaio sobre a Natureza e a Função do Sacrifício” 3.
Após realizar uma rápida análise das contribuições da Escola Inglesa (Tylor, Smith e Frazer) 4, os autores se propõem a analisar o sacrifício a partir de duas religiões - uma monoteísta e outra politeísta - e seus textos sagrados: o ritual védico e o sacrifício bíblico. A partir de casos típicos, os autores buscam algumas conclusões de cunho mais geral. Acredito que, para tanto, foram eles bem sucedidos. A teoria sacrificial de Hubert & Mauss impressiona tanto por sua clareza e humildade, num certo sentido (em sua falta de pretensão), quanto pela profundidade de seus resultados.
De início, os autores chamam a atenção para o fato de que a grande variabilidade entre as práticas sacrificiais podem levar-nos a acreditar que se tratam, por vezes, de fatos díspares e opostos. Entretanto, todas estas práticas possuem um cerne comum, uma unidade, e é através do esquema do sacrifício que os autores pretendem demonstrá-la. Este esquema, basicamente, analisa três momentos do rito: 1) uma entrada; 2) o acontecimento em si, no qual são analisados o sacrificante, o sacrificador, o lugar e os instrumentos; e 3) uma saída. Antes, porém, de observar estes momentos com mais vagar, sigo os autores em sua primeira definição de sacrifício: “o sacrifício é um ato religioso que, pela consagração de uma vítima, modifica o estado da pessoa moral que o executa ou de alguns objetos aos quais ela diz respeito" (op.cit., p. 205).
3 In OEuvres. Les fonctions sociales du sacré. Paris: Les éditions de Minuit, 1968.
4 Mauss & Hubert criticam, especialmente, o fato de estes autores analisarem o sacrifício em sociedades totêmicas, tomando-as como pressuposto universal.
O fundamental a reter nesta fórmula é a ideia de consagração. Um sacrifício sempre implica numa consagração, que modifica o estado das coisas: passa-se do domínio do profano para o do sagrado. O inverso também ocorre; basicamente, o sacrifício é um processo de sacralização e dessacralização de algo. Entretanto, esta consagração pode ser de vários tipos (como a consagração de um rei, por exemplo, que não interfere em nada além da pessoa do rei) sendo que o sacrifício é de um tipo muito particular: seu traço distintivo é que a consagração ultrapassa a coisa consagrada. Neste sentido, este algo consagrado intermedia a relação sacrificante X divindade. A vítima do sacrifício possibilita o contato entre estes dois mundos, o sagrado e o profano. É fundamental que esta vítima seja destruída pela consagração, o que confere um caráter sacrificial mesmo aos rituais "não-sangrantes" como o caso das oferendas vegetais, libações de vinho ou leite. O objeto assim destruído é a vítima sacrificial.
Mauss & Hubert propõem uma primeira classificação para os sacrifícios: os pessoais e os objetivos. Nos primeiros, a personalidade do sacrificador é diretamente atingida; nestes outros, a ação sacrificial recai sobre os objetos que se quer atingir. Segundo os autores, esta definição "supõe, em efeito, a unidade genérica dos sacrifícios" apesar do fato que "as ocasiões de sacrificar são inumeráveis, os efeitos desejados muito diferentes e a multiplicidade de fins implica aquela dos meios" (op.cit., p.206). Voltando ao esquema do sacrifício, vemos que este possui suficiente flexibilidade em perceber a unidade do sistema sacrificial.
Não há rito sacrificial sem uma "entrada": é necessário que o estado natural dos envolvidos no sacrifício seja alterado. Antes deste, nem sacrificante, sacrificador, vítima ou os objetos envolvidos no ritual estão em um grau específico para o contato com o sagrado. Este estado deve ser alterado, transformado religiosamente. O profano é abolido na entrada do sacrifício: todos os ritos de entrada têm esta função.
Com relação ao sacrificante, temos que este pode ser um indivíduo ou o grupo, a coletividade que assiste à cerimônia. A partir do ritual do diksâ (preparação do sacrificante ao sacrifício do soma, da literatura védica), os autores partem para uma uniformidade de elementos comuns a esta etapa: a sacralização do sacrificante é feita através de restrições (não cortar cabelos,
unhas, etc..) e regressões ("volta-se" a um estado inicial, de feto, que irá "renascer" ou transformar-se): "tudo o que toca aos deuses deve ser divino; o sacrificante é obrigado a tornar-se deus ele próprio para estar em estado de agir sobre eles" (op.cit., p. 212. Grifo meu).
Uma série de purificações, consagrações e outros ritos preparam o sacrificante, profano, a executar seu papel no espaço sagrado do sacrifício. Com relação ao sacrificador, a princípio este não deve ser motivo de muitos rituais iniciais: alguns cuidados são suficientes, uma vez que o sacrificador é geralmente algum sacerdote, o que já lhe confere uma proximidade bem maior ao sagrado. Apenas, pelos ritos, aumentando sua santidade, ele facilita e sobrecarrega seu potencial de relação com o sagrado. Isto é necessário para que ele cumpra, por vezes, o papel de intermediário, de substituto da pessoa ou da sociedade em nome da qual ele agirá. Neste sentido, seu papel é o de um bode expiatório, carregando consigo as mazelas do indivíduo ou do grupo.
Com relação aos locais e aos instrumentos, Mauss & Hubert nos falam da imposição de que o sacrifício não ocorra fora de um local, de um cenário "sacralizado": de outra forma, tudo deve ocorrer para um diferenciamento do assassinato. Não se "mata" uma vítima, a morte está fora deste esquema de pensamento. A vítima é sacrificada, e como tal, envolta num ritual coletivo impregnado pelo sagrado: “o local da cena deve ser sagrado; fora de um local santo, a imolação não é senão um assassinato" (op.cit., p. 221).
A construção de locais sagrados, ela mesma, é realizada a partir de uma série de sacrifícios, sejam diários (para sua manutenção) ou expiatórios (para garantir sua pureza, eliminando consecutivas "poluições" que a vítima levaria consigo). A construção, simbólica, dos terreiros que descrevo na dissertação assim o comprova: os locais são definidos enquanto sagrados a partir do momento em que os ritos assim os oficializam.
A vítima, para Mauss & Hubert, é também um espaço sagrado, sua corporificação uma vez que, em torno dela, a irradiação do sagrado é intensa, baixando de grau à medida que desta se distancia. Os cuidados com a vítima são também anteriores ao rito propriamente dito: ela deve ser sadia, ter tal ou qual cor, deve possuir as características necessárias relativas ao fim que se
deseja5. O animal deve ainda passar por uma série de procedimentos a fim de se tornar uma vítima propícia ao sacrifício: alguns ornamentos, embebedamento, banhos, apelações de consentimentos aos deuses etc. Todos estes procedimentos rituais, combinados das mais diversas formas, têm por função qualificar a vítima enquanto sagrada e acentuar o caráter de voluntariedade do sacrifício (sempre lembrar que o sacrifício não é uma morte). O objetivo: liberar algo da vítima que o sacrifício tem por finalidade mesma liberar (sua "alma", seu espírito).
Entretanto, a vítima não pode ser sacralizada a ponto de não reter mais relações com o profano. Este fim é adquirido com uma maior proximidade com o sacrificante, ou seja, a partir de procedimentos que remetam a princípios de magia simpática (o toque das mãos na vítima, por exemplo). A vítima representa, assim, não só os deuses, mas igualmente o sacrificante (e/ou o grupo que ele representa), e seu destino - ou o desenrolar do sacrifício - terá resultados diretos nestes.
É chegado o momento do sacrifício, todos os elementos já estão configurados de maneira adequada para que o ritual tenha início. No exemplo hindu fornecido pelos autores, a vítima deve ser lamentada, e o perdão a ela e seus semelhantes deve ser solicitado por aqueles que executam o ato sacrificial. Rituais de libações e expiações são, portanto, imprescindíveis neste momento. É necessário que a vítima não seja vingável, que o ato sacrílego que se anuncia não traga consequências funestas aos participantes. O autor da morte deve ser punido (no exemplo grego e no hindu; op.cit., p. 234) e rituais de expiação e purificação devem ser realizados.
No momento em que a vítima é sacrificada, seu espírito parte. É o momento solene do rito. Como uma força, ela é ambígua, pode ser benéfica ou danosa. É necessário, portanto, em todos os ritos de morte limitar, canalizar esta força, dirigi-la: "é para isso que servem os ritos" (op.cit., p. 235). Os autores nos chamam a atenção para o fato de que as vítimas animais são geralmente degoladas. O ato sacrificial deve ser exato, preciso, rápido; não
5 A etnografia da pesquisa descreve a especificidade dos animais a serem sacrificados, segundo critérios de cor, espécie, sexo. Os animais são designados diferentemente em relação às entidades as quais o sacrifício se dirige.
pode haver indecisões ou fraquezas: é necessário que as más influências não tenham tempo de aí se imiscuir.
Na sequencia, os cuidados com o sangue que escorre da vítima e com seu corpo são bastante variados. Essencialmente, ambos foram sacralizados, e como tal, não podem entrar em contato impuro com o profano. Nas diversas sociedades, a vítima pode ser despedaçada, consumida, queimada; de qualquer forma, aos seus restos são rendidas homenagens. Basicamente, como o espírito já pertence totalmente ao mundo sagrado, é com relação aos restos da vítima que os efeitos úteis do sacrifício se desenvolverão: "por esta destruição, o ato essencial do sacrifício está executado. A vítima está separada definitivamente do mundo profano; ela está consagrada, ela está sacrificada" (op.cit., p. 236).
A vítima serve ao consumo, tanto divino quanto humano, seja inteira, em partes ou dividida entre ambos. No caso de não ser inteiramente oferecida aos deuses, ocorre a ingestão pelos participantes (os restos servem para comunicar seja ao sacrificante, seja aos objetos do sacrifício, as virtudes religiosas suscitadas pela consagração ritual). É um momento de contrafluxo: tanto o sacrificante, anteriormente, passou de si algo para a vítima pelo contato de suas mãos quanto, agora, pela ingestão da mesma, reterá dela este algo (que pode ser entendido enquanto as "qualidades" novas adquiridas pelo sacrifício). Este basicamente, é o sentido do consumo.
Com relação aos deuses, também estes ingerem da vítima a sua parte, seja apenas a fumaça (como nos rituais gregos) seja assada:
Logo que o deus interveio no sacrifício, ele está obrigado a comer realmente e substancialmente a carne sacrificada; é a "sua carne" (...). A carne cozida, reservada ao deus, lhe é apresentada e está colocada à frente dele. Ele deve consumi-la. (...) (op.cit., p. 239) (grifo meu)
Cuidados ainda são necessários com o que sobra destes restos sacrificiais, uma vez que não podem ser jogados fora, ao azar. Uma série de interdições e procedimentos devem ser respeitados, depositando este material (seja a cinza do animal queimado, sejam os restos não consumidos por deuses
e homens) em um local igualmente consagrado ou, pelo menos, entendido enquanto religioso6.
Os autores chamam a atenção para as analogias entre as atribuições aos deuses e aos homens: aspersão de sangue, contato com o corpo da vítima, comunhão alimentar, simbólica ou concreta. Todos estes ritos são semelhantes uma vez que perseguem o mesmo fim, a comunicação entre os mundos sagrado e profano; mais, além do contato, um entrosamento, "un mélange". A vítima faz a mediação entre as duas instâncias:
Nos dois casos, trata-se de fazer comunicar a força religiosa que as consagrações sucessivas acumularam no objeto sacrificado, de um lado com o domínio do religioso, de outro com o domínio profano ao qual pertence o sacrificante. (op.cit., p. 249)
Mais que possibilitadora, a vítima garante a continuidade entre os dois sistemas, sendo o elo de ligação, o intermediário que possibilita o contato com o mundo sagrado. Resumindo, trata-se de iniciar o processo por uma sacralização que, acumulada, deve ser dirigida tanto para o mundo sagrado quanto para o profano. Mauss & Hubert nos exemplificam com uma curva, que sai de um estado inicial do qual se eleva até atingir um máximo de religiosidade para, em seguida, voltar ao estágio inicial. O processo final é a saída.
Após o sacrifício, os contatos com o sagrado não foram rompidos; é necessário, portanto, uma série de procedimentos a fim de que os envolvidos no ritual possam voltar ao âmbito do profano. Com relação aos objetos e aspectos materiais, são lavados, purificados e depositados em locais sacros. As pessoas envolvidas igualmente passam por procedimentos purificatórios e expiatórios (a fim de livrarem-se de possíveis faltas cometidas durante o sacrifício). A função destes ritos de saída é análoga àqueles de entrada: eles limitam a ação da consagração, restringindo-a somente ao momento do rito. Após este, como antes, os envolvidos no sacrifício são liberados, podendo voltar à vida comum. Descreve-se aqui o movimento final na curva proposta por Mauss & Hubert com relação ao sacrifício; apenas, a curva projetada pela ação
6 Com relação à etnografia, é o que observamos no caso da “Levantação”, etapa final do rito sacrificial nas religiões afro-brasileiras: os restos rituais são depositados em locais consagrados às entidades: campos, matas, praias.
da vítima será sempre a que atingirá o maior grau de religiosidade, a maior altura.
A contribuição destes autores é ainda mais ampla do que este breve resumo possa demonstrar. Um outro ponto fundamental refere-se aos diversos tipos de sacrifícios que podem conformar os diferentes ritos. Após exaustivos exemplos, os autores demonstram que o maior problema com relação às análises geralmente decorre do fato de que, onde vários procedimentos sacrificiais (sejam de expiação, de comunhão, curativos, iniciatórios, de resgate, sacralizantes ou mesmo dessacralizantes, etc.) encontram-se correlacionados em um sacrifício, a análise geralmente escolhe um, denominado como geral nada mais do que uma ênfase que pode estar acontecendo.
Como se vê, as práticas sacrificiais são extremamente variadas, bem como seus objetivos e seus meios. Ora, para tanto, a combinação de elementos atuantes em cada sacrifício vai igualmente demonstrar esta variabilidade. Entretanto, a estrutura proposta pelos autores manter-se-á sempre presente, uma vez que o cerne, a unidade do sistema sacrificial é idêntica. Chega-se assim a uma segunda definição de sacrifício feita pelos autores:
“Este procedimento - o do sacrifício- consiste em estabelecer uma comunicação entre o mundo sagrado e o mundo profano por intermédio de uma vítima, quer dizer, de uma coisa destruída no curso da cerimônia” (op.cit., p. 302).
A comunicação entre os dois mundos, como referida acima, só é possível pela intermediação da vítima, irremediavelmente destruída no curso da cerimônia. Ela o é para que outros não o sejam (o sacrificante, o sacrificador), restando os dois mundos penetrados, unidos ainda que distintos. Para finalizar, como nos dizem Mauss & Hubert:
Ora, este caráter de penetração íntima e de separação, de imanência e de transcendência é, no mais alto grau, distintivo das coisas sociais. Elas também existem ao mesmo tempo, segundo o ponto de vista no qual nos colocamos, dentro e fora
do indivíduo. Compreendemos desde então o que pode ser a função do sacrifício, abstração feita dos símbolos pelas quais o crente exprime a si mesmo. “É uma função social porque o sacrifício se relaciona às coisas sociais” (op.cit., p. 306).

trechos dos artigos "Do Bode Expiatório à Galinha Preta:
contraposições entre as teorias sacrificiais de René Girard e de Marcel Mauss & Henri Hubert"
de Adriane Luísa Rodolpho
Disponível em http://www3.est.edu.br/nepp./revista/003/ano03n1.pdf#page=32
&
Uma leitura sócio-antropológica do sacrifício: Estudo de caso Levítico 6.17-23
de Suely Xavier dos Santos
Disponível em https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/.../2793
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João Curzio 27/06/2012

Não é sacrifício algum
adquirir e ler este livro. Ótima obra muito bem urdida e informativa. Seja para fins acadêmicos ou apenas por lazer, a obra é recomendadíssima.
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