marypaixao 30/08/2012Resenha do Muito Pouco Crítica - @blog_MPCAnastasia Steele tem 21/22 anos, estuda literatura, é ingênua, virgem, se diz desastrada e tem inveja da melhor amiga e companheira de quarto porque ela “é bonita até resfriada”. Christian Grey tem 27 anos, é um bem sucedido empresário, bonito, inteligente, controlador e cheio de segredos. Os dois se conhecem por meio de uma entrevista que Anastasia faz com Christian, e de imediato eles se sentem atraídos um pelo outro. Ao começarem uma relação, Anastasia é apresentada a um dos segredos de Christian: sua preferência pelo sadomasoquismo.
Divisor de opiniões, Fifty Shades of Grey - Cinquenta Tons de Cinza, na versão brasileira que será lançada pela Intrínseca – começou como uma fanfic de Crepúsculo e se tornou um dos maiores sucessos literários do momento. A única razão que vejo pra isso é o tremendo marketing que veio de Crepúsculo. E, provavelmente, o grande estigma de curiosidade sobre sexo. Não tenho nada contra Crepúsculo e muito menos contra sexo; o grande problema desse livro é que a autora não conseguiu aprimorar sua escrita de fanfic para o nível de romance e também não conseguiu se decidir entre um público: nem serve como livro young adult nem serve como livro adulto.
Anastasia é a personagem mais irritantemente ingênua que eu já conheci. E nonsense ingênua, ainda mais. Primeiro, ela é uma garota ingenuamente virgem aos 21 anos de idade. Ela não é apenas virgem, ela é ingênua sobre isso. Ela nunca se masturbou. Ela só teve um namorado (ou dois, não lembro). Ela não tem nenhuma experiência sexual de qualquer tipo. Segundo, ela é uma garota ingenuamente virgem que é apresentada ao sadomasoquismo e se submete a isso só por causa do Christian. Ok, rola curiosidade, ela até tenta ficar confusa, mas a única confusão que ela tem realmente é que ela se apaixona por ele em menos de uma semana e aceita tudo dele por causa disso, mas não consegue entender que, bem, não é assim que as coisas acontecem. Ela fala e age ingenua e infantilmente todas as vezes, e o que ela pensa é ainda pior. Ela não se vê submissa (mas entra com tudo numa relação sadomasoquista), não consegue lidar realmente com a personalidade e as preferências de Christian e tem uma inner goddess (algo como deusa interna), uma “consciência esperta” e extremamente chata. Todo o “drama” se resume às altas e infantis expectativas dela.
Como a narrativa é da Anastasia (e sua chata inner goddess), não dá pra realmente conhecer o Christian. Principalmente porque a maioria da perspectiva da Anastasia sobre ele é puramente física. Mas também porque ele faz o tipo misterioso, cheio de segredos. O problema é que ele é bem exagerado nesse aspecto. Assim como não dá pra saber porque diabos ele se interessa pela Anastasia, também não dá pra perceber porque ela se interessa por ele (além do fato de ele ser incrivelmente lindo). São pouquíssimas as vezes em que algo mais sobre ele aparece, e a visão infantilizada da Anastasia não ajuda. Algumas partes sobre ele fazem o livro ser quase bom (não chega a tanto). São pequenos vislumbres do quanto a história seria melhor se fosse um livro mais adulto, mais desenvolvido.
As partes de sexo não são exatamente boas, mas não são ruins. Acho que o que mais influencia (negativamente) nelas é o fato de ser uma relação sadomasoquista entre um cara superexperiente e uma garota que nem conhece o próprio corpo. Isso também influencia o direcionamento do livro: está sendo vendido como literatura erótica, mas quantas adolescentes – virgens e ingênuas como a Anastasia – leram e lerão o livro pensando “ah, era uma fanfic de Crepúsculo, deve ser lindo!” e acharam e acharão o relacionamento e o comportamento dos personagens algo normal? Não digo isso por causa do sadomasoquismo (já que isso vai das escolhas de cada um), mas sim por causa do envolvimento “romântico” entre eles, do fato da Anastasia se submeter a ele de forma tão profunda e rápida, e ele não apresentar nenhum motivo concreto pra isso, a não ser o quê?, atração física, personalidade enigmática (isso atrai alguém?), arrogância extrema (oi?).