Lucas1429 14/05/2024ImpiedosoLi em uma resenha de uma colega aqui do Skoob que Eça não faz questão de criar afeto com seus personagens. Após a leitura, é isso mesmo.
Os personagens são seres humanos, a maioria é da pior espécie. São maus, mesquinhos, interesseiros, vaidosos e intrigueiros. São uma imagem de perfeição por fora, sob a batuta de uma conexão fortíssima com a Igreja, mas por dentro são o retrato da podridão de um tradicionalismo fadado ao fracasso.
Um livro voraz e que causou mal estar com sua publicação, nos idos do século XIX. Chegou a ser motivo de uma rusga entre Eça e Machado, por conta de sua história ser parecida com a de um livro de Zola. (O prefácio de Eça elucida a questão).
Alguns adjetivos que posso usar para esse livro serviriam para ilustrar um álbum d'O Terno, com seus antônimos, mas é um livro MARAVILHOSO-TENEBROSO, um livro INCRÍVEL-TERRÍVEL, um livro EXCELENTE-PÉSSIMO.
É como Lolita, impecavelmente escrito, nas dicotomias de Eça (meu primeiro contato com o autor foi no magistral A cidade e as serras), porém com uma história que incomoda.
Trata da história de Amaro, criado por uma rica empregadora de seus pais, que, após falecer, lhe paga o seminário para que se torne padre, contudo, contra a vontade do jovem.
Amaro sai do seminário para Leiria, e, lá, se apaixona pela filha da dona da pensão onde mora, a bela mais cobiçada da cidade, Amália.
Daí se desenvolve uma história cheia de picuinhas, hipocrisia e que mostra o pior que a sociedade portuguesa do século XIX poderia mostrar, o que dialoga com toda a tese trazida por Faoro em seu prefácio aos Donos do Poder.
O livro traz cada passagem triste, que causa náuseas e incômodos... lê-lo é quase como forçar-se a colocar o dedo na goela, contra sua vontade. Mas vale cada página. Magistral.
E falar muito sobre ele seria chover no molhado. Leiam.
Imprescindível para enriquecer seu conhecimento sobre a literatura oitocentista, sobre a literatura portuguesa e sobre um clássico. Indispensável. Não é o mais fácil de ler, talvez não seja o mais prazeroso, mas é contundente para a formação de um ser humano, ao ver e aprender o que não fazer com os digníssimos da fé de Leiria.