Mateus 20/01/2022
Ópera dos Mortos, o lado civilizado versus animal.
Em Ópera dos Mortos, Autran Dourado consegue, de uma forma primorosa, mesclar uma ótima história, com uma escrita simples,por vezes parece cinematográfica, mas ao mesmo tempo potente.
Fica perceptível ao leitor que, além do conteúdo da obra ser riquíssimo, o autor demonstra muito zelo a forma de transmitir o mesmo, assim como faziam os artistas barrocos.
O título não poderia fazer mais sentido, já que os acontecimentos do livro por vezes, se assemelham a óperas dramáticas.
O leitor acompanha a história de Rosalina, uma jovem mulher, que vive em um casarão no interior de Minas gerais, reclusa e distante do povo da cidade, por uma mágoa herdade de seu pai.
Aliás, ela é a descendente de uma família extremamente poderosa naquela região, que teve o início de sua grande influência com Lucas Procópio, avô de Rosalina.
Lucas Procópio era um homem extramente violento, e que se deixava levar pelo seu lado animal. A população da cidade alimentava por ele respeito, mas este, vindo do medo de sua figura. Aliás, Lucas Procópio parece a forma de entidade durante toda a obra.
Depois da morte de Lucas Procópio, seu filho assume o papel de patriarca da família. O nome dele, João Capistrano Honório Cota, um homem respeitável, cavalheiro, que nada parecia com seu pai. O povo da cidade o respespeitava, mas diferente do respeito dado para Lucas Procópio, o de João Capistrano era autêntico.
Porém, coisas acontecem, e João Capistrano se afasta do convívio da cidade. O que posso dizer é que ele virou um homem político, e essa mudança foi uma das causas para sua queda.
E a única filha de João, Rosalina, que só tem contato com Quiquina, uma doméstica que é muda, e que tem uma relação maternal com Rosalina, e Emanuel, um antigo amor de Rosalina, filho de um amigo de João Capistrano, Quincas Ciríaco.
O tempo demora a passar no casarão, tudo é muito monótono, e isso é representado pelos relógios parados nas paredes do casarão.
Aliás, a figura do casarão demonstra um refinamento estético muito apurado de Autran Dourado, que consegue contruir a personalidade das personagens pelo estilo de construção do casarão. A parte contruida por Lucas Procópio, rústica, campestre. Já a parte construída por João Capistrano, não querendo retirar a parte construída pelo pai, tem um quê de elegante e refinado. Já Rosalina não constrói nada, demonstrando um certo ócio e inatividade por parte dela.
Mas a rotina pacata do casarão muda, com a chegada de um homem vindo do nordeste, com um passado obscura, chamado José Feliciano. Com a chegada desse homem, Rosalina entra em conflito, entre o lado civilizado de seu pai, e o lado bruto e animal de seu avô . Na verdade, esse é um conflito que permeia toda a obra, o lado civilizado versus o animal do ser humano.
Essa é a história da decadência desta família nesta cidade, de como o meio pode influenciar o indivíduo, no caso Rosalina com o passado de sua família, e a influência da figura dos mortos, como Lucas Procópio e João Capistrano, assombrando a memória tanto do povo, mas principalmente dos moradores do casarão, que por suas escolhas, não conseguem ser felizes.