hugaoo 19/03/2019
Perdas Necessárias, Ganhos Subsquentes
Definitivamente, esse é o único livro que eu acho que mereça, verdadeiramente, cinco estrelas. Não apenas porque a autora é capaz de trazer as teorias psicanalíticas e psicológicas, abordando resultados e estatísticas de estudos sérios, como principalmente porque, leitora assídua e apaixonada por literatura, Judith Viorst lança mão de grandes nomes literários, tais como Chateaubriand, Simone de Beauvoir, C.W. Lewis, entre outros, para exemplificar sentimentos e revelar, em uma autobiografia justa e honesta, esclarecimentos e consolo que podemos obter nas realidades ficcionais que permeiam sua obra.
Desafiei a mim mesmo na produção de uma resenha crítica que beirasse o automatismo psíquico porque, embora tenha sido, de longe O MELHOR LIVRO QUE JÁ LI EM VIDA, não sei se serei capaz de escrever uma resenha digna do mesmo. Por isso, como estratégia literária, farei uso dessa desculpa criativa.
As perdas necessárias apresentadas pela autora são narradas de maneira cronológica, começando com a gestação, indo para a grande primeira perda (desligamento físico com a mãe) - afinal, ao contrário do adágio popular, nascemos unidos - passando pela construção da personalidade - devendo-se observar tanto as impressões internas quanto os acontecimentos externo -, indo ao inexóravel fim da infância e abandono da megalomania ilusória de poder ser o que se quiser ser, adentrando nos primeiros anos da idade adulta.
Particularmente, achei esclarecedor o capítulo sobre a rivalidade fraternal e a repetição de crenças e autoimagens adquiridas pelo processo de desidentificação (mecanismo de defesa utilizado para dissociar a imagem pessoal da imagem do(a) irmão(ã), a fim de tornar a convivência tolerável, evitando competições dolorosas) no decorrer da vida adulta, quando não trabalhadas. A autora fala da sublimação da difícil e ambivalente relação de amor e competitividade/ódio com sua irmã por meio da produção de uma ação sociavelmente aceita como repelente do impulso indesejável de destruir sua própria irmã, sendo aquela a produção do livro em comento.
A perda da ilusão das relações perfeitas entre amigos (modelo mítico de amizade absoluta) também é denunciada, esclarecendo a chocante verdade de que invejamos, competimos e, por vezes, odiamos, nossos próprios amigos. Isso é justificado porque humanos são imperfeitos, logo, relações humanas, necessariamente, também o serão. Portanto, para que possamos ter amizades sinceras, é preciso reconhecer a ambivalência presente tanto em nós quanto no outro.
Muitas outras são as perdas necessárias e ganhos consequentes trazidas pela autora, a saber: perda dos pais, morte de entes queridos, abandono de um amor, rejeição e, finalmente, a desintegração final: a velhice e a morte. A perda de nós mesmos. De quem fomos, da imagem que tínhamos do que éramos e o enfrentamento da nossa própria mortalidade.
PASSAGENS DE DESTAQUE:
"A velhice é a paródia da vida", Simone de Beauvoir.
"Vivemos de perder e abandonar, e de desistir".
"Crescer significa adquirir a sabedoria e a habilidade para conseguir o que se deseja, dentro dos limites impostos pela realidade". - (Sobre a renúncia das infinitas possibilidades)
"Se nos abraçarmos, antes de darmos pela coisa estaremos tirando a roupa e um chupando o caralho do outro". (Risos, esse é o relato de um homem heterossexual quando evitou dar um abraço em seu amigo de acampamento com medo da intimidade que aquilo poderia provocar).
"A amizade pode contribuir - muitas vezes de modo crucial - com aquilo que falta ao amor dos amantes."
"A amizade fornece o cenário para formas de prazer e de crescimento pessoal que talvez não possam ser encontradas nas praias mais selvagens do amor".
"O crescimento exige relacionamentos".
"Às vezes, odiamos nosso companheiro ou companheira por não satisfazer nossos desejos e impossíveis".
"O senso de identidade deriva exatamente da determinação de um certo papel no sistema familiar".