ritita 10/02/2017Não é um livro, É UMA DENÚNCIA.Foi um tal de escrever, anotar, pesquisar, que só quem gosta muito.
Mais que um romance sobre o holocausto ambiental – uma denúncia!
A principio, lendo a contracapa parece um livro que nos leva e luta e à história do seringueiro e ambientalista Chico Mendes; é muito, muito mais.
Uma saga sobre a dilapidação da maior reserva florestal do mundo. Primeiro, por ignorância e necessidade, de onde os seringueiros locais e migrantes tiravam, a duras penas, a subsistência familiar; depois pela brilhantíssima ideia do governo militar, na figura de Garrastazu Médici , de tentar colonizá-la, sem pesquisa e/ou algum conhecimento sobre solo, clima, povos, etc.
A Rodovia Transamazônica era para ser uma estrada de 5.000 quilômetros que atravessava a floresta Amazônica, a partir de João Pessoa no Nordeste até a fronteira com o Peru. Foi um dos mais ambiciosos programas de desenvolvimento de reassentamento econômico já inventados, e um dos maiores fracassos do governo brasileiro em todos os tempos. Os planejadores imaginavam que cada uma teria entre 48 e 64 casas, escola primária, capela ecumênica, armazém, clínica e farmácia. Além disso, cada família teria uma gleba de 100 hectares, na qual teriam de deixar metade do terreno preservado, além de ganhar um salário por seis meses e fácil acesso a empréstimos agrícolas, em troca de se estabelecer ao longo da rodovia e converter a floresta circundante em terras agrícolas. Se tudo desse certo estava previsto que a produção dessas famílias iria abastecer o mercado interno com milhões de toneladas de feijão, arroz e milho, bem como ganhar milhões de dólares através da exportação de café, cacau, pimenta, laranja e outras cultura. Nada disto funcionou; mais que os índios e os ribeirinhos, A FLORESTA NÃO PERMITIU!
No projeto, não houve nenhuma preocupação com a preservação do meio ambiente da Floresta Amazônica.
Além dos fracassos econômicos e sociais, foi absolutamente destuidor o custo ambiental de longo prazo. Após a construção da Rodovia Transamazônica, o desmatamento subiu para níveis nunca antes vistos. Ao longo dos anos, as florestas virgens deram lugar a fazendas de gado, madeireiras e minas de ouro. Durante períodos extremos na década de 1990 e início de 2000, mais de 25.000 quilômetros quadrados de floresta foram desmatados por ano.
Discorre ainda, sobre os primeiros ambientalistas brasileiros, os indianistas Villas Bôas, até a completa devastação de hectares, muitas vezes superiores ao tam. de alguns estados, para a formação de pastos, em terras subsidiadas por posteriores governos a latifundiários do sul e sobre a corrida do ouro.
Resultado desta sanha destruidora que não beneficiou ninguém, já que a floresta é inacessível em seus recônditos? Extinção total de algumas tribos – por assassinatos e doenças - milhares de morte dos povos ribeirinhos que tentaram resistir aos poderosos (seringalistas endinheirados, até políticos da alta cúpula) e perda de uma parte considerável de pura floresta, a troco de nada.
Algumas tribos indígenas, que habitavam, desde os primórdios, uma área equivalente a França (643.801 Km2), após muita luta e muita morte, hoje possuem apenas o equivalente ao tam. da Holanda (41.543 lm2)!
Calcula-se que dentro da floresta amazônica convivem em harmonia mais de 20% de todas as espécies vivas do planeta, sendo 20 mil de vegetais superiores, 1400 de peixes, 300 de mamíferos e 1300 de pássaros, sem falar das dezenas de milhares de espécies de insetos, outros invertebrados e microorganismos.
Somente no último capítulo, Javier dedica-se a Chico Mendes. De seringueiro alfabetizado (raridade), amante e defensor da causa extrativista, Chico, depois de muita luta, passou a ser conhecimento internacionalmente por renomados ecologistas e, principalmente, pelo BID (Banco Interamericano de desenvolvimento e principal fonte de financiamento para projetos de desenvolvimento e redução da pobreza na América Latina), que não tendo resposta do governo brasileiro as suas exigências, congelou os créditos para o desenvolvimento do Acre, desagradando a políticos nacionais e latifundiários, que o viam, não mais como uma pedra no sapato, mas como um verdadeiro perigo. Darly Alves, mandante da morte de Chico, fazia parte destes latifundiários prejudicados.
Crônica da morte anunciada? Sim, e Chico Mendes sabia disto, era apenas questão de tempo e local, já que esta causa já havia feito inúmeras mortes, apenas não noticiadas por terem acontecido à época da ditadura militar.
O livro é um caudal de informação e conhecimento; tão amplo que deveria ser leitura obrigatória, senão no ensino fundamental, nas graduações de antropologia. Desnecessário dizer que a leitura foi imensamente elucidativa e, claro, extremamente prazerosa, afinal é a minha praia.
Se recomendo? A todos os brasileiros interessados em nosso país, apesar do livro ser quase desconhecido na obra do Javier. A primeira edição foi lançada aqui em 1991 e esta reedição é de 2011.
Único senão: a tradutora, Sandra Dolinsky, ter trocado a palavra embate por “empate”, parecidas na morfologia, mas diferentes no significado, o que, a principio confunde o leitor.
Notas da leitora:1) A Amazônia Legal se estende por nove estados brasileiros: Amazonas, Pará,Roraima, Rondônia, Acre, Amapá, Maranhão, Tocantins e parte do Mato Grosso, representando mais de 61 % do Território Nacional), e toda a biodiversidade subjacente.
2) O solo da bacia amazônica consiste principalmente de sedimentos, o que torna o leito da estrada instável e sujeita à inundação durante chuvas fortes. Com a estrada inutilizável por seis meses a cada ano, os colonos não tinham como escoar sua produção. Além disso, a produção das colheitas eram pequenas, uma vez que a camada fértil do solo amazônico é fina, e seus nutrientes se esgotam rapidamente, sem falar que com a falta da floresta, a erosão foi galopante.