Os Tres Estigmas de Palmer Eldritch

Os Tres Estigmas de Palmer Eldritch Philip K. Dick




Resenhas - Os Três Estigmas de Palmer Eldritch


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Gustavo Kamenach 23/08/2020

Na fronteira entre a metafísica e a ficção científica
Lendo PKD em ordem cronológica de publicação, nesse livro temos já o vislumbre da temática que o tornaria célebre no fim de sua carreira, a questão da religiosidade mesclada com ficção científica e conceitos tecnológicos. Também vemos aqui a realidade duvidosa que permeia a obra de Dick, não há certezas de qual é a real situação das personagens em diversos momentos da história. O uso de drogas pelos personagens do livro remete à própria vida do autor, tão conturbada quanto a dos colonos de Marte. É um livro envolvente, o enredo prende pela própria ação e quando começam as divagações e digressões fica cada vez mais genial, culminando em um final blow mind! Favoritado e com certeza que precisarei revisitá-lo futuramente!
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Morgado 21/05/2020

"Realidade é aquilo que, mesmo quando se deixa de acreditar em sua existência, não desaparece"
Os Três Estigmas de Palmer Eldritch é sem dúvida uma das melhores publicações de Philip K. Dick, mesmo sendo difícil encontrar uma que não seja excelente, assim como diversos autores de ficção científica Philip possui um tema central em suas obras que está diretamente relacionada com suas experiências de vida, experiências que Philip consegue com maestria transmitir ao leitor, Os Três Estigmas de Palmer Eldritch é mais um dos retratos ficcionais sobre a pergunta que perseguiu Philip por toda sua vida, da experiência do autor com drogas psicodélicas ás suas psicoses, o que é realidade?
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Davenir - Diário de Anarres 15/01/2019

Um clássico do autor questionando a existência da realidade
"Os três estigmas de Palmer Eldrich" é um dos romances emblemáticos de Philip K. Dick em sua fase psicodélica, mas basta ler um dos livros para saber que PKD é bem mais que o mero lado recreativo da química mas sim uma porta de entrada para as reflexões filosóficas que permeiam toda sua obra.

A estória se passa num futuro (2016, que já é passado para nós) onde a Terra está superaquecida e superpopulosa, onde os ricos podem desfrutar de um paraíso tropical na Antártida. A exploração espacial já rendeu diversas colônias espalhadas no sistema Solar, onde a vida é difícil e o recrutamento é compulsório. Uma da saídas dos colonos é o consumo de Can-D, uma droga alucinógena que "traduz" ambientes em miniatura, onde os usuários vivem uma vida de consumo no melhor estilo "American Way of Life" no corpo de Barbie de Pat Insolente. Esse mercado é explorado pelo traficante Leo Bulero que vende a droga para os colonos sob vistas grossas da ONU. A estória começa com a chegada de Palmer Eldrich e uma nova droga que ameaça o império de Bulero, a Chew-Z. Bulero recorre a seu funcionário, Barney Mayerson, um precog* que trabalha como consultor de moda para os ambientes em miniatura, utilizados pelos usuários de Can-D.

Ao longo da estória acompanhamos duas linhas narrativas: a primeira é a de Barney Mayerson vendo sua carreira profissional, pela qual deixou a esposa, ruir em meio a nova concorrência com a chegada de Eldrich. Dick consegue dar sensibilidade ao drama de Barney em meio a uma trama de intrigas enquanto o personagem, aparentemente bem estabelecido, busca seu lugar no mundo. A outra linha narrativa é o embate entre Leo Bulero com Eldrich, onde vemos dois tipos de "vilão", um o gangster tradicional, ao qual é integrado a sociedade e outro, na forma de Eldrich, um mal alienigena e estranho. Dick retrata em Eldrich um tipo de deus cruel ou, ao menos, muito distante do deus cristão de amor ou severidade. Este poder das drogas, seja a fuga pela Can-D ou a experiência transcendental da Chew-Z, se conecta com seu uso religioso mesmo que seus usuários não busquem ativamente com este sentido. Isso aparece na forma que se usa a droga Can-D: masca-se o alucinógeno observando dois bonecos do tipo Barbie e Ken, que se tornam avatares para a viagem a um mundo consumista que sequer existe mais na Terra. Algo relacionável a alucinação coletiva digital que Gibson se referiria, décadas depois. Isso acontece, pois, o autor trabalha muito com a intuição ao construir o seu mundo. O calor insuportável da Terra está mais ligado ao medo/fuga/covardia da sociedade que com o Aquecimento Global. Tudo isso em meio a constantes questionamentos do que é realidade e ironias escrachadas como a da "terapia de evolução", nas quais os habitantes da Terra pagam um bom dinheiro para serem melhores e capazes. Algo mais ligado ao status do que realmente uma evolução num sentido mais profundo.

O constante questionamento do que é a realidade, uma marca do autor, aparece com toda a força nessa estória. Personagens que se descobrem fantasmas de outras realidades possíveis, avatares e noções de realidade que brincam com a barreira entre o sagrado e o profano conduzem as jornadas dos personagens, principalmente a de Mayerson. A experiência de Can-D, algo intuitivamente parecido com a internet, é elevada com a Chew-Z. O uso dessa droga traz a experiência de ser parte de algo maior ou, em outras palavras, de ser a ilusão na mente de outro. Recomendo como leitura para iniciados na obra do autor. Para quem tem a mente fechada em relação ao uso de drogas eu não recomendo o leitor para o livro.

*Precogs são paranormais com a habilidade de ver o futuro. Eles enxergam todas as possibilidades de futuro e identificam as que tem maior probabilidade de acontecer. Eles são bastante recorrentes nas estórias de Philip K. Dick, apesar de serem mais lembrados no conto "Relatório de Minorias", que rendeu o filme Minority Report.

site: http://wilburdcontos.blogspot.com/2017/12/resenha-69-os-tres-estigmas-de-palmer.html
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Luiz Miranda 15/04/2018

Bad Trip
Um mestre em momento inspirado. Os 3 Estigmas de Palmer Eldritch é ambicioso e bizarro. Não espere uma história convencional: trata das consequências da chegada de uma nova droga ao sistema solar. A medida que a droga é experimentada pelos personagens, a percepção do que é real entra em parafuso.

"Deus promete a vida eterna; nós cumprimos a promessa". É o slogan da tal nova droga, Chew-Z.

PKD derruba as paredes da realidade e não dá trégua ao leitor, que se desdobra pra separar o que é real da ilusão. Não é um livro polido, perfeito: soluções simplórias e diálogos apressados também dão as caras aqui, só não conseguem tirar o brilho deste intrigante e admirável voo de imaginação. Merece sua atenção.
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Paulo 14/07/2017

Esta é uma obra que faz duras críticas sociais. O autor é conhecido por fornecer elementos fantásticos e de alta tecnologia para mascarar perguntas simples como: o que é realidade?, o que significa fé?

Barney está tentando encontrar seu lugar no mundo após perder a esposa por sua própria culpa. Leo busca acabar com uma possível concorrência apresentada na forma do misterioso retorno de Palmer Eldritch, um homem que foi explorar os confins da galáxia e entrou em contato com outras civilizações.

Primeiramente é bom salientar a proximidade que esta obra tem de Minority Report (filme baseado em outro conto de Philip K. Dick). O tempo todo o leitor acredita que está lidando com o real até o momento em que o autor dá uma rasteira e lhe mostra as alucinações e sonhos vividos pelos personagens. A droga Chew-Z apresenta uma realidade fluida na qual o leitor se sente inseguro sobre o que está sendo apresentado pelo autor. Frequentemente nos perguntamos durante o desenrolar da história: “Isso está acontecendo mesmo?”. Esta é a mágica de Philip K. Dick que veremos em outros livros de sua extensa produção. Aqui não é o narrador que não é confiável; é a própria ambientação apresentando a falta de confiabilidade.

Questões de fé também são discutidas ao longo da história. Em um primeiro momento os personagens tentam descobrir se Palmer Eldritch retornou como um deus. Isso dado o controle sobre a vida e a morte e a manipulação da realidade exercida por Palmer. Seriam essas qualidades divinas? Palmer Eldritch, através do Chew-Z, consegue perpetuar sua persona a todos os lugares. Barney menciona até o Gênesis, primeiro livro que compõe a Bíblia católica, ao dizer que nos tornaríamos filhos de Eldritch já que possuiríamos fragmentos de sua consciência. Seríamos moldados à imagem e semelhança de Eldritch se os seus planos tivessem êxito.

A fé também é questionada. Barney, sendo um homem prático, vê todos os seus dogmas sendo destruídos progressivamente pela influência do Chew-Z. O personagem não sabe aonde alicerçar sua noção do que é ou não real. Sua noção de ciência também é destruída pelo que Palmer manipula como real. No fim da história Barney conhece Anne que é capaz de realizar uma questão teológica usando os escritos de Paulo de Tarso, um dos apóstolos do Novo Testamento bíblico. Anne faz Barney repensar o seu lugar no mundo. Sendo interpretativo, Anne apresenta uma noção flexível do que pode ser considerado o “divino”. O “divino” é aquilo que fornece força e objetivo para nossas vidas. Não importa de que maneira nós pintemos ou mascaremos essa representação. Só precisa servir como uma influência positiva para nossas vidas.

Os personagens foram muito bem criados e são usados satisfatoriamente na história. Mesmo os colonos de Marte ou a amante de Barney cumprem um objetivo na história. Não são apenas jogados como refugo. O autor cumpre bem o objetivo proposto no início da história: fazer uma crítica social.


site: www.ficcoeshumanas.com
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Sandro 09/11/2016

"O impuro e o sagrado são confundidos pelas mentes primitivas"
Esse é talvez o livro mais caótico de PKD. Os embates entre Leo Bulero e Palmer Eldritch pelo domínio do tráfico de drogas em Marte são ambientados em meio a muitas alucinações e distorções de realidade, a ponto de deixar o proprio leitor confuso.
No meio dessa bagunça toda, se destacam a megalomania e narcisismo de Bulero (se achando o salvador da raça humana), a culpa de Bayer por ter abandonado a mulher e traído o chefe (disposto a expiá-la em uma missão quase suicida) e a ambição da precog Roni.
A grande questão do livro é quem (ou o que é) Palmer Eldritch e está aberta a várias interpretações.
Eu tenho muito carinho pelas obras de PKD e esse é o último livro que faltava pra eu ler da leva lançada recentemente pela Editora Aleph, então confesso que me sinto meio triste e meio órfão nesse exato momento.
Sandro 09/11/2016minha estante
Embates* são* ambientados*
Por isso que odeio escrever resenha pelo celular :(




Orlando 15/04/2016

O LIVRO É: OS TRÊS ESTIGMAS DE PALMER ELDRITCH DE PHILIP K. DICK
O mega-empresário Palmer Eldrithc viajou ao sistema Proxima, foi uma longa viagem e seu retorno foi tumultuado. Leo Bulero, também um mega-empresário, foi o primeiro a se alarmar com o retorno de Palmer, sua empresa, a Ambientes P.I, seria a primeira a sofrer com o retorno do respeitado rival. Seus consultores de Pré-Moda já estão em alerta, os precogs (de precognitivos) Barney Meyerson e sua nova namorada Roni Fugate, seres humanos dotados do dom de prever possíveis futuros, viram duas situações envolvendo futuros em que Bulero assassina Palmer e um futuro em que Meyerson, ao tentar salvar Bulero de Palmer, acaba morto

Dois homens extremante poderosos em rota de colisão, duas drogas capazes de traduzir os seres humanos para outras realidades disputando mercado, colônias de terra-formação em Marte, uma conspiração para dominar a tudo e todos, decisões tomadas no calor do momento e a percepção do real posta à prova Philip K. Dick entregou mais uma vez ao seu leitor uma narrativa rápida, instigante e cheia de dúvidas que atormentam seus personagens e a nós, seus fãs.

Philip K. Dick, o homem que duvidou de toda Realidade

Philip K. Dick (PKD), um dos mais respeitados e renomados escritores de Sci-fi do século XX, possui em sua cota de grandes livros obras como O Homem do Castelo Alto, Androides Sonham com Ovelhas Elétricas? (que inspirou o cultuado filme Blade Runner), Valis, Ubik e muitos outros tesouros cuja a tônica, em sua quase totalidade, é pôr em xeque a percepção do que convencionamos chamar de Realidade. Dick não fez diferente com Os Três Estigmas de Palmer Eldritch.

Magistralmente o autor convida seu leitor a mergulhar em uma viagem a um futuro não tão distante, mas de posição imprecisa como todas as suas obras, onde o planeta, super-aquecido e super-populoso, envia de forma quase obrigatória através de uma convocação da ONU, terráqueos para outros planetas do sistema solar, sobretudo Marte, onde se pretende estabelecer uma colônia permanente para a futura migração massiva de humanos quando a vida na Terra atingir níveis proibitivos.

Precursor de alguns dos muitos conceitos do Cyberpunk, PKD criou um mundo, tal qual o de Blade Runner, em sucatas, poluído, à beira do abismo social para nós como espécie segmentada e no limite das temperaturas escaldantes quando o Sol está a pino ao meio dia A guerra entre empresas, comum em obras cyberpunks, já estava em evidência nas obras de Dick que antecederam Neuromancer, só para pontuar a habilidade de precog do autor.

É comum encontrar nas obras de Dick diversos questionamentos filosóficos e religiosas, bem como a convergência de diversos conceitos religiosas diferentes (gnose, cristianismo, budismo, transcendentalidade, transubstanciação etc) ao lado de conceitos científicos (reais ou fictícios) como ciborguização, realidades paralelas, projeções temporais e previsões de probabilidades de futuros, tudo isso regado ao uso de psicoativos (drogas, medicamentos, alucinógenos etc) capazes de por em dúvida a percepção de seus personagens e, no fim das contas, a percepção do leitor sobre a história ali escrita PDK questionou a realidade e ela ficou em dúvida sobre si mesma.

De certo modo Os Três Estigmas de Palmer Eldritch parece ser um livro de convergência da quase totalidade dos temas preferidos do autor. Está tudo lá: as drogas alucinógenas, a dúvida sobre o que é real, as muitas visões religiosas e metafísicas sobre tudo, as múltiplas realidades ao nosso redor, os questionamentos de ordem ética e filosófica.

Começando pelo contexto e conceito, depois pela narrativa
Métódico em suas narrativas, PKD começa este livro calmamente apresentando seus personagens, contextualizando o mundo em que vivem e expondo de forma bem natural os muitos conceitos de sua visão de futuro. O leitor mais atento e fã do autor e suas obras com absoluta certeza fica tentado a imaginar (por que não afimar?) que o mundo de Palmer Eldritch é o mesmo do caçador de replicantes Decard. As semelhanças não são poucas e se dão em vários níveis, desde a descrição da tecnologia até os aspectos climáticos mas é um exercício bem individual essa suposição, fica a critério de vocês.

De partida conhecemos os dois precogs que estarão ao lado do poderoso Leo Bulero: Barney Meyerson e Roni Fugate. Ele um homem mais maduro, experiente, divorciado e com grandes pretensões para a carreira profissional na estrutura da Ambientes P.I, Meyerson foi convocado para ser colono em Marte e não sabe se vai conseguir ser reprovado nos testes; ela é jovem, ainda aprendendo muito sobre o ramo de pré-moda, bonita, inteligente e sagaz, nada econômica em seus julgamentos e opiniões emitidas com ou sem o consentimento de seus ouvintes.

Já na apresentação dos dois personagens, PKD vai despachando uma torrente de ideias, conceitos e situações que irão pontuar sua narrativa de diversos modos; alguns durante todo o trajeto da história, outros apenas aparecendo e desaparecendo para cimentar o contexto do mundo criado por Dick.

A Ambientes P.I e a droga de tradução Can-D, por exemplo, são foco constante de citações por todos os lados. Capaz de mergulhar o usuário para dentro de um ambiente miniaturizado como se fosse uma casinha de bonecas ou um jogo de tabuleiro, a Can-D traduz o usuário para o mundo da bela e estonteante Pat Insolente, uma persona fictícia estilo Barbie, cuja vida é uma maravilha ao lado de seu namorado; o mundo de Pat é objeto de desejo e ponto seguro para aqueles que querem escapar aos sufocos da vida real.

Ao consumir a droga os usuários vão para esse mundo, as mulheres se tornam Pat Insolente e os homens seu namorado. Tudo dentro da realidade da casinha de bonecas pode durar alguns minutos ou até horas, conforme a dose de Can-D consumida. A noção de tempo, claro, é completamente desvirtuada nos ambientes de Pat Insolente e esse é um dos grandes atrativos da obra: constantemente ficamos nos perguntando qual parte daquela história toda é uma história concreta? Estamos na mesma realidade ou já estamos na outra? ou naquela outra?

Nas colônias humanas no planeta Marte, a Can-D é uma fuga, uma salvação, quase um culto a ser seguido pelos colonos que vivem em cabanas precárias e sucateadas. Ali todos mastigam a droga, se transportam para o mundinho de faz de conta de Pat Insolente e lá vivem e relembram coisas há muito deixadas para trás num tal planeta Terra.

Nesse fluxo de composição dos ambientes de Pat Insolente, como disse mais acima, um tipo de casinha de boneca, os precogs de Leo Bulero analisam peças de roupa, utensílios domésticos e todo tipo de tranqueira que possa ser reduzida e vendida para compor os ambientes e dar-lhes mais consistência e materialidade numa tradução. Daí vem sua profissão: analistas de pré-moda, o que pode virar um grande fenômeno de vendas ou um grande fracasso é analisado pela percepção precognitiva de pessoas como Fugate e Meyerson.

Deus promete a vida eterna; nós cumprimos a promessa.

E não para por aí Quando Palmer Eldritch retorna de sua viagem de uma década, seis anos de translado, quatro de residência, traz consigo uma estranha substância que, segundo se noticia, tem aval da ONU para entrar no sistema Sol. Batizada de Chew-Z, a substância é também uma droga de tradução e vai ser comercializada de forma legal e disputar espaço contra a Can-D, não aprovada pela ONU para comercialização no planeta Terra, daí ser vendida apenas ilegalmente nas colônias de terra-formação.

Mais poderosa, mais estável e capaz de traduzir o usuário sem a necessidade de um ambiente de referência, a Chew-Z também é mais barata de sintetizar e, consequentemente, mais barata de vender. Além de voltar à Terra, Palmer Eldritch entrou no caminho de Leo Bulero de forma avassaladora a ponto de um de seus precogs se alarmar ao vislumbrar um possível futuro onde Bulero é condenado pela morte de Palmer. Esse é o ponto de partida para uma guerra silenciosa travada por esses dois homens tanto fora quanto dentro de suas próprias mentes. Falar um tanto a mais que isso é estragar muitas das surpresas da leitura acredite, você não quer que isso aconteça.

Diferentes realidades, diferentes focos narrativos

Quando dá o ponta-pé inicial de seu livro, PKD nos faz acreditar que aquela narrativa vai nos guiar por uma acirrada disputa entre dois homens de negócio que estão na camada limítrofe entre o ofício de empresários milionários e mafiosos milionários. Mas como boa parte de sua obra, esta primeira impressão dá lugar a um intricado jogo de poder e donimação, não só de mercados, mas sim de mentes e de realidades inteiras. Bulero é um humano artificialmente evoluído, Palmer é um humano alterado, possui um braço cibernético, dentes postiços de metal e olhos artificias também cibernéticos um tem a Can-D, cuja presença na vida dos colonos é um ponto de fuga, Palmer traz consigo a misteriosa Chew-Z com o slogan assustador de Deus promete a vida eterna; nós cumprimos a promessa.

O jogo se arma num tabuleiro que alterna frequentemente as peças em movimento um tanto caótico em sua organização narrativa, PKD muda constantemente seu foco narrativo e os personagens no centro dele, um recurso muito interessante em alguns casos, mas também um tanto estranho para outros, já que em dadas situações certos personagens apareceram, fizeram algo e depois não tiveram mais papel ativo na trama ou em sua condução.

Alguns casos eu até achei que esses personagens foram construídos como uma certa pressa e deixados de lado para não alongar uma trama já cheia de desdobramentos e ideias. Só para citar um exemplo, há situações que simplesmente as habilidades dos precogs desaparecem e escolhas são feitas ignorando o fato de que tais personagens poderiam ter dado uma série de outros desdobramentos em certas ocasiões limítrofes, já que as visões de possíveis futors lhes salta à percepção tão logo algo muito drástico esteja no limiar de acontecer.

A colônia em Marte, a disputa pelo espaço das duas drogas de tradução, os ambientes de tradução, a viagem de Meyerson para Marte e sua relação com a ex-esposa, as manipulações de Roni Fugate, os mistérios envolvendo a viagem de Palmer Eldritch ao sistema de Proxima, as visões de Bulero em um ambiente de tradução

Os focos são muitos e às vezes parece que o autor mergulhou demais em uns e deixou outros numa piscina bem rasa e quase vazia não que não seja um deleite apreciar a escrita e a trama complexa estabelecida pelo autor, mas fica latente aquela sensação de que há buracos aqui e ali que poderiam ter sido preenchidos com mais substância.

PKD alterna muito entre ser um excelente criador de conceitos e ideias de um lado e ser um excelente narrador de histórias do outro, no meio disso ele é um exímio manipulador; aqui nesse livro ele resolveu por tudo isso em prática, consegui com facilidade, mas deixou a obra um tanto fragmentada no excesso dessas três características em um livro Que poderia ser maior. Com apenas 248 páginas, o livro poderia ter atingido facilmente umas 400 páginas de conteúdo e trama sem prejudicar em nada o prazer da leitura é Philip K. Dick, por favor, como toda boa droga de tradução, nunca é demasiado.

Mas não há do que realmente reclamar, uma obra de PKD não pode ser tão linear, retinha e conectada passo-a-passo, estamos falando de uma mente inventiva e que criou obras intrigantes e cheias de conceitos. A fragmentação de sua narrativa não deixa de ser a fragmentação de sua própria mente Não foram poucas às veses em que imaginei Eldritch, Bulero e Meyerson como alter-egos de Dick como foi feito em Valis: uma pessoa, múltiplas personalidades e formas de ver o mundo.

Acima de qualquer viagem alucinógena pelos meandros das múltiplas realidades e de como as percebemos, Os Três Estigmas de Palmer Eldritch é um daqueles livros submersivos, que te traga para um mundo diferente, mas ao mesmo tempo cheio de similaridades com o nosso mundo real (aquecimento global, caçadores de tendência, colonização de Marte etc).

Garantia de momentos inspiradíssimos e de leitura de primeira grandeza, Os Três Estigmas de Palmer Eldritch é mais uma obra que enriquece qualquer estante e tem aquele gosto amargo de suspensão do leitor perto de suas últimas páginas aquela pequena dose de angústia satisfatória que brota em nós quando o fim deixa portas abertas demais para que nossa mente perdure ali dentro daquele mundo mesmo tendo saído por uma delas.

O livro está em nova edição pela Editora Aleph com capa temática e uniformizada para a coleção Philip K. Dick. Boa leitura

Os Três Estigmas de Palmer Eldritch
Num futuro não tão distante, quando o exílio compulsório de um planeta Terra excessivamente quente significa instalar-se miseravelmente em colônias marcianas, a única coisa que faz a vida dos colonizadores suportável são as drogas. Única em sua finalidade, a Can-D traduz aqueles que a consomem para uma outra realidade.
No entanto, o surgimento de um concorrente abre uma disputa por esse mercado. Chamada Chew-Z, a nova substância é comercializada sob o slogan Deus promete a vida eterna; nós cumprimos a promessa. Mas a questão é: Que tipo de eternidade ela oferece? E quem ou o que será seu portador?

ISBN: 978-85-7657-092-9
Tradução: Ludimila Hashimoto
Edição: 1ª
Ano: 2010
Número de páginas: 248
Acabamento: Brochura
Formato: 14 x 21 cm
R$ 42,00

site: http://www.pontozero.net.br/?p=9100
Adson 11/04/2018minha estante
Belíssima resenha! Parabéns!




Gabriel 05/12/2015

além do braço e dos olhos mecânicos
é notável a criatividade e o processo de criação do universo que envolve essa obra de K Dick, provavelmente uma das mais notáveis da ficção científica. A forma como levamos a questionar a realidade e o nosso lugar no mundo é fantasticamente colocada a prova. Um dos livros que mais me fizeram refletir sobre a vida de modo geral.
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Cheiro de Livro 21/04/2015

OS TRÊS ESTIGMAS DE PALMER ELDRITCH
Philip K Dick é um desses escritores que conheci pelo cinema, filmes como “Blade Runner” me apresentaram ao mundo criado pelo escritor americano, e depois de muito ensaiar peguei “Os três estigmas de Palmer Eldritch” para ler. Como primeiro contato com Dick em um livro foi bastante proveitoso.
A terra está se tornando inabitável por causa do aquecimento global. Momentos visionários como esse em livros de ficção cientifica sempre me surpreendem, o livro é de 1964, muito antes de qualquer debate sobre aquecimento ter destaque. Voltando ao livro, com o super-aquecimento, as pessoas não podem sair as ruas sem uma roupa de resfriamento e andar na rua sem ela é morte certa (se você vive no Rio de Janeiro a identificação com o calor infernal descrito é imediata), a ONU, órgão que substituiu os governos, começa a mandar colonos para outros planetas. Mesmo com o calor insuportável as pessoas não querem deixar a terra e os que são enviados para outros planetas utilizam a droga ilegal Can-D para suportar a experiência.
O livro começa como uma disputa pelo mercado de drogas nos planetas do sistema solar. Leo Bulero é o chefão do tráfico de Can-D e se vê ameaçado com a chegada de Palmer Eldritch e seu Chew-Z. Ambas as drogas levam seus usuários a entrar em um outro mundo, uma, Can-D, precisa de um cenário habitado por Pat Insolente para guiar a alucinação de seus usuários, a outra, Chew-Z, cria uma outra alucinação tão realista que seus usuários não sabem distinguir entre o que é real e o que não é, pense em “Matrix”.
O desenvolvimento dessa trama que começa como uma disputa comercial e descamba para uma série de questionamentos sobre o que é a realidade e, principalmente, sobre religião é um pouco confuso. Não é um leitura difícil mesmo com todas as idas e vindas de alucinações e realidade, mas parece que o debate fica apenas na superfície com um final em aberto que é ridículo de tão óbvio.
Como primeiro contato com a obra de Dick foi uma ótima leitura, gosto de elementos que se repetem em sua obra como os precogs e o questionamento sobre o que é real e o que não é. Acho que o que me incomodou no final das contas foi o terço final do livro meio confuso, querendo uma profundidade que não conseguia explorar em tão poucas páginas.

site: http://cheirodelivro.com/os-tres-estigmas-de-palmer-eldritch/
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Almabane 07/08/2013

Braço, mandíbula e olhos.
Philip K. Dick deixa aqui muitos elementos que seriam posteriormente usados em outros livros, como os precogs, as viagens espaciais com exploração de planetas/satélites (principalmente Marte), realidade versus virtualidade, dentre outros.
Gostei muito do livro simplesmente por ele ser sucinto na descrição de cenários e explorar os diálogos (com indagações filosóficas). Gostoso de ler e muito imaginativo.
O lance dos três estigmas é legal, fincando com estilo impressões a serem sempre lembradas ou citadas em obras diversas.
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icarosmm 03/05/2013

Drogas!
Drogas! Com toda certeza essa palavra define Os Três Estigmas de Palmer Eldritch. O vício e a vontade de ter uma droga legalizada em qualquer país do mundo é muito bem relatado em forma de agonia, abstinência e desgosto. A má contade em ter um emprego fixo e sustentar seus luxos são bem visíveis aos olhos dos leitores. Pela vontade explicita de personagens querendo assassinar outros personagens, fez-se um deles uma pessoa desiludida com a vida louca e vida medíocre de dizer o que é bom ou não é para o seu trabalho. O governo limpa a barra de uns e destrói a barra de vários. O autor, como sempre, colocando muita coisa do mundo real em seus romances ilícitos deixando pedaços do cotidiano incomodados com a semelhança.

A Terra excessivamente quente lembra um aquecimento global forçando os humanos a colonizarem Marte, mas com condições miseráveis. Por uma droga chamada Can-D, em sua única finalidade, tenta traduzir aqueles que a consomem para uma outra realidade, boa ou não. A concorrência não demora a chegar. Chamada de Chew-Z, a substância é comercializada com o slogan de "Deus promete a vida eterna, nós cumprimos a promessa" e entra na questão de que eternidade seria essa. O controle proporcionado pela droga é quase potente quando a onipresença de Deus para os cristãos, dando a possibilidade de até onipotência e onisciência. De fato, quem a usa torna-se "imortal" para os olhos que quem não a usa. Mas enquanto está no efeito, o usuário sofre com a submissão imposta por um Deus maior no efeito.

Como sempre, Philip K. Dick consegue escrever certo e simples em linhas tortas e diretas. Em momentos diversos, o autor fez parecer sua obra em uma novela, mas obviamente que nem tudo é o que parece, ainda mais referindo-se do K. Dick.
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Gabriel 02/01/2011

Uma trama muito boa de Philip K. Dick mostrando bem a situação do homem sobre o que ele pode fazer por amor, desespero ou dinheiro. Só achei que o livro fica muito incerto sobre o que é realidade ou ilusão nas ultimas 70 páginas. Mas um livro muito legal!
Maurício Coelho 05/02/2013minha estante
PKD sempre faz isso. O leitor nunca sabe se é real ou ilusão.




Antonio Luiz 09/12/2010

Na encruzilhada entre a religião e ciência
Em sua linha de (re)lançamentos de clássicos da ficção científica, a editora Aleph publicou várias obras de Philip K. Dick, ou PKD, como costumam abreviar seus admiradores. A mais recente dessas publicações "Os Três Estigmas de Palmer Eldritch" (248 págs, R$ 42), é também uma das obras mais interessantes desse que é o autor do gênero mais filmado por Hollywood – provavelmente pela habilidade em misturar especulações tecnológicas e parapsicológicas com questões sentimentais, religiosas e existenciais – mas não é para principiantes no gênero.

"Os Três Estigmas", obra de 1965, é representativa da transição entre as primeiras obras do autor, mais convencionais em termos de ficção científica e a fase posterior, cada vez mais ousada e visionária, dedicada à exploração de temas místicos e religiosos. Está em um ponto de equilíbrio compreensível e interessante para os dois tipos de leitor, sem deixar de proporcionar a cada um a possibildade de se colocar em um ponto de vista desafiador, pouco usual.

A obra é curiosa, também, por parecer abordar e antecipar questões atuais na década de 2010, na qual, aliás, está ambientada (por volta de 2016). A Terra está superpovoada, superaquecida e cada vez mais difícil de habitar: a mera permanência sob o Sol por alguns minutos pode matar, os ricos tiram férias na Antártida e equipamentos portáteis de ar condicionado são necessários. Sabe-se que situação está piorando e num futuro não muito distante o planeta ficará totalmente inabitável e todos morrerão, mas mesmo assim continuam levando suas vidas como de costume e resistem a todo custo a ser enviadas como colonos a outras luas e planetas. Para tocar seus programas de colonização espacial, as Nações Unidas recorrem ao recrutamento compulsório.

PKD antecipava os atuais problemas do aquecimento global? Sim e não. O romance não oferece nenhuma explicação das causas do fenômeno, nem sugere se foi ou não provocado pela humanidade. O primeiro artigo científico sobre o tema, de Wallace Broecker, foi publicado na revista Science em agosto de 1975 e a descoberta do “buraco” na camada de ozônio também é dos anos 70. A ideia dessa “Idade do Fogo”, que não é central à trama, pode ter sido lançada apenas para criar estranhamento e contrariar a noção mais comum nessa época de uma nova “Idade do Gelo” ameaçando a humanidade – e só por acaso se tornou (quase) realidade.

Nas suas visões do futuro, PKD se guia muito mais por sua intuição e senso de ironia do que por especulações racionais: medos e desejos contam mais que o princípio da realidade. Por desconhecimento ou por indiferença às leis da física, sequer leva em conta o retardo em comunicações interplanetárias. Personagens na Terra, em Marte e nas luas de Júpiter e Saturno conversam em tempo real por videofone, apesar esses corpos estarem separados por distâncias que mesmo a luz (e ondas hertzianas) levam horas para percorrer.

Outro exemplo é a ampliação do cérebro através da E-terapia (“E” de evolução). Também parece antecipar o “transumanismo” dos anos 80 e 90 e as preocupações e especulações com o uso da engenharia genética para “melhorar” a humanidade, mas pelos meios “errados”. Um equipamento estimula uma imaginária “glândula de Kresy” que supostamente acelera o processo evolutivo de modo a ampliar a inteligência e poderes paranormais na maioria dos clientes, mas funciona de maneira reversa em algumas pessoas, tornando-as mais “primitivas”. Não tem pé nem cabeça em termos evolucionários e biológicos: é exemplo da pior ficção científica de gibi e o autor faz questão de enfatizar isso ao fazer a máquina ser operada na Alemanha por um estereótipo do Dr. Frankenstein, com sotaque alemão e tudo – um “judeu do tipo ex-nazista”, como dirá um personagem.

Outro tema explorado no romance é o uso de poderes paranormais. Como em muitos outros textos de PKD (dos quais "Minority Report" é o mais conhecido, graças a Hollywood) eles são relativamente comuns e rotineiramente empregados por governos e empresas capitalistas para prever tendências de mercado e o sucesso de novos produtos, como faz o protagonista Barney Mayerson para o patrão Leo Bulero.

O cenário também inclui táxis automáticos, controlados por computador – algo que começa hoje a se tornar realidade. A internet é de certa forma antecipada com o “homeojornal” (homeopape, no original), equipamento encontrado em romances de PKD desde os anos 1950 que imprime um jornal personalizado a partir de especificações discadas (sim, como num telefone dos anos 60) em código numérico. Como esclarece o autor em outros textos, o “homeo” é de “homeostático”, no sentido cibernético de ser produzido por um sistema eletrônico autorregulado sem interferência humana. Há também um psiquiatra portátil, “Dr. Smile”, um computador embutido numa maleta que o protagonista usa para multiplicar e agravar suas neuroses e assim tentar escapar do recrutamento obrigatório como colono interplanetário.

Mais próximo do núcleo da trama está o Can-D (“candy”, doce), alucinógeno ilegalmente vendido pelo grupo empresarial de Leo Bulero e extra-oficialmente tolerado pela ONU, do qual os colonos terráqueos em outros planetas se tornaram dependentes. O mesmo Bulero vende, legalmente, bonequinhos e miniaturas nitidamente baseadas em Barbie, Ken e seus acessórios – brinquedos que já haviam sido tema de um conto anterior, The Days of Perky Pat, ambientado em uma Terra pós-apocalíptica.

Neste romance, ao consumir a droga e contemplar os brinquedos, os usuários entram na pele da boneca “Pat Insolente” (Perky Pat, no original) ou de seu namorado Walt e vivem um consumo fútil e despreocupado numa Terra idealizada de antes da “Idade do Fogo”. É uma alienação em comunhão, visto que no grupo que consome em conjunto, todos os homens se tornam Walt e todas as mulheres Pat, compartilhando a mesma experiência e toma um caráter algo religioso.

Outra vez, parece antecipar manias do nosso século – jogos como Second Life e The Sims e o uso de avatares em sites de relacionamento – pelos meios “errados”. Mas também é uma radicalização da experiência mais tradicional de se ver um filme ou acompanhar uma novela de televisão.

O tema do romance, porém, não é nenhuma dessas tantas ideias surpreendentes. Sua função parece ser a de compor um cenário delirante de modo a predispor o leitor a ver a realidade com outros olhos e incitá-lo a pensar para além do senso comum. Também não são os problemas pessoais e sentimentais de Mayerson, que o levam a finalmente entregar-se ao recrutamento e deixar-se conduzir a uma colônia marciana.

O tema é o Mal Absoluto, trazido à baila pela figura de Palmer Eldritch, um empresário desaparecido e supostamente morto em uma viagem ao sistema solar “Prox” (Proxima Centauri), cuja nave inesperadamente reaparece e cai em Plutão. A estranha figura de Eldritch antecipa muitos personagens da ficção cyberpunk dos anos 80 e 90: seus olhos, dentes e mão direita (os “três estigmas” do título, que aludem à Trindade cristã) foram substituídos por próteses metálicas que lhe dão uma aparência inumana.

Segundo a biografia de PKD escrita por Lawrence Sutin, Eldritch lhe surgiu numa visão ao caminhar para uma cabana na qual costumava escrever: “… olhei o céu e vi um rosto. Não o vi realmente, mas o rosto estava lá e não era humano; era um vasto semblante do mal perfeito… era imenso, preenchia um quarto do céu. Tinha ranhuras vazias no lugar dos olhos – era metálico e cruel e, pior de tudo, era Deus.” A imagem tinha raízes na época em que tinha quatro anos e seu pai punha uma máscara de gás para contar histórias da I Guerra Mundial: “esse semblante metálico, cego, inumano me apareceu de novo, mas agora transcendente, vasto e absolutamente mau.” O crítico Adam Corbin Fusco sugeriu que a combinação da máscara de gás com a imagem de Eldritch inspirou George Lucas a criar Darth Vader. Quando menos, deve ter inspirado vários dos personagens mais assustadores da ficção cyberpunk dos anos 80.

Dick reconheceu que tanto Leo Bulero quanto Palmer Eldritch são figuras paternas. O primeiro, rude e inescrupuloso, mas amigável, representa um mal humano e relativo, enquanto o segundo inspira a suspeita de ser um alienígena disfarçado e se mostra diabólico e muito mais que isso. Ao retomar suas atividades, introduz um novo e mais potente alucinógeno, o Chew-Z (“choosy”, exigente), a ser vendido com a boneca Connie Companheira e acessórios. Bolero, ameaçado de falência, planeja assassinar Eldritch, mas logo se vê que os poderes do concorrente e de sua droga são muito maiores do que imagina.

A droga e os brinquedos de Bulero proporcionavam uma fuga momentânea da realidade, uma ilusão que ao mesmo tempo ajudava a suportar uma realidade difícil e afastava e adiava a necessidade de transformá-la (qualquer semelhança com uma passagem famosa do Manifesto Comunista pode ser mais que mera coincidência). Já a nova versão abre caminho a existência em realidades alternativas nas quais os usuários podem se perder por anos, talvez para sempre, ao tentar reviver suas vidas e corrigir o que nelas houve de “errado”, enquanto se passam poucos minutos no mundo “real”.

Mas todos os personagens que aparecem nesses mundos paralelos são Eldritch disfarçado e todas essas realidades se comunicam através dele. Mostra-se um demiurgo que, por meio da droga, dita o destino dos universos e de seus habitantes e desafia as noções do leitor sobre bem, mal, Deus, fé e existência. Representa, talvez, o pesadelo de uma virtualização onipotente, uma tecnologia que aos olhos humanos – demasiado humanos, embora visionários –, de PKD, representa o “mal absoluto” porque supera a própria religião e permite realizar, sem limites, tanto desejos mesquinhos e autodestrutivos quanto projetos grandiosos, mas ao preço da desumanização.
Rodrigo 08/01/2021minha estante
Na minha concepção,Chew-z se refere mais a "Choose" Escolher,faz mais sentido no contexto do livro




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