Ju 20/02/2014
Parabéns para autora e revisora. Revisão excelente!
A sinopse não me animou muito. Jornada épica, princesa, profecia, reinos distantes, blablablá. Sempre a mesma história. Junto com a capa da pelada na neve, comecei a ler sem grandes expectativas, mas depois de duas frases já estava gostando do jeito que a autora escreve. É um livro com mais narrações e descrições do que diálogos, mas não é nada cansativo. A descrição é do tipo que puxa a gente para o meio da paisagem. O vocabulário é ótimo, as frases são construídas com capricho e passam imagens mais completas do que as palavras sozinhas poderiam passar.
Depois da segunda página, já sabia que aquela era uma autora que escrevia bem. Faltava ver a história.
A parte que começou bem foi que a pelada da capa estava devidamente enrolada num enorme casaco quentinho, o que é mais coerente para quem está no meio da neve. Aí fui aos poucos conhecendo a personagem e sua história. E gostei.
Kira, a princesa amazona de Hisipan, é a (sempre presente) escolhida pelos deuses para a tal missão que (sempre) vai salvar o mundo. Precisa procurar as (sempre presentes) relíquias-artefatos-armas espalhadas pelo mundo. Se os deuses querem os artefatos e se são deuses, por que não vão lá e pegam, e trazem para o lugar certo sem tanta complicação? Por que meter escolhidos na (sempre) longa e (sempre) perigosa jornada, se a guerra é de deuses? Por que os deuses nunca podem brigar lá entre eles sem envolver a Terra toda na briga? Tem deuses por aí que não merecem o nome de deuses. Desabafo feito.
Kira já de saída avisou que não era como as outras escolhidas. A escolhida tradicional nasceu com uma marca e foi escondida em uma vila pacífica e bucólica porque precisava ser protegida. Tem pais adotivos que pensa que são seus pais de verdade. Ninguém contou a ela que vai ter que salvar o mundo até que um exército-monstros-cataclismas despencam na sua vila e destroem tudo. Daí a escolhida foge apavorada, encontra um grupo de protetores e eles dizem que ela precisa sair pelo mundo como uma mosca tonta, sem saber quem é e sem entender o que tem que fazer. Sabe A Múmia 2, aonde os personagens uma hora dizem "é sempre a mesma história"? Pois é.
Kira não é uma mosca tonta. Com seis anos, já era uma amazoninha valente que precisava passar por uma cerimônia de iniciação. Nessa cerimônia, a princesinha é marcada pela deusa Kor como sua escolhida e - ohhhhhh - em vez de ser escondida numa vila por aí, ela é treinada a vida inteira para a missão que vai ter que cumprir. Sabe o que tem que fazer, sabe para onde tem que ir, sabe lutar, tem orgulho da sua raça, da sua cultura e das suas irmãs amazonas. Não é do tipo que se enche de dúvidas antes de passar a espada por um adversário. Até o próprio cavalo ela mata, quando isso é a coisa certa a fazer. Se ela vai descobrir muita coisa sobre o mundo e sobre si mesma durante a viagem? É claro que vai. Ela não é burra. Viagens, mesmo que não sejam para salvar o mundo, mudam as pessoas.
O ritmo das aventuras do livro é bem RPG + espadas, mas a autora não se perde em momento nenhum. Aventuras épicas? Sim. Adversários assustadores? Sim. Gente morta aos montes? Sim. Mas todos num contexto que convence. Tem gente preconceituosa e assustada tomando decisões burras que levam a catástrofes. Tem gente egoísta levando muita gente para a guerra porque, além de egoísta, é muito idiota também. Mas coerente, dentro da sua visão torta de mundo. Tem bichos parecidos com ietis, caranguejos gigantes, baleias douradas, sereias, gaivotas que devem ter assistido Os Pássaros, de Hitchcock. Tem um lance final bem legal que não vou contar para vocês, apesar do nome do blog ser Resenhas com Spoilers. Só vou usar os spoilers quando precisar explicar minhas opiniões. Aqui não precisa. É um lance bem legal e fim.
Livro recomendado para quem gosta de protagonistas femininas fortes que não usam beijos, peitos e bundas para conseguir o que querem e não se apaixonam (sempre) pelo seu protetor-instrutor-guarda-costas, mesmo porque Kira viaja sozinha e é uma amazona, então não vê homens como protetores. Recomendado para quem gosta de leituras rápidas com vocabulário rico e aventuras com pé e cabeça, mesmo envolvendo gaivotas assassinas e ietis comedores de gente.
Kira encontrou só o primeiro artefato neste livro. É claro que vou ler os outros livros, porque há mais dois artefatos para encontrar, e depois vem a tal guerra dos deuses (que vai sair ou não, sei lá). E não vou nem olhar a capa na hora de comprar, porque a autora e a história valem. Muito e de verdade!
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