Marker 21/09/2017Para quebrar os tantos anos protelando a leitura de Truman Capote, resolvi evitar a tijolada que deve ser A Sangue Frio, e começar por aquela que talvez seja sua novela mais querida pelo público em geral. Acreditava que já conhecia pelo menos algum aspecto da história por conta do famoso filme estrelado por Audrey Hepburn, mas o fato é que aquela é apenas uma adaptação bastante vaga. Diferente daquela versão, 'Breakfast at Tiffany's' passa bastante longe daquilo que se compreenderia genericamente como uma comédia romântica, mesmo porque o romance está ali de maneira discreta, platônica, quase religiosa de certa forma, e porque a escrita de Capote, quando não pretendida para teatro ou cinema, como ele fez algumas vezes, não se traduz em outra mídia que não em literatura.
Poucas vezes li alguém que, tendo um claro cuidado de ser simples e singelo naquilo que escreve, consegue ter força, ser cortante, falar de uma adolescente que se casa com um homem muito mais velho por não ter para onde ir, ou da vida vazia e pouco próspera de um escritor aspirante. Não é só a incrível construção de Holly como uma personagem que deixa o lugar de "bonequinha" para se mostrar cada vez mais complexa e difícil de se depreender, mas a intensa observação do cotidiano, e dos lampejos de coitidano, e até mesmo de certo sentimento novaiorquino, que Capote constrói tão bem, que demonstram o porque do texto se manter firme no imaginário durante tantos anos.
Dito isso, importante ressaltar que este volume da Vintage Classics, assim como outras edições, vem com mais três contos do escritor e o último deles, "A Christmas Memory", é provavelmente uma das coisas mais doloridas e emocionalmente violentas que já li, em especial porque parece se tratar de um relato com doses autobiográficas. Chega a ofuscar o texto principal. Enfim, goste ou não goste do filme, é uma leitura proveitosa.