Resenhas - Peregrinação - Vol. 1

Marion 29/11/2022

Pra lá da Conchinchina
Marco Polo português , Fernão Mendes Pinto conta suas aventuras rumo ao oriente. Virou escravo, foi torturado, descobriu animais novos e lugares maravilhosos.

Pablo Paz 10/11/2021

Já era pós-moderno em 1500...
Tenho para mim que esse é um dos títulos mais bonitos da língua portuguesa. 'Peregrinação' de Fernão Mendes Pinto (1509-1583) refere-se às viagens ao Oriente (Japão, China, Índia) durante o século XVI, quando Portugal era a Rainha dos Mares, antes de perder tal status para Holanda e Inglaterra. Viagens de fato mas também de ficção, já que há muitas invencionices em seus relatos, como ele ter avistado uma espécie de dragão nos confins da China (ou da Índia, não me lembro...) embora ele jure ser tudo verídico. Foi essa fusão de fato e ficção que o levou ao descrédito nos séculos seguintes tanto por historiadores quanto por literatos. Ironia (ou vingança) da história: hoje, em que o pós-modernismo tem a hegemonia nas artes, na cultura de massas e na literatura, nem seria considerado original por isso.

O livro, como sempre, reflete a sua época, mas algo que me chamou atenção foi o ódio pelo islamismo já naquela época; ou seja, a relação entre islamismo- cristianismo, como um desdobramento das relações Ocidente-Oriente, não é mera invenção do século dos fins do século XIX, quando o petróleo é descoberto nas regiões árabe-islâmicas, pelo contrário, tem raízes mais antigas como se pode depreender deste autor quinhentista.

Esse livro, publicado muito após a morte de Fernão Mendes (em 1614), infelizmente não é tão conhecido entre a maioria de nós brasileiros, mesmo entre pessoas cultas, com exceção talvez de quem tenha cursado Letras. E a 'culpa', talvez, seja de Vaz de Camões (1524?-1580?), escritor da mesma época, mas que desde a escola temos a impressão de que era o único escritor do período. Embora Camões se sobressaia como o escritor por excelência, um autor como Fernão Mendes foi um dos primeiros a ajudar a moldar a língua portuguesa ao nos dar uma narrativa longa (os 2 volumes dão umas 800 págs.) sobre esse grande empreendimento - de lucro, de aventuras e também de risco - que foram as Navegações.

Não sei dizer se é 'melhor' que Camões, mas é um autor que vale ser lido não só por curiosidade histórica, como também para conhecermos as gêneses da nossa língua. Embora possa haver dificuldades com a sintaxe quinhentista no início da leitura, logo se acostuma porque é um livro muito divertido. Além de boa literatura.