Regis 02/09/2022
Vale a pena permitir que outro cumpra seu destino?
Nessa peça de 438 A.C, Eurípedes conta o drama de Admeto rei de Féres, que deveria estar morto, mas foi salvo por um acordo de Apolo com as Parcas. Sua vida seria poupada, desde que alguém fosse voluntário para morrer em seu lugar.
Nem seus pais idosos, nem seus amigos mais fiéis, aceitaram o sacrifício; coube à sua esposa, Alceste, se apresentar e morrer em seu lugar.
A peça fala da fuga da responsabilidade pelos próprios atos. Mesmo que inicialmente se apresente como uma reflexão sobre a morte e a constatação que existe uma ordem natural para que ocorra; os pais devem partir antes dos filhos.
Admeto acusa seus pais de covardia, de não quererem se sacrificar por ele (sendo os dois já idosos).
"Tu devias chorar, quando eu estava prestes a morrer; mas ficaste de longe, deixando que se sacrificasse outra mais jovem, velho como és!
Na hora de ser posto à prova nos mostraste quem realmente és, e não me olhas mais como teu filho. Ou, então, descendo ao máximo da covardia, tu, que já viveste tanto, chegando ao termo de uma vida muito longa, não tiveste nem a vontade, nem coragem de dar a vida para salvar o teu filho!"
Ao mesmo tempo, Admeto age da mesma forma ao permitir que sua mulher se sacrifique em seu lugar.
"Se te apraz contemplar a luz, pensas que que o mesmo não se dê comigo? Bem sei que longo tempo, muito longo tempo mesmo, eu permanecerei sob a terra; o que me resta da vida terrena é pouco, mas é doce! Tu, que te debateste vergonhosamente contra a morte, tu vives, sim; transpuseste o passo fatal, mas à custa de tua esposa! E agora censuras a minha covardia, tu, infame, suplantado em coragem por uma mulher, que se deixou morrer por ti, belo rapaz!"
Admeto é hipócrita e covarde, até se mostra arrependido após o funeral, chega até manifestar desejo de morrer ( já que não tem mais a fiel e abnegada mulher ao seu lado) mas, me pareceu apenas uma cena feita para que ninguém o acusasse de poltronaria.
Ele era um bom e justo soberano, mas era também um fraco, pusilânime que não quis abdicar de sua vida no momento em que era chegada a hora.
A peça é uma tragédia, que assume ares de drama, mostrando um final que surpreende.
Fiquei curiosa com o destino de Alceste desde O Banquete de Platão, onde é citada.
E gostei muito de ter feito essa leitura.
A escrita é concisa e de fácil compreensão, tornando a leitura dinâmica e prazerosa.
Alceste foi uma ótima porta de entrada para as tragédias de Eurípedes, que pretendo ler junto com as peças de Ésquilo e Sófocles.
Recomendo essa peça que nos mostra a covardia e o egoísmo, o amor verdadeiro e a abnegação, através de seus trágicos personagens.