none 22/02/2022
O depois que todos ainda aguardamos
Charlotte Delbo saiu do campo de concentração para a ''vida normal'' no dia 23, quando ela chegou deportada da França com mais de duzentas detentas num trem de transporte de animais, Charlotte era militante comunista tornada prisioneira política, e teve suas roupas e bens espoliados, nua, trajando o uniforme de presa do campo de Auschwitz constituiu parte de uma minoria que sobreviveu por 27 meses. Suja, empoeirada, adoecida, sem perspectivas, mas ajudada pelas amigas conseguiu sair da prisão, mas a prisão não saiu dela nem de suas companheiras. Há de se salientar o apoio mútuo que as fez seguir. Delbo demorou para publicar seu testemunho, quando o fez na forma dessa trilogia: Nenhum de nós voltará, Um conhecimento inútil, Medida de nossos dias.
O que distingue ''Auschwitz e depois'' de outras narrativas de detentos de campos de concentração é que Charlotte conta na terceira parte a vida de suas companheiras, Ida, a judia é a única não francesa e portadora da estrela amarela sobrevivente do campo, Jacques o único homem (homens eram normalmente enviados para outros campos, ele foi um dos pouquíssimos prisioneiros políticos sobreviventes). O ''depois''' de cada um varia entre a vida feliz com o retorno aos familiares, a constituição de novas famílias, uma nova vida com trabalhos, dedicações, mas também solidão, distúrbios, doenças, toques, crises nervosas, traumas e evidentemente, loucura. Não há um depois. Um dos detentos, inclusive, sonha que retorna ao campo por livre e espontânea vontade. A parte que eu mais gostei foi a de Poupette: ''Pergunto-me se você vai me compreender: ter tido a sorte de voltar de Auschwitz e depois viver como se nada tivesse acontecido...''