Fayane 14/06/2023
Becos da Memória
Em becos da memória de Conceição Evaristo, a história será construída a partir de relatos, fragmentos de histórias de homens, mulheres e crianças da favela e é a menina Maria-Nova que toma para si a incumbência de escrevê-los de "soltar as vozes, os murmúrios, os silêncios, o grito abafado que existia, que era de cada um e de todos", de narrar a história de seu povo. Povo este, que vive a margem da sociedade, que carecem de visibilidade e são expostas a condições de extrema pobreza mas que, mantém vivo dentro de si, o desejo pela vida e pela felicidade.
O livro aborda a política do desfavelamento que é cruel ao expulsar seus moradores de um lugar que é mais do que apenas "um lugar", é também uma família, é pertencimento. Relega-os a uma condição de ainda mais vulnerabilidade e incerteza, afastando-os de seus trabalhos e escolas, da vida que conheciam. Tio Totó, outra figura apresentada no texto, logo no início da narrativa questiona: "Por que a gente não podia nascer, crescer, multiplicar-se e morrer numa mesma terra, num mesmo lugar" e mais para frente ele complementa "(...) já velho, mudar de novo, num momento em que seu corpo pedia terra".
Maria-Nova faz alude, ainda, sobre a relação entre senzala e favela, entre o passado escravocrata e as desigualdades vividas no presente: "Duas ideias, duas realidades, imagens colocadas machucavam-lhe o peito. Senzala-Favela" e ainda, "Tinha para contar sobre uma senzala de que, hoje, seus moradores não estavam libertos, pois não tinham condições de vida.".
Em resumo, este é um livro que provoca o leitor à reflexão sobre nossa sociedade e como ela é construída. O fato de o livro ser concebido na forma de breves histórias, que nem sempre seguem uma linearidade temporal mas que, de alguma forma se conectam, trouxe ao meu imaginário a visão dos becos e vielas, dos "becos da memória".