jota 25/12/2013Alexandre PantaleãoCertamente três conhecidos personagens de Chico Anysio – o coronel Pantaleão, sua mulher Terta e o afilhado Pedro Bó, sucessos na televisão e pelo menos em um livro, É mentira, Terta? – foram inspirados nos protagonistas deste Histórias de Alexandre, de Graciliano Ramos: o Alexandre do título, sua mulher Cesária e o cego Firmino.
Curiosamente, uma personagem secundária (bem secundária mesmo, pois aparece em duas ou três histórias apenas) se chama Terta, uma sinhá “escura e casada com homem escuro, [que] teve esta semana um filho de cabelo cor de fogo e olho azul.”, conforme narra Alexandre a certa altura.
Quer dizer, ele usa esse fato para explicar que se coisas estranhas aconteceram com ele ou com Cesária – casos espetaculares que ele conta aos seus ouvintes na fazenda onde reside - elas também acontecem com os outros, com conhecidos, e arremata: “Há quem diga que sinhá Terta não seja séria? Não há. Sinhá Terta é um espelho.”
E maravilhosos também devem ser vários animais somente encontráveis no sertão nordestino, propício a fornecer um mar de histórias. O que seria das narrativas de Alexandre se ele não contasse com o auxílio luxuoso (ou zoológico) de bodes, papagaios, tatus, jiboias e guaribas, alguns deles não apenas falantes mas igualmente pensantes? Já imaginou plantar um mandiocal e colher uma safra de tatus?
As histórias de Chico Anysio se passavam em 1927, as de Ramos “no sertão do Nordeste de antigamente” (o prefácio do livro, em 57ª. edição, é de 1938), quer dizer, quase na mesma época e as situações e os casos são também praticamente idênticos. Ah, Alexandre tem um olho torto (adquirido numa das histórias mais absurdas do livro); Pantaleão também tinha um problema, acho que no olho direito, usava uma lente de óculos escura e outra transparente.
Tanto Pantaleão quanto Alexandre contam histórias (ou casos, e neste livro eles são catorze) para uma pequena plateia e quando a mentira vai muito longe, caso alguém duvide deles ou os questione, eles sempre se socorrem das mulheres, usando um bordão, repetido dezenas de vezes. No caso da televisão “É mentira, Terta?”, no caso do livro: “É ou não é, Cesária?” No livro de Ramos quem está sempre apertando Alexandre, fazendo perguntas cabulosas é o cego Firmino; na televisão era Pedro Bó.
Bem, apesar dessas coincidências todas – muito grandes, de fato – tanto assistir aos velhos programas de Chico Anysio quanto ler este livro de Graciliano Ramos é prazeroso demais. Isso é mais do que certo e também altamente recomendável. Vale a pena conhecer o lado folclórico e bem-humorado do escritor que nos brindou com livros inesquecíveis: Vidas Secas, Infância, Angústia, Caetés, São Bernardo, Memórias do Cárcere, etc.
Lido entre 20 e 24/12/2013.