Bringel 28/07/2016
Cada etapa da vida tem as suas qualidades próprias.
Autor: Cícero, Marco Túlio, 103 – 43 A.C. – Tradução de Paulo Neves.
Edição L&PM, 2002, Porto Alegre p. 5 a 66 – Obra seguida de “A Amizade”. Saber Envelhecer – até a página 65;
O ensaio desenvolve o tema por meio de um diálogo entre Catão, sábio com grande
capacidade de suportar a velhice, de um lado, e do outro, como ouvintes, Lélio e Cipião
Passagens e pensamentos merecedores de destaque:
1 – “Os que não obtêm dentro de si os recursos necessários para viver na felicidade acharão execráveis todas as idades da vida. Mas todo aquele que sabe tirar de si próprio o essencial não poderia julgar ruins as necessidades da natureza. E a velhice, seguramente, faz parte delas. Todos os homens desejam alcançá-la, mas, ao ficarem velhos, se lamentam. Eis ai a inconsequência da estupidez” (p. 9);
2 – “Somos sábios se seguimos a natureza como um deus, curvando-nos às suas coerções. Ela é o melhor dos guias” (p. 10);
3 – “As melhores armas para a velhice são o conhecimento e a prática das virtudes. Cultivados em qualquer idade, eles dão frutos soberbos no término de uma existência bem vivida” (f. 12);
4 – “Sem dúvida alguma, a irreflexão é própria da idade em flor, e a sabedoria, da maturidade” ( f. 20);
5 –“Os velhos se lembram sempre, daquilo que os interessa: promessas sob caução, identidade de seus devedores e credores, etc.” (p. 21)
6 – Em torno da memória dos velhos, diz Cícero, que eles a conservam “tanto melhor quanto permanecem intelectualmente ativos”, esclarecendo que um dos motivos do declínio da memória está no fato de não a cultivarmos, ou se o velho é desprovido de vivacidade de espírito. E cita exemplos de homens que produziram muito a despeito de velhos: Na velhice, Sócrates escreveu várias tragédias, sendo que uma delas dada à leitura para um juiz que presidira processo que lhe abrira os filhos, querendo-lhe interditar, oportunidade em que Sócrates perguntara ao magistrado se poderia chamar de imbecil o homem que acabara de escrever a tragédia “Edipo em Colona”(p.21 e 22);
7 – “A vida segue um curso preciso e a natureza dota cada idade de qualidades próprias” (p. 29);
8 – “O exercício físico e a temperança permitem conservar até na velhice um pouco da resistência de outrora. E se o corpo se afadiga sob o peso dos exercícios, o espírito se alivia exercitando-se “ (. 30 e 31);
(obs: a propósito, Cícero diz que, seguindo o método dos pitagóricos, toda noite procurava lembrar-se de tudo o que fizera, dissera e ouvira durante o dia – v. p. 32).
9 – “A velhice só é honrada na medida em que resiste, afirma seu direito, não deixa ninguém roubar-lhe seu poder e conserva sua ascendência sobre os familiares até o último suspiro” (p. 32)
10 – “A volúpia corrompe o julgamento, perturba a razão, turva os olhos do espírito, e nada tem a ver com a virtude” – p. 35 – a respeito, na p. anterior, diz Cícero que “Se a inteligência constitui a mais bela dádiva feita ao homem pela natureza – ou pelos deuses -, o instinto sexual é seu pior inimigo. Onde reina a devassidão, obviamente não há lugar para a temperança; lá onde o prazer triunfa, a virtude não poderia sobreviver”.
11 – “Não se sofre por ser privado daquilo de que não se tem saudades” ; “Sem desejo não há frustração, logo, é preferível não desejar”. A propósito, Cícero conta que ao ser indagado se ainda fazia amor, teria respondido Sófocles: “Os deuses me preservam disso! É com o maior prazer que me subtraí a essa tirania, como quem se livra de um mestre grosseiro e exaltado” (p. 39 e 40):
12 – “O saber se vale das competências acumuladas e se enriquece à medida que envelhecemos” – p. 42 – isso justificaria, segundo Cícero, o que também me parece correto, a afirmativa de Sólon, no verso em o que diz aprovetiar sua velhice apara adquirir novos conhecimentos.
13 – “Assim como o vinho, o caráter não azeda necessáriamente com a idade” (p. 52)
14 – “Não é insensato, quando o caminho a percorrer diminui, querer aumentar seu viático?” (p. 52);
15 – “que pode haver de mais insano que ter por certo o que não o é e por verdadeiro o que é falso? (p. 53)
16 – “O tempo perdido jamais retorna e ninguém conhece o futuro. Contentemo-nos com o tempo que nos é dado a viver, seja qual for!” (p. 54).
17 - “A primavera, em suma, representa a adolescência e a promessa de seus frutos; as outras estações são as da colheita, da seara” (p. 55);
18 – “Tudo o que é conforme à natureza deve se considerar como bom. Que há de mais natural para um velho que a perspectiva de morrer? Quando a morte golpeia a juventude, a natureza resiste e se rebela. Assim como a morte de um adolescente me faz pensar numa chama viva apagada sob um jato d’água, a de um velho se assemelha a um fogo que suavemente se extingue. Os frutos verdes devem ser arrancados à força da árvore que os carrega; quando estão maduros, ao contrário, eles caem naturalmente. Do mesmo modo, a vida é arrancada à força aos adolescentes, enquanto deixa aos poucos os velhos quando chega sua hora” (p. 55);
19 – “Os velhos não devem nem se apegar desesperadamente nem renunciar sem razão ao pouco de vida que lhes resta” (p. 56);
20 - Cícero acreditava em uma vida posterior a do homem na terra. O corpo desaparece, não, porém, a alma, que ao deixá-lo, necessariamente terá um destino mais elevado. Essa a razão que o levara e a outros sábios a procurar vivem bem. A seguinte reflexão sobre o tema é muito válida:
“Acaso crês – eu me envio flores, é um reflexo de velho – que teria passado meus dias e minhas noites atarefado, em tempo de guerra como em tempo de paz, se julgasse que minha glória se deteria com minha vida? Não teria sido melhor, nesse caso, deixar-me docemente viver, sem esforço nem trabalho? Ignoro a razão, mas minha desperta sempre pressagiou o futuro, como se tivesse adivinhado que, uma vez deixada a vida, ela finalmente viveria. Não, se fosse verdade que as almas não são imortais, os grandes homens não desdobrariam tantos esforços para alcançar a glória e a imortalidade"”(p. 62-63)
21 – “”Deixo a vida não como quem sai de sua casa mas como quem sai de um albergue onde foi recebido. A natureza, com efeito, nos oferece uma pousada provisória e não um domicílio” (p. 64)