Rodrigo1001 11/03/2024
Belo no conteúdo e na forma (Sem Spoilers)
Título: Teoria Geral do Esquecimento
Autor: José Eduardo Agualusa
Editora: Tusquets
Número de páginas: 192
Uma mulher decide trancar-se em sua casa por décadas tendo apenas seu cachorro, livros e um jardim no terraço como companhia.
Sobre essa premissa, o escritor Angolano José Eduardo Agualusa borda um livro tão belo, mas tão belo que mais parece um longo poema em prosa.
"Teoria Geral do Esquecimento" é uma teia narrativa que parece ter capturado fragmentos de histórias reais e inventadas, fragmentos de diários, poemas, eventos distantes e próximos: uma constelação em que o leitor navega entre as estrelas para juntar as peças do que está sendo contado.
Tendo a Independência de Angola como pano de fundo, a história é escrita com humor caloroso e, embora seja assombrada pela sombra da luta de libertação, juntamente com as mudanças de regime, prisões, tortura e execuções sumárias que geralmente acompanham tais eventos, o livro tem menos a ver com esses acontecimentos históricos do que com os laços forjados entre os personagens.
Agualusa, na verdade, molda os personagens como correntes oceânicas que constantemente se chocam uns contra os outros ou se separam, mas nunca se abandonam.
O resultado é belíssimo! O tipo de livro que vale a pena ler mais de uma vez e, talvez, mais lentamente na segunda vez. Os capítulos curtos tendem a facilitar o avanço da história, mas desacelerar e saborear o tom e a escolha das palavras em cada capítulo torna a experiência ainda mais agradável.
Vou além: considero-o um “page-turner” intrincadamente escrito em uma prosa delicada que parece deslizar sobre trilhos com uso quase idílico do tempo, local e poesia de sonhos.
Extremamente bem amarrado, o autor deixa o melhor por último, brindando o leitor com uma reviravolta na trama que nos deixa com a certeza de termos em mão a obra de um escritor talentosíssimo, vibrante e generoso.
Enfim, se Henrik Ibsen estava certo ao proferir que a beleza é um acordo entre o conteúdo e a forma, Agualusa atingiu o núcleo dessa afirmação. Basicamente, encontrei nessa obra tudo o que eu gosto de encontrar em um livro
Leia-o e encante-se também.
Levarei na memória como esse livro caiu em minhas mãos de maneira tão despretensiosa - com a intenção de ajudar um amigo - até o momento de relê-lo lá na frente, quando os ventos do tempo já tiverem levado a beleza que a mente teima em esquecer.
Leva 5 de 5 estrelas.
Passagens interessantes:
"As pessoas não veem nas nuvens o desenho que elas têm, que não é nenhum, ou que são todos, pois a cada momento se altera. Veem aquilo por que o seu coração anseia." (pg. 63)
"Deus pesa as almas em numa balança. Num dos pratos fica a alma, no outro as lágrimas dos que a choram. Se ninguém a chorou, a alma desce para o inferno. Se as lágrimas forem suficientes, e suficientemente sentidas, ascende para o céu. Vão para o Paraíso as pessoas de quem os outros sentem a falta. O Paraíso é o espaço que ocupamos no coração dos outros." (pg. 169).
"Não se atormente mais. Os erros nos corrigem. Talvez seja necessário esquecer. Devíamos praticar o esquecimento" (pg. 172)